Patricia Frossard, CEO da Philips: “Tendência é que interoperabilidade avance com regulamentação”
Patricia Frossard, CEO da Philips: “Tendência é que interoperabilidade avance com regulamentação”
No mais recente episódio do Futuro Talks, Patricia Frossard falou sobre inovação, interoperabilidade e a competitividade do Brasil na produção global de tecnologias
Um dos caminhos para superar as pressões de custo passa pela adoção de tecnologias para ganhar eficiência e gerir melhor os dados. Principalmente em hospitais, o prontuário eletrônico desempenha um papel-chave nesse processo. Mas pensando no sistema de saúde como um todo, não basta implantar softwares: os dados precisam conversar entre si, no conceito conhecido como interoperabilidade. O avanço está ocorrendo, mas para Patricia Frossard, CEO da Philips, será inevitável o surgimento de uma regulamentação para que isso ocorra em todos os pontos. Ela é a entrevistada do novo episódio de Futuro Talks.
Segundo ela, a interoperabilidade já é realidade em ações isoladas, dentro de empresas ou redes verticalizadas, mas a disseminação para o sistema como um todo – público e privado – ainda está longe. E a legislação deve ser uma tendência para influenciar com que todos adotem um padrão que seja intercambiável. A Philips, que completa 100 anos de Brasil em 2024, tem atuado nesse sentido e sua plataforma de prontuário eletrônico, o Tasy, foi a primeira a ser aprovada como dispositivo médico pela Anvisa. Atualmente, a companhia tem mais de 1.500 clientes no Brasil e 1.800 na América Latina e oferece linha de tecnologia em saúde da empresa se divide entre softwares e equipamentos para clínicas e hospitais e em cuidados pessoais.
Ao longo da conversa, Frossard reiterou que a saúde pública também tem avançado nesta questão. Na visão dela, se antes o foco das decisões era muito imediatista, agora há uma visão mais estruturada do que se almeja. E a integração de dados faz parte desse cenário. Ela ainda comentou que vê o país mais bem posicionado em termos de competitividade produtiva global. “Com a pandemia, as empresas perceberam que era um risco ser dependente de poucas bases produtivas”, afirmou. Neste contexto, com o Complexo Econômico-Industrial da Saúde e a reforma tributária, o Brasil aumenta suas chances de atrair produção. A Philips, inclusive, já planeja produzir localmente novos produtos.
Graduada em Direito e com especializações pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) e Fundação Getulio Vargas (FGV), Frossard também assumiu em janeiro a presidência do conselho da Administração da Associação Brasileira da Indústria de Tecnologia para Saúde (ABIMED). É a primeira mulher a ocupar o cargo.
Confira a entrevista a seguir:
Para onde está o olhar da Philips hoje? É mais equipamento, software ou são as duas coisas?
Patricia Frossard – São as duas coisas. Vale até contextualizar um pouco da história da Philips. A Philips tem 133 anos de existência e está no Brasil há 100 anos. E estar numa empresa com tanto tempo de existência, já demonstra que ela tem inovação no seu DNA. Vimos muitas empresas que não conseguiram trilhar esse mesmo caminho por tanto tempo. Muitas têm inovação, mas não têm governança. E isso falta. Mas se não focar na inovação, acaba não tendo relevância no mercado. Acredito que a Philips conseguiu fazer isso muito bem. Antes, nós tínhamos um portfólio de produtos onde o foco era mais o consumidor final. Sempre tivemos saúde no portfólio, mas não era a atuação principal da Philips. Porém, há uns 14 anos, o CEO da época olhou para o futuro e viu onde a nossa tecnologia pode agregar mais. Viu dois mercados potenciais: um era saúde e outro energia. Em saúde, já atuávamos. Então começamos a direcionar todos os nossos esforços. E para isso, passamos também a fazer desinvestimento naqueles produtos que não faziam parte mais dessa estratégia. Depois, fizemos a venda da divisão de TV, áudio e vídeo, iluminação. Todo mundo ainda vê a marca nos produtos, por isso que há essa confusão. A Philips não produz mais, o que nós temos é uma licença de marca, porque esses produtos passaram para outras empresas.
