Ministério da Saúde anuncia novos programas para a saúde digital em 2024

Ministério da Saúde anuncia novos programas para a saúde digital em 2024

Governo anuncia financiamento de 566,9 milhões de reais para estruturar saúde digital em estados e municípios

By Published On: 06/12/2023

Desde o anúncio da criação da Secretaria de Informação e Saúde Digital, no início de 2023, o Ministério da Saúde tem demonstrado vontade política em fortalecer a área para reduzir os vazios assistenciais e ampliar o acesso da população ao SUS, através do uso da tecnologia. Prestes a acabar o primeiro ano de gestão, a pasta dá um novo passo em busca de estruturar uma política sobre o tema. Durante a reunião da Comissão Intergestores Tripartite de novembro, realizada no último dia 30, foram apresentadas as minutas de duas portarias de novos programas que caminham nessa direção. 

O primeiro anúncio foi sobre a criação do Laboratório Inova SUS Digital, que terá, dentre outros objetivos, a função de “criar um ambiente institucional, integrativo e colaborativo voltado à promoção, ao fomento e ao desenvolvimento de soluções inovadoras incrementais, originais e sistêmicas para o fortalecimento do ecossistema de saúde e transformação digital no SUS”, de acordo com o texto apresentado.

A outra minuta apresentada refere-se ao modelo de financiamento do Programa SUS Digital, que ainda está em processo de construção. Ao todo, 566,9 milhões de reais estão previstos para 2024, com o intuito de auxiliar na elaboração e na implementação dos Planos de Ação de Transformação para a Saúde Digital de estados e municípios.

Ainda não divulgados pelo Ministério da Saúde, os anúncios indicam que a pasta quer colocar em prática no próximo ano as mudanças na saúde, adotando estratégias digitais que colaborem com o SUS. A telessaúde deve atingir um novo patamar, chegando às populações mais vulneráveis.

“A ideia é de que nós tenhamos a agenda do SUS como referência para o apoio e a promoção da inovação. A gente sabe que essa área de saúde digital sofre uma pressão muito grande das empresas, temos uma lista imensa de pedido de agenda, esperando e querendo vender suas soluções. E a gente não quer soluções prontas, fragmentadas. A gente quer a agenda do SUS como a agenda que vai nortear o processo de construção de inovações com um olhar mais sistêmico”, explicou a secretaria Ana Estela Haddad, durante a apresentação.

Para Lincoln Moura Jr, ex-presidente Sociedade Brasileira de Informática em Saúde (SBIS) e representante da entidade junto à Rede Interagencial de Informações para a Saúde (RIPSA), a saúde digital tem tudo para sair do papel em 2024:

“Está sendo bem preparada e existe uma sintonia interna entre a Secretaria e a ministra Nísia Trindade. Vão existir dificuldades de criação de consenso, juntar as pessoas e manter o alinhamento. É complexo, principalmente em um ambiente que tem muitas consultas, uma característica importante dessa iniciativa. Os problemas são mais organizacionais do que de vontade política”.

O que se sabe sobre os novos programas?

Ainda que existam poucas informações divulgadas, o programa SUS Digital será o carro-chefe para a transformação digital no âmbito da saúde pública. Em estruturação, tem como parte de seus eixos de atuação a telessaúde, soluções tecnológicas, interoperabilidade e análise de dados, formação, pesquisa e educação em saúde digital.

Através do Índice Nacional de Maturidade em Saúde Digital (INMSD), instrumento que irá avaliar o nível de estrutura nas regiões, os gestores deverão elaborar Planos de Ação de Transformação para a Saúde Digital (PA Saúde Digital), com o intuito de propor as mudanças necessárias para a adoção de serviços nesse sentido, com os recursos a serem disponibilizados.

“A proposta de realização de diagnósticos locais ou regionais é interessante em si e traz um benefício adicional que é o de estimular os atores regionais, como centros de ensino, pesquisa e inovação, empresas inovadoras e organizações públicas e privadas, a participarem do desenvolvimento da Saúde Digital, em linha com as diretrizes nacionais, mas aderente às necessidades e disponibilidade de recursos locais ou regionais”, avalia o ex-presidente da SBIS.

Tanto a política, como os instrumentos que deverão balizar os planos, ainda não foram divulgados oficialmente pelo governo, e devem ser publiados em portaria no Diário Oficial da União. Com isso, a sociedade poderá avaliar melhor os critérios utilizados para a distribuição dos 566,9 milhões de reais destinados ao programa, dividido em três parcelas previstas até outubro de 2024.

“Esse valor é um início. Vai precisar injetar durante algum tempo os recursos estruturantes, e depois vai ser preciso começar a trabalhar no financiamento pelo serviço prestado. O que nós temos que desenvolver não é um projeto, é um programa de estado. O projeto é para viabilizar um ecossistema que nos permite construir um programa de estado”, observa Chao Lung Wen, chefe da disciplina de Telemedicina da Universidade de São Paulo (USP) e presidente da Associação Brasileira de Telemedicina e Telessaúde (ABTms).

Já o Laboratório Inova SUS Digital, deverá, de acordo com texto apresentado na CIT, “estimular o desenvolvimento de soluções digitais que contribuam para a melhoria da qualidade, da eficiência e da equidade dos serviços de saúde”. A pactuação deve ocorrer na próxima reunião da Comissão, agendada para 14 de dezembro.

