Rede Alyne visa diminuição da mortalidade materna com mais investimentos e criação de serviços  

Rede Alyne visa diminuição da mortalidade materna com mais investimentos e criação de serviços  

A nova rede que traz o nome de Alyne Pimentel, vítima da mortalidade materna, surge como reformulação da Rede Cegonha e prevê mais investimentos para a saúde neonatal e pós-natal e criação de mais linhas de cuidado 

By Published On: 25/11/2024
rede Alyne quer reduzir mortalidade materna

Foto: Freepik

O Brasil tem acumulado números altos de mortes maternas nos últimos anos. Foram registradas 66.381 e 69.154 mortes do tipo em 2022 e 2023, segundo o Painel de Monitoramento da Mortalidade Materna. E foram mais de 43 mil óbitos neste ano até agosto, o que dá uma média de 5 mil e 400 mortes maternas por mês. Lançada em setembro, a Rede Alyne surge neste contexto e pretende diminuir em até 50% a mortalidade materna de mulheres negras até 2027. Com um orçamento de R$ 400 milhões em 2024 e R$ 1 bilhão em 2025, ela prevê mais repasses para a rede de assistência às gestantes e cuidados pré-natais, além de investimentos em novos serviços ambulatoriais de risco e atendimento especializado.

A iniciativa é uma reformulação da Rede Cegonha, criada em 2011 para atender gestantes do pré-natal ao puerpério. A nova rede também foca no transporte em casos de emergências obstétricas e uso de prontuário eletrônico e caderneta digital para acompanhar a gestante. 

Para Grace Rosa, diretora do Departamento de Gestão do Cuidado Integral da Secretaria de Atenção Primária à Saúde (SAPS), os altos indicadores de mortalidade infantil e materna — mortes, na maioria das vezes, evitáveis — indicam que algo está errado na saúde do país. “Tivemos avanços ao longo dos anos com a Rede Cegonha, mas houve uma estagnação do ponto de vista de investimento e de ampliação dessa rede e nós não conseguimos reduzir, efetivamente, a mortalidade materna”, comenta. 

A Rede Alyne pretende dar conta das fragilidades de investimento e de assistência às gestantes, reduzindo inequidades raciais. “A ideia é olhar para o território e localizar regiões mais críticas do ponto de vista epidemiológico e de mortalidade materna e infantil”, explica Rosa. Até o momento, foram definidas 31 macrorregiões prioritárias com as piores razões de mortalidade materna para atendimento principalmente de mulheres pretas e indígenas. 

Novos serviços ambulatoriais para saúde de risco 

O programa traz o nome de Alyne Pimentel, vítima da mortalidade materna em 2002, aos 28 anos, grávida de seis meses e tem cinco frentes: pré-natal, parto e nascimento, saúde da criança, transporte e incentivo de qualificação da rede. Um dos elementos contemplados na primeira frente é o Agepa (Ambulatório de Gestação e Puerpério de Alto Risco), um ambulatório especializado para fazer o acompanhamento de pré-natal para gestação e puerpério de alto risco. Ele conta com um financiamento de R$ 100 mil por mês.  

Além do serviço às mães, o programa também prevê um ambulatório para os neonatos. O serviço, que inicia com um investimento de R$ 50 mil por mês, é direcionado para os recém-nascidos precoces que precisam passar por uma UTI Neonatal. Após o tratamento intensivo, esses bebês serão acompanhados por uma equipe multiprofissional para receber atenção e estímulos para um desenvolvimento adequado. 

“Nós tínhamos um financiamento da Rede Cegonha que estava muito voltado para os leitos de maternidade de alto risco. Tinha financiamento para Centros de Parto Normal (CPN), Casas da Gestante, Bebê e Puérpera (CGBP), mas nós estávamos sentindo falta de outros componentes nessa rede. Temos expectativa de que eles vão fazer muita diferença quando começarem a ser financiados”, conta Rosa.  

Central de regulação e transporte 

Um dos pontos determinantes para a redução da mortalidade materna é, segundo a diretora da SAPS, o transporte entre um serviço e outro. Em casos de emergências obstétricas, como em situações de pré-eclâmpsia, por exemplo, o serviço de saúde precisa realizar os primeiros cuidados e o transporte da paciente até um serviço de maior complexidade. Esse serviço de primeiros cuidados recebeu o nome de Central de Regulação. “É a criação de uma equipe especializada que saiba ter um olhar das emergências obstétricas e neonatais para fazer uma regulação e garantir o tempo oportuno e o acesso dessas mulheres aos leitos de complexidade”, explica.  

