Quanto um país perde de produtividade por causa de doenças? Estudo interliga crescimento econômico e saúde

Quanto um país perde de produtividade por causa de doenças? Estudo interliga crescimento econômico e saúde

Estudo da FIFARMA e WifOR analisa interligação de saúde e crescimento econômico e aponta como investir na saúde traz retorno socioeconômico para um país; relatório analisou oito países latinoamericanos, entre eles, o Brasil

By Published On: 24/07/2024
Estudo analisa impacto das doenças na produtividade de um país

Fonte: Adobe Stock Photos.

Um novo estudo que investiga a relação entre saúde e crescimento econômico nos países da América Latina revela como certas doenças, como enxaquecas e problemas cardiovasculares, impactam negativamente a produtividade de um país. Elaborado pela Federação Latino-americana da Indústria Farmacêutica (FIFARMA) em colaboração com o instituto alemão WifOR, a pesquisa apresenta que o Brasil sofreu uma perda de 135,9 bilhões de dólares em 2022 com diminuição na produtividade em decorrência de substituições de trabalhadores devido a doenças. Ainda de acordo com o estudo, a enxaqueca é a principal causa associada e registra perdas comparáveis a de pessoas acometidas com neoplasias.  

“Tentamos reposicionar a saúde como um investimento e não como um fator de custo”, explicou ao Futuro da Saúde, Dennis A. Ostwald, autor do estudo, fundador e diretor executivo do WifOR Institute, que realiza pesquisas econômicas. O estudo aborda como os investimentos na área da saúde se relacionam com a oferta de mão de obra do país, uma vez que as doenças diminuem a capacidade de trabalho de um indivíduo. Por outro lado, investir mais na saúde e em medidas de prevenção podem refletir positivamente na economia do país, com pessoas saudáveis atuando ativamente.

O relatório analisou oito países latino-americanos com base nos maiores PIBs da região, sendo eles a Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, México e Peru – e o encargo socioeconômico de sete doenças: cardiovasculares, neoplasias, doença isquêmica do coração, infecções respiratórias inferiores, cancro da mama, diabetes tipo 2 e enxaqueca.

De acordo com os resultados, em 2022 as economias latino-americanas incorreram em perdas que variaram entre 2,8 bilhões de dólares na Costa Rica e 135,9 bilhões de dólares no Brasil. Em termos de impacto econômico relativo, as perdas variaram entre 2,5% do PIB no Peru e 6,4% na Argentina – no Brasil representou 4,1% do PIB naquele ano.

Para determinar o impacto socioeconômico dessas doenças, foram considerados dois cenários para análise: um deles aborda o capital humano, nas situações em que há perda insubstituível de produtividade gerada por um indivíduo, em casos de morte prematura, por exemplo. O segundo cenário considera a abordagem chamada de custo de fricção, que é quando o trabalho de um indivíduo é assumido por outro (ou por uma tecnologia) no intervalo de um ano.  

Perda socioeconômica por acometimento de doenças 

No Brasil, a enxaqueca, diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares foram as principais enfermidades que geraram maior gasto socioeconômico para o país, de acordo com o estudo. A primeira, que se trata de uma doença neurológica e crônica, gerou uma perda de 1,60% do PIB brasileiro de 2022 e as demais tiveram valores de 1,20% e ao redor de 0,80%, respectivamente.

“É uma espécie de perspectiva econômica do gasto, mas, por detrás deste efeito econômico, há pessoas” comenta o fundador da WifOR. “Fiquei chocado com o impacto da enxaqueca ser tão elevado, mas há muitas pessoas em idade ativa que sofrem disso, dois terços são mulheres, um terço são homens, e por isso trabalham, mas não conseguem trabalhar de forma tão produtiva como se não tivessem enxaqueca, ou não estão trabalhando. 

Tendências temporais do encargo socioeconômico das sete doenças selecionadas para o estudo com o cenário de substituição. Fonte: WifOR.

No cenário de perda insubstituível do capital humano, enfermidades com taxa de mortalidade mais alta ficam em evidência, como as doenças cardiovasculares, classificadas como a principal causa de morte no mundo. No Brasil não é diferente, a perda é de 2,2% do PIB. Na Argentina, esse valor é ainda maior: o país vizinho enfrenta uma perda de 5,3% de seu PIB com doenças cardiovasculares. No Brasil, as mais fatais estão entre os diferentes tipos de AVC e problemas no miocárdio, segundo pesquisa publicada pelo Journal of the American College of Cardiology. 

Nos oito países em 2022, considerando as doenças selecionadas pelo estudo, US$ 59,3 bilhões foi o custo no cenário de substituição do empregado e US$ 196,4 bilhões de dólares considerando a hipótese de não substituição.

A presença de doenças cardiovasculares, enxaqueca e diabetes do tipo 2 como as maiores causadoras de perda de produtividade nos países existe em ambos os cenários nas análises dos países. Alguns, porém, ficam em destaque, como é o caso de neoplasias no Peru, Chile e Argentina, que toma a primeira posição no ranking de doenças que mais impactam economicamente o país no cenário de não substituição – as neoplasias ficam na segunda ou terceira posição entre as causas de perda econômica no Brasil, Colômbia, Equador e Costa Rica, e quarto no México. 

Esse fenômeno se repete em todos os países do estudo, exceto no México, onde a diabetes do tipo 2 aparece sendo a principal doença cenário de não substituição, com valor de perda próximo de 2% do PIB em 2022, seguida de doença cardiovascular e enxaqueca, respectivamente. 

Tendências temporais do encargo socioeconômico das sete doenças selecionadas para o estudo com o cenário de não substituição. Fonte: WifOR.

Investimento na saúde  

Como parte das medidas para sanar essa situação, o fundador da WifOR foca no relacionamento com órgãos governamentais e instituições para promover ações. A primeira delas, segundo ele, é focar no problema do subfinanciamento na saúde e convencer governos de que é necessário investir na área, mostrando que esse também é um fator de crescimento e de riqueza. “É importante convencer os governos a investirem de forma inteligente, a atacarem certas áreas de doenças e dar prioridade às áreas onde podemos criar alguns frutos mais fáceis. Significa que podemos prevenir as doenças cardiovasculares, por exemplo. Faz parte da nutrição, da educação, existem medidas para as prevenir e devemos fazê-las”, comenta.

A segunda medida seria estudar onde se deve investir, onde estão os gargalos na saúde que impactam a situação socioeconômica do país e quais doenças desembolsam mais do dinheiro público e diminuem a produtividade. Uma alternativa viável é o diagnóstico precoce, como no diabetes, câncer e doenças cardiovasculares, despendendo menos da saúde e também favorecendo a vida do paciente que será tratado antes de uma possível progressão da doença.  

Segundo Ostwald, alguns países já tomam medidas a partir de dados semelhantes. “Agora existem estratégias para o câncer e doenças cardiovasculares em alguns países europeus, onde em parte estes dados estão incorporados. Penso que levará tempo, mas espero que se iniciem mais iniciativas assim”, conclui. “É uma necessidade de ação. Compreender para poder investir, não cortar custos, e investir com um elevado retorno, investir na prevenção.”

Isabella Marin Silva
Isabella Marin

About the Author: Isabella Marin

Leave A Comment

Recebar nossa Newsletter

NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

Isabella Marin Silva
Isabella Marin