Participação privada e próximos passos

Apesar da aproximação da ministra Nísia Trindade com a saúde suplementar, com alguns acenos em eventos de entidades que representam parte de empresas que atuam na área, cobra-se que haja uma maior parceria entre as empresas e o Ministério, principalmente no âmbito da tecnologia. O Governo tem adotado uma postura mais centralizada, com parcerias mais voltados a instituições de pesquisas e universidades públicas.

Contudo, a construção de parcerias poderia acelerar alguns processos. “Para que isto ocorra de forma ética, transparente e em consonância com os princípios do SUS, é necessário que a governança dos espaços de colaboração estabeleça com clareza como se dará a colaboração público-privada, como lidar com os sucessos e ou fracassos das iniciativas propostas e sobretudo, como utilizar os resultados da colaboração”, explica Lincoln Moura Jr.

O representante da SBIS junto à Rede Interagencial de Informações para a Saúde (RIPSA) também aponta que esse caminho é utilizado em países onde há um sistema de saúde universal semelhante ao brasileiro, como Reino Unido e Canadá, sendo importante instrumento de desenvolvimento econômico e industrial, com players líderes mundiais em seus segmentos.

Mesmo que o Governo assuma uma linha mais centralizada, a expectativa dos especialistas é que em 2024 já seja possível ver resultados práticos das ações relacionadas a saúde digital, como o avanço da telessaúde. Gradualmente, novos desafios devem surgir conforme a implementação for caminhando, assim como um aperfeiçoamento das políticas.

“Impreterivelmente vamos fazer acontecer. Temos que pensar na eficiência e no bem das pessoas, porque de qualquer forma vamos conseguir mudar hábitos da população. Em 2024 teremos ainda problemas, porque tudo que começa sempre tem problemas, mas espero que em 2025 se estabilize e em 2026 comece a ser algo estruturante, para construirmos nos próximos 4 anos seguintes”, observa o presidente da Associação Brasileira de Telemedicina e Telessaúde (ABTms), Chao Lung Wen.

Construção

Ao longo do ano, diversas iniciativas do Ministério da Saúde, através da Secretaria de Informação e Saúde Digital, indicaram que o Governo tinha planos para o tema. Apesar de as ações parecerem pouco práticas, criaram um pano de fundo para que fosse possível tornar a transformação digital uma realidade, focando em telessaúde e interoperabilidade de dados.

“Se como estratégia do país tivesse sido feito algo estruturante antes, nós estaríamos melhor. Mas nada melhor do que pelo menos retomar, embora atrasado. O avanço da saúde híbrida é irreversível e deve ser considerado como uma grande estratégia política, com a condição de que não seja feito por empolgação e desconexo, reunindo boas experiências e fazendo uma orientação estruturante. Essa é a melhor forma de avançarmos nesse processo”, avalia Chao Lung Wen.

Ações como a disponibilização de um prontuário eletrônico gratuito aos hospitais de média e alta complexidade, em parceria com a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), ligada ao Ministério da Eduação (MEC), foi uma das iniciativas que deram um passo nesse sentido, ainda que seus efeitos até o momento sejam pouco visíveis.

A própria criação da Secretaria foi outra ação que animou a saúde, já que elevou a importância que o tema ocupa dentro do organograma do Governo. Agora, iniciativas mais práticas, como o anúncio do modelo de financiamento, começaram a deixar ainda mais claro os rumos que a pasta deve tomar para a construção de uma política pública.

“É muito estimulante ver a Secretaria propondo estas ações na direção da transformação digital do SUS. Ela sinaliza que as ações deverão ser contínuas e que vão contar com sustentação financeira e orientação operacional e metodológica, vindas não apenas da Secretaria, mas de um conjunto expressivo de atores que, além do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e do Conselho Nacional de Secretarias municipais de Saúde (CONASEMS), conta com a Ebserh, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)”, observa Lincoln Moura Jr.

Rafael Machado

Jornalista com foco em saúde. Formado pela FIAMFAAM, tem certificação em Storyteling e Práticas em Mídias Sociais. Antes do Futuro da Saúde, trabalhou no Portal Drauzio Varella. Email: rafael@futurodasaude.com.br

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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  • Rebeca Kroll
    Rebeca Kroll

    Jornalista formada pela Universidade Federal de Santa Maria. Foi trainee do programa "Jornalismo na Prática" do Correio Braziliense, voltado para a cobertura de saúde. Premiada na categoria de reportagem em texto na 2ª edição do Prêmio de Comunicação de Saúde na Primeira Infância da Fundação José Luiz Egydio Setúbal.

  • Rafael Machado

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  • Antônio Britto

    Formado em jornalismo e direito, chefiou redações em diversos veículos de comunicação do Rio Grande do Sul e na Rede Globo em Brasília, onde trabalhou como repórter e comentarista político. Foi secretário de imprensa da Presidência da República com Tancredo Neves. Como político, exerceu mandatos como Deputado Federal constituinte, Presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados, Ministro da Previdência Social e Governador do Estado do Rio Grande do Sul. No setor privado, presidiu a Azaléia Calçados, foi Diretor Institucional da Claro, e Diretor Executivo da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma). Atualmente é diretor executivo da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp).

Rafael Machado

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