Oncoguia e sociedades médicas firmam compromisso para fomentar diagnóstico precoce do câncer

Oncoguia e sociedades médicas firmam compromisso para fomentar diagnóstico precoce do câncer

Se nos primeiros dois dias do 13º Fórum Nacional Oncoguia […]

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By Published On: 12/05/2023
Painel de apresentação do compromisso entre Oncoguia e sociedades médicas

Se nos primeiros dois dias do 13º Fórum Nacional Oncoguia as principais discussões giraram em torno das desigualdades sociais e dificuldade de acesso ao tratamento, o terceiro e último dia do evento se debruçou em mais detalhes da jornada do paciente com câncer. E, para endereçar todas as questões, Oncoguia e sociedades médicas firmaram compromisso para avançar na prática e buscar melhoria da trajetória de quem tem a doença.

Para demonstrar um pouco dessa jornada, o fórum abriu espaço para que pacientes com câncer falassem sobre as suas trajetórias desde o diagnóstico ao tratamento. Para Silvia Ferrite, paciente de câncer de mama metastático e voluntária do Oncoguia, “o oncologista não sabe tudo. Quem vive é o paciente. Por isso, as trocas são extremamente valiosas”.

Mas afinal, como garantir o que importa? Marisa Santos, médica infectologista, doutora em epidemiologia, coordenadora do núcleo de avaliação de tecnologias, pesquisadora ad hoc da Rede Brasileira de ATS e do grupo EuroQol e membro da RedETSA, reforçou a importância da criação de dados e de entender a trajetória das doenças: “Tem dados no Brasil, mas com dificuldade de conectar as bases”. Segundo ela, é importante a qualidade de vida e o bem-estar, mas para incluir tudo isso na tomada de decisão, o paciente precisa participar e de forma qualificada.

Essa falta de participação e confiança dos pacientes também foi apontada por Andre Sasse, oncologista, fundador e CEO do Grupo SonHe: “Vivemos uma crise de confiança um no outro. A crise de confiança é institucional”.

Biópsias: o primeiro passo para o diagnóstico 

Na jornada dos pacientes com câncer, um dos gargalos no diagnóstico é a biópsia, fundamental para que, a partir de então, seja possível seguir um tratamento. No fórum, uma mesa foi dedicada para discutir as dificuldades para fazer e encaminhar uma biópsia no SUS. Lembrando que o número desse tipo de procedimento caiu 45,72% na pandemia, o que adia tratamentos.

E, além disso, ainda existe diferença em fazer uma biópsia na rede privada ou no SUS. Por exemplo, pessoas que encaminham a biópsia pela Rede D’Or São Luiz, em quatro dias podem ter em mãos o resultado, como foi compartilhado por Isabela Werneck, patologista da Rede D’Or no SUS. Já a média no sistema público é de 40 dias. Porém, na prática, há quem espera mais de dois meses para saber o resultado.

Rodrigo Nascimento Pinheiro, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO), ressaltou que “não existe câncer sem biópsia. A biópsia é o meio de diagnóstico”. Ele lembrou que 62% dos médicos estão concentrados em cidades com mais de 500 mil habitantes e essa distribuição também se reflete na dificuldade de contratar patologistas.

Na mesa, os participantes discutiram os custos dos laboratórios, a questão da logística e a necessidade de otimização. Clóvis Klock, presidente da Sociedade Brasileira de Patologia, sugeriu a “criação de centros regionais para um direcionamento com melhores desfechos”, já que, segundo ele, um bom diagnóstico depende da qualidade de uma biópsia.

Ensino em oncologia, formação continuada, pesquisas e linhas de cuidado – da prevenção aos cuidados paliativos – também foram apontados como caminhos. Para Pinheiro, da SBCO, o Ministério da Educação deveria participar da discussão considerando a prevenção nas escolas. “A gente pode evitar o câncer ensinando para as nossas crianças”, se referindo à obesidade, ao tabagismo e à vacinação.

Compromisso para avançar no diagnóstico precoce

Para endereçar todas as questões apresentadas no 13º Fórum Nacional Oncoguia, a parte final do evento foi, na verdade, a celebração do “Compromisso pelo Diagnóstico Precoce do Câncer: Oncoguia e Sociedades Médicas de Especialidades”. Nela, participaram oito sociedades brasileiras médicas que expuseram as dificuldades de cada área e o que estão fazendo como sociedades em termos de ações e prevenções.

