Painel direcionado a gestores traz indicadores locais de saúde mental do público infantojuvenil
Painel direcionado a gestores traz indicadores locais de saúde mental do público infantojuvenil
São 29 indicadores que avaliam os fatores de risco e proteção à saúde mental de crianças e adolescentes, de acordo com elementos que vão desde a educação até infraestrutura urbana do local
O Painel de Promoção da Saúde Mental Infantojuvenil foi lançado na última quarta-feira, 4, pela Vital Strategies, em parceria com o Instituto Cactus e a RD Saúde. Direcionado a gestores públicos de todo país, a ferramenta conta com uma síntese de 29 indicadores que avaliam os fatores de risco e proteção à saúde mental de crianças e adolescentes, em diferentes locais, considerando elementos como educação, infraestrutura urbana, cobertura vacinal, prosperidade social, entre outros.
A ferramenta foi construída para uso exclusivo de tomadores de decisão da esfera pública e traz dados do índice de promoção da saúde mental infantojuvenil referentes a todos os níveis níveis de localidade — nacional, estadual e municipal. Ela contempla os 5.570 municípios brasileiros e pode, por exemplo, fornecer informações para o gestor público local sobre ambientes que precisam de medidas urgentes para favorecer a boa saúde mental de jovens.
O painel abarca tanto indicadores concretos relacionados à saúde mental, como dados de assistência social, segurança pública, educação, fatores sociodemográficos. Esse leque de dados o diferencia de outras ferramentas de monitoramento da saúde mental da população, de organizações como a Unicef e o próprio Ministério da Saúde, que utilizam métricas como taxas de gravidez na adolescência ou de suicídio.
A configuração permite ter um amplo panorama para orientar a prevenção de doenças mentais. Luciana Sardinha, Diretora de Doenças Crônicas Não Transmissíveis da Vital Strategies, destaca: “A saúde só dá conta de resolver esse problema quando acontece o adoecimento, enquanto a prevenção e a promoção da saúde são intersetoriais. Se eu tenho um lugar que a segurança não é boa ou a educação não é boa, tudo isso interfere naquele território onde aquela criança, aquele adolescente está vivendo”.
Para Bruno Ziller, coordenador de projetos do Instituto Cactus, trata-se de “inverter a lógica, de olhar para a saúde mental e quais outros elementos, como educação, meio ambiente, lazer, esporte, você consegue prover no território para evitar a sobrecarga da rede de assistência no futuro”. Ao todo, são cinco domínios, com uma série de dados: fatores sociodemográficos, relações sociais positivas, eventos estressantes, acesso, uso e demandas de serviços de saúde e morbidade em saúde.
A ideia do painel é, justamente, chamar a atenção do gestor para que ele possa implementar ações de prevenção para doenças mentais em jovens a partir dos dados. “Mesmo que o gestor público tenha escassez de recursos econômicos ou humanos, o painel pode ajudá-lo a direcionar suas ações para a prevenção”, destaca Sardinha, da Vital Strategies. “É uma mudança de paradigma, é mais barato prevenir do que custear o tratamento”.
Ziller ressalta que a adolescência é um período importante para a prevenção de doenças mentais. “Evidências mostram que é nessa fase da vida que as condições de saúde mental se materializam. Se conseguirmos atuar nesse momento, prevenindo adoecimentos, teremos uma geração de futuros adultos mais saudáveis, o que traz benefícios para a sociedade como um todo”, comenta.
O painel chega às mãos dos gestores públicos com o apoio do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde), com um primeiro diálogo já consolidado. Os representantes de cada local podem customizar a ferramenta para utilizá-la da forma desejada. Eles podem, por exemplo, incluir novos dados a partir de especificidades de seu ambiente. “É um índice muito customizável. Se o município monitorou algum indicador que não tenha sido previsto na ferramenta, a nível nacional, ele pode inseri-lo no painel”, comenta Sardinha.
Saúde mental infanto-juvenil
A preocupação com a saúde mental de adolescentes e crianças tem crescido nos últimos anos, principalmente após o confinamento social da pandemia. Mas dados oficiais mostram que ela tem se deteriorado mesmo antes desse período. Segundo Boletim Fatos e Números, divulgado em 2022 pelo governo federal, em nove anos (2011-2019), a taxa de mortalidade por suicídio de adolescentes de 15 a 19 anos passou de 3,64 por 100 mil habitantes, em 2011, para 6,36, em 2018. Já as ocorrências de automutilação entre jovens de 10 a 19 anos cresceu de 23,2%, em 2011, para 29,8%, em 2018.
Quando o assunto é saúde mental, crianças e adolescentes foram, historicamente, negligenciados pelas políticas públicas, segundo Ziller. “Foi tardio o seu reconhecimento como sujeitos psíquicos e de direitos e, na prática, observamos o esvaziamento de políticas direcionadas a eles”, diz o coordenador. E, muitas vezes, a materialização de políticas públicas leva tempo até chegar aos jovens.
Por isso, algumas iniciativas chegam mais rápido ao público infantojuvenil que outras. Para Sardinha, a socialização é uma das ações mais viáveis e menos custosas a serem incrementadas entre crianças e adolescentes — com resultados positivos comprovados por indicadores. “Fortaleza tem um indicador específico que monitora, via satélite, área verde. Essas áreas, que podem ter socialização, e tiveram uma relação direta com a melhora ou piora do território para a saúde mental” comenta a diretora, que vê essa opção como uma possibilidade de ação mais rápida do que a construção de CAPs.
A promoção da saúde mental e a educação que promova escolhas mais conscientes são outras ações que podem gerar bons resultados com baixo investimento. Dentro das escolas, outra medida em prol da saúde mental é a Lei nº 14.819, de 16 de janeiro de 2024, que institui a Política Nacional de Atenção Psicossocial nas Comunidades Escolares. “É preciso começar a promover saúde mental dentro das escolas, articulando esses equipamentos de saúde, de assistência social, da educação para pais, alunos, familiares e assim por diante, com um direcionamento específico”, finaliza Ziller.
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NATALIA CUMINALE
Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.