Santas casas aprovam criação da Tabela SUS Paulista e buscam reajuste nacional

Santas casas aprovam criação da Tabela SUS Paulista e buscam reajuste nacional

Iniciativa do Estado de São Paulo busca corrigir defasagens da tabela SUS nacional, sem reajuste integral há 20 anos.

By Published On: 27/09/2023

A discussão sobre o reajuste da tabela SUS, que remunera os procedimentos, medicamentos e dispositivos médicos utilizados por prestadores de serviços privados e filantrópicos que prestam serviços à saúde pública, ganhou novos capítulos nas últimas semanas. Sem reajuste integral há 20 anos, a referência para o pagamento está mais perto de ser atualizada.

A Câmara dos Deputados aprovou no final de agosto o projeto de lei, de autoria do deputado Antonio Brito (PSD-BA), que propõe o reajuste anual dos serviços, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). O texto seguiu para o Senado, onde aguarda votação.

Por outro lado, o Estado de São Paulo tomou a iniciativa de criar a sua lista de referência para remuneração de prestadores, chamada de Tabela SUS Paulista. Com recursos próprios, o Governo de SP irá investir cerca de R$ 2,8 bilhões anuais para aumentar os valores pagos a hospitais e clínicas, podendo chegar a 5 vezes o valor da tabela nacional, a partir de 1º de janeiro de 2024.

Para as entidades que representam as santas casas e hospitais filantrópicos, principais prestadores de serviços ao SUS e que representam mais de 50% dos atendimentos ambulatoriais e internações hospitalares realizadas, as medidas mostram que há um reconhecimento da importância dessa categoria. Contudo, é preciso que se efetive o reajuste em todo território nacional.

Já para os fabricantes de produtos utilizados nos procedimentos o cenário é um pouco diferente. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Dispositivos Médicos (ABIMO), a categoria ficará de fora caso o projeto de lei seja sancionado com o texto que está em tramitação. Por isso, reivindicam que os governos olhem para o setor.

“Se você não dá reajuste para a tabela, as empresas começam a parar de investir em tecnologias e inovação. Começa a reduzir o atendimento aos clientes, param de participar de eventos que poderiam demonstrar os seus produtos, vão de uma maneira muito simples em feiras, começam a ter dificuldade até para exportar, que nem sempre é maior business dela, mas se não estiver consolidada no país que ela está, começa a enfraquecer”, afirma o CEO da ABIMO, Paulo Henrique Fraccaro.

Tabela SUS Paulista

O Governo do Estado de São Paulo anunciou no dia 28 de agosto, durante celebração da 60 anos da Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB), a criação da Tabela SUS Paulista. O evento contou com a participação do governador, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e do secretário de Saúde, Eleuses Paiva, 70 prefeitos, além de outras autoridades.

De forma simbólica, o anúncio foi feito durante a cerimônia, sendo visto como um reconhecimento do papel que tais instituições têm no atendimento da saúde pública. Cerca de 5 mil procedimentos hospitalares terão reajustes. Os partos normais, por exemplo, irão aumentar de R$ 443,40, valor pago pela tabela SUS nacional, para R$ 2.217, enquanto as cesáreas passarão de R$ 545,73 para R$ 2.182,92.

“Os reajustes não serão lineares. Priorizará com o aumento maior os procedimentos com maior defasagem e os que tem demandas reprimidas, incentivo para acabar com as filas”, alertou Eleuses Paiva durante o lançamento. O secretário disse que a partir da nova tabela de referência, São Paulo irá remunerar adequadamente os hospitais filantrópicos e santas casas pelos serviços à saúde.

A Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes do Estado de São Paulo (Fehosp) é vista como um dos principais envolvidos na criação dessa política. Seu diretor-presidente, Edson Rogatti, aponta que o governador foi o grande responsável por tornar viável, já que não apenas recebeu a proposta, como iniciou o processo para colocá-la em prática.

Com isso, a expectativa é que as santas casas e hospitais filantrópicos reduzam a crise financeira. Em todo o país, instituições acumulam 10 bilhões de reais em dívidas. No Estado, existem cerca de 409 unidades da categoria, e em 149 cidades são considerados o único acesso da população local à saúde hospitalar, que inclui média e alta complexidade.