O serviço voltado ao transporte tem a proposta de ser intra-hospitalar, ou seja, ocorre dentro do hospital e reorienta a paciente de um serviço de menor para um de maior complexidade em tempo oportuno, com equipe especializada para atendimento durante o trajeto. Para esse componente, está previsto um investimento de R$ 50.500 por mês. “Muitas mulheres morrem nesse transporte, e nunca existiu investimento para minimizar isso”, diz Rosa. O programa também visa formar equipes especializadas na regulação do SAMU 192. 

Qualificação da rede e municipalidade 

Para que a atenção à saúde da gestante ganhe capilaridade, a Rede Alyne foca nas municipalidades e na qualificação da rede. Ela pretende incentivar o diálogo dentro das macrorregiões brasileiras, aprimorando os fluxos de informação e comunicação entre diferentes instâncias. Conforme Rosa, ainda será discutido um investimento do Ministério da Saúde, junto do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), para apoiar os novos gestores municipais na concretização da iniciativa.  

Um olhar especial será para municípios pequenos, incentivando-os a melhorar a forma como pactuam com outros municípios próximos para fazer transporte da gestante e de seu bebê para locais com mais estrutura. “Entendemos que o cuidado em saúde precisa ser em rede, regionalizado, de modo que os municípios se complementem para garantir o cuidado integral da mulher e da criança dentro daquela região”, afirma a diretora da SAPS. É importante lembrar que esse cuidado envolve tanto a atenção à gestante no atendimento quanto no seu local de residência.

Caderneta digital e prontuário eletrônico

Outra estratégia da nova rede na redução da mortalidade materna é implementar o prontuário eletrônico. A ideia é incluir uma calculadora clínica no Prontuário Eletrônico do Cidadão (PEC) para analisar e alertar sobre as condições de saúde e de risco da gestante. O instrumento, utilizado na atenção primária, irá trazer informações sobre a conduta mais adequada para a paciente, qual ponto da rede deve atendê-la e outros pontos para auxiliar os profissionais nesse atendimento.  

Além dele, também será implementada a Caderneta Digital da Gestante, ferramenta criada para acompanhar a mulher em seu pré-natal, com registro de informações como quantia de consultas, remédios prescritos, medidas de saúde, entre outros. Esse conjunto de dados permitirá aos profissionais da saúde terem um panorama detalhado da saúde da paciente. “Estamos no processo de digitalização da caderneta para que, através do Meu SUS Digital, a gestante também possa acessar informações, receber alertas da próxima consulta, de exames a serem realizados. Isso deve garantir informação qualificada em tempo oportuno” conta Rosa. 

Investimentos e maiores repasses da Rede Alyne 

Como uma reformulação da Rede Cegonha, a Rede Alyne se propôs a entender as fragilidades do antigo programa e mudar os valores de repasses para determinadas instâncias de cuidado. Dentro da atenção primária, o valor de repasse aos estados e municípios para a realização de exames de pré-natal e de teste rápido de gravidez, que antes era de R$ 55 por gestante por ano, será agora de R$ 144, um pouco mais que o triplo do repasse anterior. 

Outro incentivo é para os bancos de leite humano, com um financiamento de R$ 15 mil a R$ 20 mil por mês. “O Brasil é referência na rede  assistencial para fornecimento de leite humano para bebês que nascem e não conseguem ser amamentados por suas mães, que muitas vezes precisam ficar na UTI, hospitalizadas, sem produzir leite. Os bancos de leite servem para dar sobrevida para esses bebês. É um equipamento super importante que não tinha financiamento do Ministério da Saúde”, conta a diretora da SAPS. 

Além desses projetos, o programa também prevê o incremento do financiamento de outros componentes da rede, como a ampliação de leitos de alto risco, com um incentivo de 30% para Centros de Parto Normal (CPN) e para Casa da Gestante, Bebê e Puérpera (CGBP). Já as Unidades de Cuidados Intermediários Canguru contarão com uma aumento de 240% e o valor da diária de leitos, com um incremento de 82%. “São investimentos muito robustos e significativos. Esperamos que eles façam diferença na qualificação dessa rede, além de investimentos de injeção de recursos diretamente no município”, finaliza Rosa. 

Isabella Marin Silva
Isabella Marin

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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