Sob apreensão das operadoras, nova versão do PL dos planos de saúde deve sair até 7 de junho

Sob apreensão das operadoras, nova versão do PL dos planos de saúde deve sair até 7 de junho

Futuro da Saúde conversou com o deputado Duarte Jr, relator do PL dos planos de saúde, que quer limitar o reajuste para planos empresariais

By Published On: 31/05/2023
Entidades e operadoras defendem que faltam discussões técnicas para a construção do PL dos planos de saúde.

Relator do PL dos planos de saúde, o deputado Duarte Jr (PSB-MA) afirma que deve soltar a primeira versão do texto até 7 de junho — a expectativa é que seja votado no final do mesmo mês. Designado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, o parlamentar tem defendido uma posição em prol dos direitos do consumidor, provocando uma agitação nas entidades e operadoras.

Isso porque tem defendido pautas principais para encabeçar o projeto, dentre elas definir que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) faça o cálculo e defina o reajuste anual dos planos empresariais e coletivos, como ocorre com os planos individuais e familiares, e impedir a rescisão unilateral nessa mesma categoria.

A rigidez da regulamentação dos planos individuais e familiares fez com que houvesse uma escassez destes produtos no mercado. Sendo considerados mais flexíveis e com regras mais brandas, os planos de saúde empresariais e coletivos representam 82% dos beneficiários, que em geral são fornecidos como benefícios aos colaboradores de uma empresa ou contratados por um grupo de interesse. 

“Se você coloca o Estado para regular contratos entre as partes, começa a ficar muito preocupante até por uma questão de imprevisibilidade. Quando você tem uma visão do individual tudo bem, o Estado tem que entrar com alguma regulação, não dá para você querer que cada pessoa negocie o seu próprio contrato. Mas uma empresa que tenha de 50 a 100 mil funcionários tem que ter as condições de avaliar e negociar seu contrato”, defende Anderson Mendes, presidente da União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde (UNIDAS).

Em um cenário de altos custos e sinistralidade próxima de 90%, os planos de saúde temem que o texto apresentado pelo relator traga ainda mais insegurança. Caso aprovado pelo Congresso Nacional, pode provocar uma mudança regulatória grande o suficiente para inviabilizar o trabalho das operadoras, principalmente as de pequeno e médio porte.

Palavras do relator do PL dos planos de saúde

Relator do PL 7419/2006, o deputado federal Duarte Jr tem um história de atuação pelo direito do consumidor, tendo sido presidente do Procon Maranhão e de outros pelo nordeste entre 2015 e 2018. Em seu primeiro mandato no Congresso, o parlamentar está realizando audiências públicas em 5 estados de diferentes regiões para ouvir as contribuições da sociedade.

“Meu objetivo é antes do dia 7 de junho divulgar o relatório. Nas contribuições durante os encontros têm muitas críticas a determinadas questões que já estão pacificadas, então a ideia de apresentar no meio desses debates é exatamente para dar tempo de se ouvir contribuições e a gente retificar ou acrescentar algumas coisas”, afirma o deputado.

Há 17 anos na Câmara dos Deputados, o projeto de lei já aglomera 268 propostas apensadas que devem ser analisadas pelo relator para construir o texto. Contudo, o deputado é veemente ao afirmar que qualquer proposta que conste no relatório será pensando na defesa do consumidor.

Em seus discursos, Duarte Jr tem defendido algumas bandeiras principais, como a proposta da ANS regular o reajuste dos planos empresariais, o fim da rescisão unilateral e a possibilidade dos planos de autogestão serem fiscalizados pelos institutos de defesa do consumidor.

“O consumidor contrata o plano de saúde não desejando usar, para ter segurança de que, quando mais precisar, poder utilizar e ter certeza que vai ter o acesso à saúde. No entanto, o que acontece é que o consumidor paga caro por um serviço de péssima qualidade e quando mais precisa fica na mão, não tem a prestação que contrata. É isso que a gente precisa mudar”, defende o deputado.

A rescisão unilateral de contratos entre planos de saúde e empresa é permitida pela ANS e as condições devem constar em contrato. Já para planos individuais e regulares, somente por fraude comprovada do beneficiário ou inadimplência. Contudo, o tema ganhou destaque no último mês por denúncias contra a Unimed, de que a operadora estaria cancelando o plano de saúde de pacientes durante tratamento, em sua maioria com autismo. O Ministério Público de São Paulo (MPSP) abriu um inquérito para investigar.

A Unimed do Brasil foi, inclusive, uma das operadoras que tiveram encontros com o deputado para tratar sobre o PL dos planos de saúde, como relata Omar Abujamra Junior, presidente da empresa: “O deputado Duarte Jr. nos recebeu e disse que pretende ouvir o setor, entidades e conselhos de classe. Estamos disponíveis para esse diálogo. O marco regulatório deve ser claro, objetivo e consistente, trazendo segurança assistencial, jurídica e econômica, tanto para beneficiários quanto para operadoras. Entendemos que a promoção do acesso e a manutenção da qualidade e da sustentabilidade dos planos devem ser pontos de convergência para o novo texto”.

A expectativa do deputado é que o projeto entre na pauta na Câmara dos Deputados e seja votado até o final de junho. Em sua visão, “dificilmente a gente não consegue vencer e não ter o apoio dos deputados que lá estão. Eles estão lá para defender o cidadão e o consumidor. Então, se a gente expõe que o que de fato tem ali vai ser bom para as pessoas, com certeza a gente vai ter o apoio e conseguir aprovar”.

O lado dos planos

Em nota, a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) afirma que teme “pela adoção de mudanças que desconsiderem o panorama de maneira mais ampla e coloquem em risco a sobrevivência da saúde privada no país. Quem perderia com isso seriam todos os brasileiros”.