O foco está totalmente na saúde, então?
Patricia Frossard – O foco desde então foi só voltado para a saúde. Tivemos várias aquisições a partir daí. Muitas delas ligadas a software para fazer a conectividade de tudo que já tínhamos em hardware. Nestes últimos tempos, o foco foi principalmente na área de tecnologia, de software. Posso destacar aqui a Carestream, adquirido em 2019 e também o Tasy, nosso prontuário eletrônico, que é um produto brasileiro, mas é o único EMR (prontuário eletrônico) da Philips no mundo, adquirido em 2007. Além de uma série de outros que foram adquiridos, principalmente nos Estados Unidos.
De software você trouxe alguns exemplos. E tem o lado do equipamento?
Patricia Frossard – Quando falamos da Philips, conseguimos pensar em produtos de saúde durante toda a jornada de um paciente. Temos um portfólio de consumo em que entra a Avent, por exemplo. Temos as escovas elétricas, que também é ligada à saúde. E depois você passa para o diagnóstico, tratamento e até home care, como os respiradores, tratamentos de sono e respiração. Assim, permeamos toda a jornada do paciente. Logo, tudo isso produz dados o tempo todo e vimos que precisamos coletar esses dados, gerar insights para melhorar a vida do cliente. Queremos facilitar a jornada dele e do profissional de saúde que está dentro da instituição. Por isso continuamos tendo como foco as duas coisas.
O Tasy foi o primeiro prontuário eletrônico regulado como dispositivo médico perante a Anvisa no Brasil. Como foi esse processo e o que ele representa como um passo para Philips dentro do sistema de saúde aqui do Brasil?
Patricia Frossard – Essa foi uma evolução natural, uma vez que o prontuário eletrônico deixa de ser simplesmente uma ferramenta de gestão, de arquivamento de dados, e passa a ser um apoio na tomada de decisão do médico.
“Eu sempre falo que a legislação corre um pouco atrás da inovação. As coisas vão acontecendo e então vem a legislação, a regulamentação, para tentar controlar aquilo que está acontecendo. Foi assim com a internet e está sendo assim com o software.”
Isso é bom porque traz segurança para o paciente e para o médico na hora de tomar uma decisão, uma vez que tem um produto que sabe que está gerando insights e que passou por uma fiscalização. Essa regulamentação da Anvisa entrou em vigor em março de 2023. Nós estávamos trabalhando há mais de um ano para fazer com que o produto estivesse pronto para entrar na data certa da regulamentação.
Como está hoje o crescimento do Tasy pensando no mercado de saúde brasileiro?
Patricia Frossard – Temos uma grande relevância no Brasil. Somos nós e mais um competidor. Temos bastante mercado para atuar. A nossa presença ainda está no mercado privado e há a ambição de buscar um mercado público. Um mercado que está amadurecendo para esse tipo de tecnologia. Ainda tem muita coisa em papel. Mas é algo que vai ter que acontecer se pensamos em melhorar o sistema de saúde como um todo. Porque se você não tem dados, não consegue fazer gestão e não consegue cortar desperdícios. Hoje temos mais de 1.500 clientes no Brasil e 1.800 na América Latina. E estamos expandindo a atuação deste produto para a América Latina.
Em relação a esse olhar para o mercado público. É mais fácil entrar dentro de um hospital privado do que em um hospital público? É por causa da maturidade digital?
Patricia Frossard – O investimento na saúde pública por muito tempo foi mais imediato. “Você precisa resolver esse problema da vacina agora. Então, vamos direcionar os investimentos para isso”. Após a pandemia, me parece que há uma maturidade maior no setor público para ver que é importante ter dados. Porque vimos que tínhamos poucos dados e informatização. Acho que o mercado está mais maduro para abraçar essas tecnologias. E o começo é o prontuário eletrônico. Porque a partir daí – e depois quando estiver em nuvem – você vai conseguir melhorar muito mais colocando diversos outros braços de sistemas. O Tasy pode se conectar. Ele é agnóstico. Até temos um programa de APIs, sendo empresas pequenas ou grandes que estão no mercado com uma solução que combina com o nosso produto e o que o cliente quer, pois se conecta com o produto da Philips. Não dá para ninguém ter essa ambição de estar sozinho no mercado.
