Falta de profissionais de tecnologia na saúde faz empresas criarem cursos próprios de formação
Falta de profissionais de tecnologia na saúde faz empresas criarem cursos próprios de formação
A pandemia de Covid-19 acelerou a digitalização de serviços e
A pandemia de Covid-19 acelerou a digitalização de serviços e processos em praticamente todos os setores da economia. Para tornar essa transformação possível, cresceu também a demanda por profissionais de tecnologia. De acordo com projeção da Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), o déficit de mão de obra qualificada nessa área deve chegar à casa dos 420 mil até 2024.
Como solução para a falta de talentos, o mercado tem apostado na formação de profissionais dentro de seu próprio ecossistema. De acordo com a pesquisa Agenda 2022, realizada pela consultoria Deloitte em fevereiro deste ano, nove em cada dez empresas devem aumentar ou manter investimentos em qualificação na área de tecnologia. Dessas, 74% vão direcionar treinamentos para áreas internas.
Essa realidade não se restringe às big techs. O setor da saúde segue na mesma direção e, além da dificuldade de encontrar profissionais qualificados, “a permanência e manutenção do engajamento passa a ser um desafio, sendo necessário lideranças que valorizem mais o indivíduo e fortaleçam o senso de pertencimento”, aponta Andrea Suman, superintendente de estratégia e inteligência de dados do Hospital Israelita Albert Einstein.
Considerando esse cenário em que a velocidade da demanda é maior que a da formação, o Einstein passou a oferecer seus próprios cursos profissionalizantes. Dentro do Instituto de Ensino e Pesquisa do Einstein, existem opções de cursos técnicos, de pós-graduação, de curta duração e à distância.
Formação própria de profissionais de tecnologia
O coordenador da pós-graduação em Data Science e Informática em Saúde, Antonio Valadares, explica que esse curso, especificamente, existe desde 2018, mas que o time de ensino reavalia o currículo das aulas constantemente.
Com duração de um ano, ele é voltado para gerentes, coordenadores e analistas que precisam desenvolver a parte técnica e propor soluções de dados para gerar ganhos de processo. “O público-alvo são pessoas que não são da área da saúde, que não são técnicos. Aqui, eles vão aprender ciência de dados de forma 100% prática, tendo como base cases de saúde e vão sair do curso completamente ambientados, já podendo atuar”.
Para formar líderes da área da saúde que incentivem o movimento de uma cultura de uso de dados, foram desenvolvidos alguns cursos de curta duração. O curso Big Data, Analytics e Inteligência Artificial para Lideranças na Saúde, de pouco menos de dois meses de duração, foi desenhado para desmistificar e ensinar como solucionar os desafios práticos da adoção da tecnologia.
E o Transforming Healthcare Through Big Data, Analytics, and AI é um programa intensivo de cinco dias que oferece uma imersão prática no mundo da tecnologia e conta com a colaboração do Stanford Center for Health Education (SCHE). “Essa formação internacional permitirá conectar lideranças com um centro de referência e cases globais.”, destaca Andrea.
Saúde e tecnologia: onde os dois setores se encontram
A necessidade de mais profissionais capacitados na área ocorre porque, hoje, a jornada de um paciente em uma instituição de saúde modernizada é permeada por tecnologia de ponta a ponta. Logo na entrada de um hospital, por exemplo, o indivíduo se depara com totens para identificação e processo de admissão digitalizado. No encontro com o médico, todos os relatos de queixas e sintomas são registrados em prontuários eletrônicos e o mesmo acontece com exames, medicamentos e demais procedimentos, até o momento da alta.
Cada parte do processo é transformada em dados, que, depois de analisados, terão a função de trazer melhorias como atendimento mais eficiente, melhor proveito das instalações hospitalares e uma visão mais ampla de negócio.
“É difícil fazer uma boa gestão sem uso dos dados. Por isso, em todas as áreas do negócio, desde a clínica médica, passando pela administração hospitalar e até a área de finanças, por exemplo, é preciso implementar células com a missão de evoluir a maturidade e desenvolvimento de soluções analíticas e formar seus integrantes para terem mais autonomia e propagarem esse conhecimento nas próprias áreas, de forma que essa cultura de tomada de decisão baseada em dados passe a fazer parte do seu DNA”, ressalta Andrea.