“A gente espera que isso seja realmente efetivado e sirva de uma mola propulsora para que os outros estados também adotem este procedimento, para que os outros estados não se sintam inferiorizados, dentro do atendimento dos seus públicos em geral, tentando pagar por uma tabela real, porque hoje só provoca um aumento das filas”, defende Paulo Henrique Fraccaro, CEO da ABIMO. Ele aponta que uma fatia dos produtos médicos farão parte do reajuste, o que incentiva a indústria a produzir e investir em novas tecnologias.

Reajuste nacional?

Aproveitando o lançamento da Tabela SUS Paulista, Mirócles Veras, presidente da CMB, espera que o Ministério da Saúde firme compromisso para ter um reajuste nacional. Segundo ele, há uma defasagem de 40% a 60% do valor por procedimento, o que tem agravado o cenário das santas casas e hospitais filantrópicos por todo Brasil.

“Estamos tentando levar isso para a conscientização do governo federal de que é preciso efetivar de uma forma concreta, através de um projeto, fazer a tabela ter uma remuneração mais justa para nossas santas casas de todo o Brasil. Porque reconhecimento sem um pagamento não adianta”, defende o executivo.

Uma das possibilidades é através do projeto de lei 1435 de 2022, que tramita no Congresso Nacional. Mesmo que tenha sido aprovado na Câmara dos Deputados, a proposta ainda precisa ser votada e aprovada no Senado Federal e posteriormente sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Por isso, as entidades que representam as santas casas e hospitais filantrópicos trabalham para sensibilizar o governo sobre o tema.

O presidente da CMB afirma que está atuando para isso e que, até o momento, o Ministério da Saúde tem se manifestado à favor da proposta de reajuste. Segundo Veras, o secretário de Atenção Especializada, Helvécio Miranda Magalhães Junior, relatou que o aumento dos contratos junto aos prestadores de serviços já está previsto para 2024. Contudo, o líder da entidade defende que independentemente da gestão federal, os estados podem e devem criar suas próprias tabelas de referência.

“Quando se fala que São Paulo tem muito recurso, é verdade, mas também tem muito atendimento. Cada estado tem uma demanda e recursos proporcionais. O Governo do Estado de São Paulo efetivamente colocou recursos porque precisa manter o SUS. O próprio Governo Federal, que vai ter um aumento significativo do seu orçamento, pode tranquilamente fazer uma política voltada ao aumento dos procedimentos e o financiamento às nossas instituições”, defende Mirócles.

Dispositivos médicos de fora

“Esse projeto de lei sobre o reajuste anual não fala que a tabela SUS do produto será reajustada. Quando conversamos com Antônio Brito, deputado federal que idealizou o PL, e conversamos com o deputado federal Pedro Westphalen, que é o relator deste projeto, nos disseram que os produtos ficaram fora porque a preocupação foi primeiro sobre os procedimentos. Então, ele falou que precisaremos discutir um outro projeto para dar a correção automática aos produtos médicos, como é feito com os produtos farmacêuticos”, explica Paulo Henrique Fraccaro, CEO da ABIMO.

Em agosto deste ano, o Ministério da Saúde anunciou a liberação de 270 milhões de reais para reajustar 14 procedimentos cardiovasculares na tabela SUS em até 75%. A pasta divulgou que os valores relativos à 12 órteses, próteses e materiais especiais (OPMEs) seriam reajustados, após terem seus valores reduzidos na gestão anterior. No entanto, a promessa era retomar apenas os valores prévios.

A ABIMO defende que, a exemplo da tabela SUS Paulista, outros estados façam suas próprias listas de valores locais por procedimentos e dispositivos. Contudo, o ideal, na visão da entidade, seria propor alternativas que substituíssem a tabela federal. Da mesma forma, o CEO defende que o déficit da saúde não está apenas na falta de orçamento para reajustar os valores, mas que uma melhor administração poderia ser suficiente para realocar recursos.

“O ideal é pegar o valor que o governo gasta com produtos e colocar dentro dos procedimentos, e deixar a negociação de hospital por hospital. Mas esse projeto ainda é complicado. Não estamos parados, faz parte da agenda da ABIMO”, afirma Fraccaro.

Rafael Machado

Jornalista com foco em saúde. Formado pela FIAMFAAM, tem certificação em Storyteling e Práticas em Mídias Sociais. Antes do Futuro da Saúde, trabalhou no Portal Drauzio Varella. Email: rafael@futurodasaude.com.br

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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