“Se quisermos resolver o problema da saúde, precisamos conversar com todo mundo. Os nossos produtos precisam conversar e precisamos unir forças.”
Nesse cenário de ser agnóstico, vocês abriram isso para algumas empresas do mercado do ano passado. Chegamos a noticiar no Futuro que Mevo, Memed, CertiSign, Soluti e ForSign eram algumas delas. Isso já se ampliou depois desse anúncio? Tem novas empresas?
Patricia Frossard – Já temos novas empresas. Mas a ambição é ter muito mais. Para o mercado é bom, e eles nos buscam para isso. A questão agora é conseguir acelerar tecnicamente esse processo e estamos investindo para isso. Temos muita demanda. Porque você se conectar de uma forma automatizada ao nosso produto, significa ganhar um mercado de 1.500 clientes. Não ganha diretamente, porque você, obviamente, vai ter que ir lá e vender a sua solução. Nós não vamos vender a solução do terceiro, mas ele já tem uma facilitação para vender. Ele já vende facilitação. Porque com o Tasy, você pode se conectar ao meu produto e é muito mais fácil.
Já ouvi de alguns gestores de hospitais que têm essa dificuldade de conseguir essa integração…
Patricia Frossard – Nós fizemos essa conexão. E mais do que isso, com segurança. Porque hoje o gestor tem medo de colocar um produto conectado em sua base sem ter a garantia dessa segurança. Você, como gestor, pensa: “quem vai responder por isso”? E quando falamos que a Philips está por trás, dá uma segurança maior. Por isso que é uma grande chance de sucesso esse plano. A gente viraria um marketplace, se você for pensar. De APIs, de produtos no setor da saúde. É bastante inovador e queremos liderar no mercado do Brasil, no mercado nacional. Acredito que tem tudo para dar certo.
Nesse universo de 1.500 clientes no Brasil, é preciso ter um atendimento muito personalizado. Cada hospital tem a sua história, o seu sistema, as suas dores e dificuldades. Como padronizar isso?
Patricia Frossard – Não é fácil. Porque tem uma questão de cada um querer ter a sua identidade e com o seu paciente. Acredito que esse seja um dos desafios quando falamos de um sistema homogêneo, ao mesmo tempo em que os pacientes transitam de uma instituição a outra. O que temos tentado fazer – e aprendemos isso ao longo da jornada – é padronizar cada vez mais. Porque se você não padroniza, às vezes uma própria rede que tem 50 hospitais, e que esses hospitais foram adquiridos ao longo do tempo, dentro de uma mesma instituição, têm processos e formas diferentes. Às vezes, todos são Tasy e têm esses padrões diferentes. Mas estamos conversando com os clientes para entender que é importante a padronização, porque facilita na hora de uma atualização do sistema ou até fazer um cadastro. Porque se há um cadastro de um produto em um lugar diferente do outro, já não se consegue combinar e gerar relatório único.
“E para fazer gestão, é preciso que todos estejam conectados. Senão ele vai continuar fazendo Excel e combinar tudo. Não faz o menor sentido se você tem um produto que te entrega isso pronto. Logo, a padronização para esse tipo de sistema é o ideal. E estamos conseguindo mostrar isso ao longo dos anos.”
Você também trouxe esse crescimento no mercado fora do Brasil. O Tasy é um produto brasileiro que também está sendo exportado. É o único prontuário eletrônico da Philips no mundo. Qual é o mercado do Tasy fora daqui?