Para atender às mais diferentes demandas, é preciso também diferentes perfis de profissionais. Andrea Suman explica que eles se dividem em três grupos principais: os analistas de dados, que estudam os dados e fazem diagnósticos a partir deles, os cientistas de dados, que fazem análises de dados mais avançadas, como machine learning e IA, sendo capazes de interpretá-los por meio de algoritmos, e os engenheiros de dados, que apoiam os analistas e cientistas tratando e disponibilizando os dados.
“Precisamos também de um profissional que tenha expertise na área da saúde, para conseguir traduzir as informações para a área de interesse, bem como entender as reais necessidades das áreas e traduzir para os profissionais mais técnicos. As equipes, então, são sempre multidisciplinares e complementares. Ou seja, tem espaço para todos os tipos de perfis e é bastante comum que quem está começando na área entenda em qual dessas funções melhor se adequa na prática”, reforça.
Olhar para a diversidade e inclusão
O Einstein também tem impulsionado diferentes projetos com foco em empregabilidade de grupos minorizados por meio da estratégia do Programa de Diversidade, Equidade e Inclusão. Nesse sentido, recentemente 27 pessoas em situação de refúgio e imigração participaram de um curso intensivo gratuito de cinco meses oferecido pelo Einstein. O programa foi feito em parceria com a plataforma de ensino Toti Diversidade.
“Muitos dos participantes tinham nível alto de formação em seu país de origem. São médicos, fisioterapeutas, administradores e doutorandos que agora também contam com a formação em nível um de análise de dados para se reinserir no mercado de trabalho”, relata Jefferson Vieira, consultor de analytics e responsável pelo programa. “Dois deles foram contratados por outras empresas antes mesmo de se formaram e outros três estão sendo contratados pelo Einstein e a meta é seguirmos com o aproveitamento de toda a turma em nossas vagas”.
O curso, ministrado de forma online, englobou moradores de estados como Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Amazonas, que vieram de países como Venezuela, Colômbia, Angola e Egito.
No segundo semestre de 2022, outro programa focado na inclusão e na diversidade terá início. Dessa vez em parceria com a plataforma de educação Let’s Code, o programa terá como foco os moradores de Paraisópolis, a segunda maior comunidade de São Paulo, localizada na zona sul da cidade.
Os 30 participantes, que estão sendo selecionados entre os mais de 720 inscritos, aprenderão a linguagem de programação Python e contarão com módulos de aulas focados em SQL, Power BI, lógica de programação, banco de dados e técnicas de programação.
“A idade dos participantes, de 18 a 30 anos, foi definida com base em uma pesquisa que mostrou que os jovens foram os que tiveram mais dificuldade de se inserir no mercado de trabalho durante a pandemia”, conta a coordenadora de atração e seleção do Einstein, Tatiane Cabral, que também coordena o programa.
Ela explica que a seleção dos participantes tem sido bastante focada na diversidade. “Além de ser obrigatório ser morador de Paraisópolis, não queremos que o programa contemple 30 pessoas brancas ou 30 homens, por exemplo. A ideia é ter um grupo diverso, oferecendo oportunidade para todos”, diz.
As aulas serão online e ao vivo e os estudantes poderão acompanhá-las de dentro do PEC — Programa Einstein na Comunidade de Paraisópolis, que atua na comunidade desde 1998 por meio de oficinas de atividades e atendimento que integram educação, serviço social, esportes, artes, saúde e capacitação profissional.
“O PEC já contava com uma sala de informática com 20 computadores. Agora, incluímos mais dez máquinas, para que os alunos possam assistir às aulas com garantia de internet de qualidade, sem interrupções e podendo trocar e se conectar com os colegas de turma”. O curso terá pouco mais de quatro meses de duração e a expectativa é que alguns desses participantes sejam contratados, posteriormente, pelo próprio Einstein.
Solução dentro de casa
A instituição também tem buscado dentro de casa por profissionais que contam com a expertise da saúde, mas que têm interesse em migrar para a área de tecnologia, com possibilidade de fazer a transição de carreira internamente.
Segundo Andrea Suman, o Programa de Formação Tech e Dados, como é chamado, atraiu a atenção de 850 profissionais. “Hoje, trabalhamos com trilhas de conhecimento e cada um pode aprender no seu tempo. Mas queremos fechar turmas e trabalhar de forma síncrona, para que os participantes possam se conectar e seguir um ritmo mais acelerado de aprendizado”, diz.
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NATALIA CUMINALE
Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.