A entidade defende que haja uma discussão aprofundada sobre o projeto de lei, através de uma comissão para garantir a construção de soluções equilibradas e que não inviabilize a atuação das operadoras. Reforça que ao longo de 2022, o setor teve um prejuízo de 10,7 bilhões de reais, em um cenário de alta da inflação da saúde, fraudes, instabilidade das regras de uso dos planos e judicialização.

As operadoras esperavam mudanças para que em 2023 houvesse discussões em torno da flexibilização das regras para conseguirem criar novos produtos, como os planos ambulatoriais, aumento do limite de coparticipação do beneficiário, revisão da lei do rol exemplificativo, dentre outras ações que trouxessem um maior número de usuários e melhorassem a receita. Contudo, a discussão sobre o PL dos planos de saúde aponta para o lado oposto.

“Nitidamente algumas posições sobre o projeto de lei são de quem não entende profundamente como funcionam os planos de saúde. O deputado Duarte Jr traz essa visão do consumidor que é muito importante também, mas precisa somar com outros debates técnicos, não apenas políticos ou de ordem econômica de consumidor”, defende Anderson Mendes, da UNIDAS.

A posição é a mesma defendida pela Unimed do Brasil, que afirma que medidas tomadas sem embasamento técnico poderão acarretar em um aumento da sobrecarga à saúde suplementar e reforça que a sinistralidade, que entre abril e setembro de 2022 superou 91%, é insustentável a longo prazo.

“Como contribuição para esse debate, acreditamos que o novo marco regulatório deve garantir e ampliar o acesso da população à cobertura dos planos de saúde e que, para isso, é fundamental assegurar a sustentabilidade econômico-financeira dos contratos. Portanto, é fundamental que as alterações na lei que regulamenta planos e seguros saúde sejam embasadas em um debate qualificado e estudos de impacto”, argumenta o presidente Omar Abujamra Junior.

Com os poderes Legislativo e Judiciário sobrepondo a atuação da ANS, também existe o risco da agência ter o seu poder de decisão e regulamentação ainda mais diminuído. No entanto, o deputado Duarte Jr esclarece que o Congresso tem observado as resoluções consideradas positivas e pretende incluí-las no relatório, para que ganhem força de lei. Apesar disso, ele tece críticas à atuação do órgão:

“A imagem da ANS se deteriora por culpa dela. Todas as agências reguladoras têm uma imagem deteriorada, deixam muito a desejar em sua função perante o consumidor. De acordo com a legislação sobre as agências, elas não são órgãos de defesa do consumidor, ninguém está discutindo isso. Mas também não são agências de defesa das empresas. O objetivo delas é harmonizar as relações, equilibrar e melhorar o serviço”.

Reajuste e planos de autogestão

O reajuste máximo dos planos individuais e familiares é definido pela ANS anualmente com base em um cálculo que leva em consideração a Variação das Despesas Assistenciais (VDA), o Fator de Ganhos de Eficiência (FGE), a Variação da Receita por Faixa Etária (VFE) e o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). A fórmula é empregada para todos os beneficiários que possuem planos desse tipo.

Já para planos empresariais o reajuste é diferente. Em empresas de 30 funcionários ou mais, ele é definido pela própria operadora, com base nos custos assistenciais que a carteira de beneficiários utilizou ao longo do ano. Empresas que utilizam mais os serviços de saúde terão, consequentemente, um maior reajuste. Como há a possibilidade de rescisão unilateral, ela pode optar por trocar de operadora caso não concorde com o valor.

Modificar essa dinâmica pode fazer com que empresas que tenham poucos gastos sofram com um reajuste maior, e empresas com um alto índice de sinistralidade tenha um reajuste abaixo do previsto. Para as operadoras, a conta pode não fechar, em casos em que o investimento seja maior que o retorno.

“Precisa ter o mínimo de previsibilidade. Se você acabar com isso, não sabemos o quanto vai gastar porque tem o rol exemplificativo, então pode ser que amanhã tenha que gastar mais dinheiro, e não se sabe quanto vai poder reajustar, porque a ANS que determinaria quanto vai ser o reajuste. Então, alguns empresários podem fechar o negócio e não ter mais planos de saúde”, alerta Anderson Mendes, presidente da UNIDAS.

As operadoras de autogestão também estão na mira do projeto de lei. O deputado Duarte Jr afirma que pretende mudar a questão dos planos de saúde desse tipo não poderem ser fiscalizadas pelos institutos de defesa do consumidor. Contudo, Mendes explica que a regulação é diferente, já que um beneficiário tem caráter de associado da operadora, como ocorre em clubes e condomínios, e por isso não é juridicamente um consumidor. 

O presidente da UNIDAS esteve presente na audiência pública sobre o PL dos planos de saúde realizada na segunda-feira, 29, na Assembleia Legislativa de São Paulo, para buscar esclarecer alguns pontos ao deputado. Através do diálogo, pretende seguir com os debates para fortalecer a importância dos planos de saúde para a sociedade e defender a atuação das operadoras.

“Precisamos nos unir para encontrar soluções que sejam mais modernas. Temos uma lei muito antiga, com mais de 20 anos, que precisa com certeza de uma revisão, mas à luz daquilo que traga benefício para todo mundo. É preciso que a gente traga informações técnicas sobre isso, não pode ser a posição de um beneficiário, um plano de saúde ou um hospital que vai traduzir a nova legislação”, defende Mendes.

Rafael Machado

Jornalista com foco em saúde. Formado pela FIAMFAAM, tem certificação em Storyteling e Práticas em Mídias Sociais. Antes do Futuro da Saúde, trabalhou no Portal Drauzio Varella. Email: rafael@futurodasaude.com.br

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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