Patricia Frossard – Nós estamos na Colômbia, na Argentina e no México. Não é fácil entrar num mercado diferente, porque precisa adequar o produto às regulamentações daquele lugar, começando pelo idioma. É preciso nacionalizar o produto. Quando vamos para um mercado novo, sempre tem um cliente inicial que vai topar ir com você nessa jornada, e começa-se a crescer no país. Nós queremos crescer muito mais, mas de forma estruturada, consistente e cuidadosa. Não queremos deixar de atender os nossos clientes que já estão na nossa base.
Sobre o uso da inteligência artificial, o quanto isso já faz parte do dia a dia? Sei que a Philips tem uma parceria com a AWS para o comando de voz. É como se fosse uma Alexa no prontuário?
Patricia Frossard – É isso. Você fala: “Tasy, busque o exame do dia tal e do paciente tal”. Ele traz, mostra qual o índice glicêmico do paciente naquele dia. Mas tem uma outra coisa interessante. O Tasy grava e digita já no prontuário a conversa da consulta. O Tasy reconhece a voz do médico e do paciente. Ele digita tudo que foi conversado. Isso é muito bom por vários motivos. Primeiro, porque o médico não precisa ficar digitando e pode dar atenção ao paciente. Segundo, porque o médico fica mais protegido. Porque muitos médicos ficam com medo de esquecer de anotar algo no prontuário e depois serem processados. Tudo fica registrado. Tanto para o médico quanto para o paciente. É bom para os dois lados. Após ficar gravado no prontuário, o Tasy dá a opção para o médico olhar se está tudo bem. Além disso, ele também já extrai outras informações. E aí entra a inteligência artificial. Não é só mais um gravador. Ele extrai palavras-chave que foram faladas e sugere um diagnóstico e tratamento. Esses são insights para o médico que vai analisar se faz sentido ou não. Mas é um apoio facilitando o seu trabalho. Além disso, ainda pode se conectar, por exemplo, aos medicamentos que o Tasy indica da farmácia do hospital, se ele estiver em um hospital. Ou seja, o paciente já sai com a receita no celular. Toda essa conectividade envolve inteligência artificial. E aí busca-se em uma base de dados, que obviamente não é uma base pública, mas é uma base especializada médica, onde tem os estudos médicos somente, para que os insights sejam importantes e válidos para o médico. Logo, falamos de inteligência artificial para diagnóstico e tratamento. Porque tem bastante coisa acontecendo, porém, mais na gestão do hospital. No tratamento em si ainda tem pouca coisa de fato.
E já dá para compartilhar os próximos passos que a Philips está estudando?
Patricia Frossard – Temos o nosso sistema de imagens, que é o Pacs. Compramos da Carestream. É um sistema que armazena os exames de imagem que fazemos. E para o Pacs, nós já temos fora do Brasil e estamos trazendo para cá o marketplace de inteligência artificial. Como funciona isso? O hospital ou qualquer empresa desenvolveria uma inteligência artificial que faz combinação e análise das imagens que estão arquivadas e facilitam também. “Olha, essas daqui estão diferentes do padrão”. Como não temos essa ambição de desenvolver todas as potenciais inteligências artificiais, porque é uma para cada pedaço do corpo, temos um sistema que possibilita que isso aconteça. Porque o nosso papel dentro do mercado de saúde é dar as ferramentas para facilitar a vida dos usuários, dos médicos, dos pacientes, dos profissionais de saúde.
Em relação à interoperabilidade. Este é um tema recorrente e praticamente unânime de que os dados precisam circular. Mas, na prática, temos um sistema fragmentado. Como vencer esses gargalos? Como conseguir alcançar a interoperabilidade?
Patricia Frossard – Sistema nós temos. Mas a questão cultural de como até hoje o mercado funciona precisa ser ultrapassada. Alguém precisa dar o primeiro passo. Acho que a interoperabilidade, como temos grandes grupos, poderia começar por eles. Entre os seus próprios hospitais e centros de diagnóstico. Nós temos pilotos que foram feitos em outros países para demonstrar que dá para fazer e que tem sistema para isso. Mas a ambição é muito maior. A ambição é que todos os hospitais públicos e privados em algum momento se conectem. Isso vai gerar eficiência que precisamos para tirar o desperdício que existe hoje. Porque a pressão de todo mundo para custo está muito relacionada à falta da interoperabilidade, de o paciente ser de fato o dono e conseguir carregar. Porque hoje ele é o dono, mas ele não consegue carregar a informação dele. Ele fica muito preso àquela instituição.
“Não gosto de falar em regulamentação, em legislação para obrigar você a fazer alguma coisa, mas eu não vejo como isso não acontecer em algum momento. Todos sentem a pressão de custo em todos os lados. E vai começar por alguns setores e especialidades.”
No lado da esfera da saúde pública, temos um novo governo, uma nova Secretaria de Saúde Digital. A Philips, com a sua experiência, de alguma forma consegue colaborar com essa transformação? Já tem essa conversa com o governo?
Patricia Frossard – Nós já estamos conversando. Há dois anos fizemos a nossa grande primeira investida no sistema público. Foi com a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig). Nós conectamos todos os hospitais da rede. Foi um projeto gigante e está sendo concluída a implementação. Temos bastante experiência no setor público com os nossos equipamentos, não só com venda através de licitação, mas temos uma PPP na Bahia. Foi a primeira PPP de diagnóstico do Brasil. Conectamos 11 centros de diagnóstico a uma base central de laudos. Isso já é uma eficiência, porque você tem uma única central emitindo laudo para essas unidades onde se processam os exames. É um exemplo de quando conversamos com o governo e tem espaço para isso. E até está previsto em lei, seja com diálogo competitivo agora, com a nova lei de licitações. Às vezes, o governo não sabe que ele pode ter uma eficiência. Obviamente, depois que ele te escuta, ele vai abrir uma concorrência, vai chamar os outros para ver o que também têm a dizer. É assim que funciona. A nossa experiência contribui para isso. Nós estamos disponíveis para todas as conversas que já estão acontecendo com o governo, com o Complexo Econômico e Industrial da Saúde, através da Associação Brasileira da Indústria de Tecnologia para Saúde (ABIMED). A ABIMED tem uma cadeira nos grupos de trabalho para poder levar os pleitos. O que faz falta hoje para conseguir produzir mais no Brasil? Existe hoje uma demanda por produtos básicos mesmo. Para começarmos a pensar em produzir no Brasil, precisamos ter uma cadeia de suprimentos que funcione. Porque, se for para continuar trazendo coisas de fora e montar aqui, não necessariamente se resolve o problema. Todos esses diálogos têm acontecido e estamos disponíveis. Nós sentimos uma melhora muito grande desse espaço, desse apoio, e de escutar de verdade.
Queria falar sobre o Complexo. São muitas possibilidades dentro desse contexto, inclusive da definição do que é e não é prioritário. Gostaria de te ouvir, inclusive da sua posição como presidente da ABIMED. Como vocês estão articulando as possibilidades dentro dessa questão do complexo?
Patricia Frossard – Para as indústrias, o que é importante para que o complexo realmente funcione é que se tenha uma cadeia de suprimentos, de fornecimento local. E tem investimento que vai precisar ser feito nisso. Acho que o foco do governo, inicialmente, vai ser no que é mais imediato, no sentido do volume, vacinas, medicamentos. Quando olhamos para o plano todo, eles querem 70% de produtos nacionais. É uma ambição muito grande até 2030. Mas isso não faz com que não estejamos atentos. Temos que pensar que o Brasil está num momento bom para disputar um business case de produção. Porque antes tínhamos a China como grande polo, só que hoje essa discussão já mudou. Nenhuma multinacional quer ficar dependente de um único lugar. Isso nós aprendemos. Quando passamos por uma situação como foi a Covid, onde se teve algumas restrições, isso afeta porque precisamos pensar diferente. Hoje nós temos, inclusive, o planejamento de trazer mais produção para o Brasil, o que vai acabar combinando com o complexo. Não necessariamente será uma decisão por causa ao complexo, mas também por outras questões. O Brasil tem uma mão de obra preparada. Nós não somos caros. Por mais que tenhamos a complexidade tributária, temos uma estrutura de atendimento para esse sistema que funciona no Brasil. Estamos num momento bom de pensar em trazer produção para o país e combina com a questão do complexo de alguma forma.
E com a reforma tributária, você acredita que isso facilita ainda mais essas possibilidades aqui no Brasil?
Patricia Frossard – Estamos vendo a reforma tributária como algo positivo. Uma vez que você tira essa complexidade que existe hoje. Quando se tira a complexidade e, em algum momento, se há um aumento de alíquota, isso vai ser adequado dentro dessas produções e de preço. Nos próximos anos, vamos ter que trabalhar com os dois sistemas e a complexidade vai ser até maior. Mas estamos vendo que vai melhorar. Isso também ajuda o nosso business case hoje.
Vocês lançaram no ano passado, no Congresso da Sociedade Americana de Radiologia, RSNA, a primeira ressonância móvel do mundo. Como funciona e qual é o potencial disso?
Patricia Frossard – É justamente pensando em áreas remotas, em dar acesso. Porque ter uma ressonância magnética altamente tecnológica no centro de São Paulo é maravilhoso. Mas eu não dou acesso para todo mundo. Como ampliar? Como a inovação aumenta o acesso? Essa é uma das formas. E para ela ser móvel, ela não pode pesar tanto. Ela não tem hélio, que é outra tecnologia também exclusiva nossa. Porque o hélio pesa muito. É uma tonelada e meia de hélio que se coloca em uma máquina tradicional. Quando você tira isso e deixa móvel, você está realmente possibilitando o acesso. Nós também temos ultrassons portáteis. Temos um projeto hoje com a SAS. Ele é o braço de saúde do Rally dos Sertões. Em que vai uma equipe e eles utilizam ultrassom móvel. E aí, tendo uma necessidade, se faz uma consulta com o especialista por telemedicina. Porque, às vezes, uma pessoa que está em uma área remota tem o atendimento básico no posto de saúde, mas não tem o especializado. E para ter o atendimento especializado, o paciente entra em uma fila de dois anos. Logo, esse projeto é bacana porque conecta médicos voluntários que são brasileiros, mas, às vezes, nem estão no Brasil. Estes conseguem fazer um atendimento rapidamente pela telemedicina.
Qual é o teu principal olhar para 2024?
Patricia Frossard – Acho que 2024 é o ano em que precisamos nos consolidar no projeto de APIs. Queremos ser o protagonista da interoperabilidade no Brasil. Quanto mais conseguirmos fazer com que o nosso produto agnóstico se conecte aos demais, vamos mostrar que tem uma cadeia de tecnologia pronta para entrar no mercado. Esse é o nosso foco para 2024. Contribuir para fazer a saúde mudar de patamar em termos de qualidade. Nós já temos uma qualidade ótima. Mas, quando eu falo qualidade, estou falando de não estressar o médico, o profissional de saúde, ter uma ferramenta fácil para ele usar. O meu produto é medido por cliques. Queremos que o médico esteja mais tranquilo, satisfeito, que o profissional de saúde tenha uma ferramenta que o ajude de fato, que o paciente consiga ter a informação de verdade na sua mão. Tudo isso faz parte de uma jornada que temos muita vontade de ver acontecer no Brasil.
E quais são as pautas fundamentais para prestarmos atenção?
Patricia Frossard – A inteligência artificial é um assunto que está muito em voga. Precisamos ter um olhar para a questão ética do uso da inteligência artificial. E a regulamentação vem para adequar. Esse é um tema importante. A questão do complexo industrial da saúde, precisamos ficar de olho. E a reforma tributária, ela passou. Mas agora temos leis complementares, que precisam ser aprovadas em 180 dias. Existe uma corrida de todo mundo para confirmar aquilo que já ficou como um diferencial para o setor de saúde, uma diferença de alíquota na reforma tributária. Esses são os grandes blocos. E pensar como a tecnologia continuará ajudando o mercado a ser cada vez melhor para o paciente.
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NATALIA CUMINALE
Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.