Sociedade Brasileira de Mastologia

Nessa perspectiva, a Sociedade Brasileira de Mastologia foi representada por Rodrigo Pepe Costa, vice-presidente da Região Centro-Oeste, que reforçou a importância do diagnóstico precoce de câncer de mama. Para 2023, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), estão previstos 73.610 novos casos. Também falou sobre a queda da cobertura da mamografia. De 2019 para 2020, houve uma redução de 40%

Outro ponto analisado foi a divergência para a realização da mamografia. O INCA recomenda o início aos 50 anos, enquanto a Sociedade Brasileira de Mastologia indica o rastreio aos 40 anos. O mesmo vale para o término, que para o INCA é aos 69 anos e para a sociedade aos 74 anos. “É muito mais barato você tratar uma paciente com estágio inicial do que tratar uma paciente em estado clínico avançado se ela estiver na menopausa”, analisa. Essa divergência, quando somada, representa quase 50% das mulheres que são diagnosticadas com câncer de mama e não estão na recomendação do governo para fazer a mamografia, afirma.

Sociedade Brasileira de Dermatologia

Mas outros tipos de câncer também merecem atenção. O tumor maligno mais incidente no Brasil, por exemplo, é o de pele não melanoma (31,3% do total de casos – com 175 mil novos registros por ano), segundo a Estimativa 2023 – Incidência de Câncer no Brasil. Francisca Regina, secretária geral da Sociedade Brasileira de Dermatologia falou sobre a importância do uso do protetor solar e alertou sobre o culto ao bronzeamento. “Mas esse culto de que pele sadia é pele bronzeada é uma dificuldade e que atrapalha”, destaca. Por isso, em sua opinião, a relevância da campanha Dezembro Laranja, que a entidade abraça para ajudar na prevenção. 

Sociedade Brasileira de Urologia

O coordenador Ubirajara Ferreira, representante da Sociedade Brasileira de Urologia, abordou os cânceres urológicos e ainda poucos difundidos no Brasil, apesar do câncer de próstata ser o mais predominante em todas as regiões: são previstos 72 mil novos casos a cada ano do próximo triênio, atrás apenas do câncer de pele não melanoma. “Precisamos reiterar que não é possível prevenir o câncer de próstata. O que fazemos é uma detecção precoce”, ensina. Ele ainda reiterou a importância de exames de toque e do PSA, além de incentivar os homens a cuidarem da saúde, já que 50% deles nunca foram ao urologista e um a cada seis será diagnosticado com a doença. 

Sociedade Brasileira de Coloproctologia

Com 44 mil novos casos de câncer colorretal no Brasil por ano, a Sociedade Brasileira de Coloproctologia, representada pelo presidente Antonio Lacerda Filho, trouxe dados alarmantes sobre a neoplasia. No mundo, o câncer colorretal representa 10% de todos os tipos de câncer, com 1,9 milhão de novos casos anuais. No Brasil, em 2022, foram 97,2 mil internações. “Temos que rastrear a doença e existem basicamente duas formas de fazer isso: sangue oculto nas fezes e a colonoscopia”, diz. Ele também reafirmou a necessidade de políticas públicas para conscientização e diagnóstico precoce. 

Sociedade Brasileira de Pneumologia

A Sociedade Brasileira de Pneumologia também esteve presente no debate. O câncer de pulmão, segundo as estimativas de 2020, é o terceiro mais comum em homens (17.760 casos novos) e o quarto em mulheres no Brasil (12.440 casos novos). Gustavo Prado, coordenador da Comissão de Câncer de Pulmão, reforçou a importância de encontros como esses: “Precisamos entender como podemos contribuir nessa construção coletiva para instrumentalizar as mudanças de fase de enfrentamento, facilitar o diagnóstico, democratizar e possibilitar que regiões remotas também sejam assistidas e que populações vulneráveis tenham visibilidade na saúde”, sugere. 

Por isso, elencou o rastreamento de câncer de pulmão no Brasil. Há evidências em favor da estratégia, mas há formas de torná-la menos dispendiosa e mais impactante. Entre as demandas, estão o estudo local de custo-efetividade; estrutura, recursos humanos e processos; enfrentamento de barreiras culturais e de acesso; e delineamento de estratégias dirigidas à população.

Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia

Quem também marcou presença foi a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). Agnaldo Lopes, presidente da federação, deu ênfase ao câncer de colo uterino.  Segundo o INCA, 17 mil mulheres devem ser diagnosticadas com câncer de colo de útero em todo país em 2023. “Hoje é um dos tumores preveníveis e mais tratáveis do mundo. Sabemos o que precisamos fazer e temos medidas muito eficazes, tanto na atenção primária quanto na secundária. No Brasil, não vamos ter a mesma solução para diferentes problemas. Precisamos pensar no Brasil de uma forma bem mais ampla. Precisamos vacinar”, aconselha. A estratégia global para eliminar o câncer de colo de útero é a vacinação contra o HPV, rastreamento do câncer de colo uterino e tratamento da doença detectada.

Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica

E para fechar a mesa, a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica foirepresentada por Marisa Madi, diretora executiva. Em sua fala, disse que tem visto uma possibilidade de trabalhar essa articulação, de trazer um pouco mais esse conhecimento de gestão, tanto para o gestor quanto para os médicos e pacientes. “A oncologia clínica fica muito voltada à terapia sistêmica, à incorporação”, diz. Para Marisa, é uma discussão difícil, pois ao invés de só falar de terapia, é importante discutir o diagnóstico. E ponderou a importância da gestão na formação dos médicos: “O médico se institucionalizou, dentro de um sistema. Ele está tendo que buscar essa competência para poder lutar no que é importante ao paciente”, assegura.

Ministério da Saúde

Quem ouviu todas as sociedades presentes e também respondeu algumas dúvidas de como essas ações e propostas podem estar alinhadas com o governo foi Gilmara Lúcia dos Santos, coordenadora-geral de Prevenção às Condições Crônicas do Departamento de Prevenção e Promoção da Saúde do Ministério da Saúde.  

Gilmara destacou que a pasta vem buscando uma equidade nas decisões, considerando os determinantes sociais. Em primeira mão, compartilhou algumas ações a serem tomadas pelo governo nos próximos meses e convidou as sociedades brasileiras a participar: “Entendemos que alguns desses cânceres são rastreados na atenção primária. Então precisamos investir na gestão desses municípios, dessas equipes e das unidades básicas. Investir na formação desses trabalhadores.”

Sobre a saúde do homem, Gilmara disse que estão discutindo o SUS no ambiente de trabalho: “Muitos homens não fazem uma possível prevenção porque ele está no trabalho”, reflete. Em relação ao câncer de colo de útero, a coordenadora-geral afirmou que haverá fortes campanhas já nos próximos meses. Ela também mencionou projetos de adesão ao controle do tabagismo e convidou a sociedade civil e o terceiro setor a participar das discussões. 

O Compromisso entre Oncoguia e sociedades médicas

Luciana Holtz, fundadora e presidente do Oncoguia, fechou o fórum apresentando o compromisso firmado entre Oncoguia e sociedades médicas. Ela refletiu novamente sobre o acesso e as desigualdades que acompanham os pacientes diagnosticados:

“Quando falamos em acesso à saúde, como incentivar o exercício físico e uma alimentação adequada? O que podemos criar de oportunidades para que essas pessoas consigam fazer a manutenção da saúde? Não precisamos correr atrás apenas quando o câncer surge.” Por isso, reiterou a importância de se pensar nas estratégias e incentivos para apoiar o cidadão. “O que a gente vê é um paciente totalmente perdido na regulamentação. Ele não sabe o próximo passo e quanto tempo ele ficará esperando”, lamenta.

O 13º Fórum Nacional Oncoguia foi finalizado com um legado importante: de que unindo pesquisa, políticas públicas e apoio oncológico, o universo dos pacientes com câncer pode sim se tornar mais digno. Dentre os compromissos firmados estão:

  • Toda a população precisa ser informada sobre a importância do combate ao tabagismo, sedentarismo e obesidade;
  • Incentivar e apoiar o cidadão para o autocuidado em saúde;
  • Ter médicos e profissionais de saúde à disposição da população com foco na manutenção da saúde e vida com qualidade;
  • Desenvolver estratégias que ajudem a identificar pessoas com histórico familiar de câncer, em especial câncer de mama, ovário, cólon e próstata, para que estas pessoas sejam parte de programa de rastreamento individualizado;
  • Ter atenção primária atenta aos sinais e sintomas do câncer e de uma regulamentação transparente que priorize e agilize o acesso de pacientes com suspeita de câncer a investigação, o diagnóstico e subsequente tratamento;
  • Disponibilizar a detecção precoce do câncer colorretal, segundo câncer mais incidente em nosso país;
  • Todas as mulheres devem ser orientadas a conhecer suas mamas para identificar eventuais alterações que poderiam representar um câncer. As mulheres devem conhecer o seu histórico familiar para alertar o ginecologista quanto a um possível risco aumentado para câncer. E devem ser incentivadas a aderir à realização de exame clínico, e da mamografia depois dos 40 anos de idade;
  • Pessoas fumantes e, consequentemente, com alto risco para o câncer de pulmão, devem ser informadas sobre o risco do tabagismo e sobre a possibilidade de fazerem tomografia de baixa dosagem como meio para detecção precoce. Toda a população precisa estar informada sobre malefícios do tabagismo e ter acesso a programas de apoio para o tabagismo; 
  • Todos os homens devem ser informados sobre a importância da ida ao urologista a partir dos 45 anos de idade para discutir a indicação da realização de exames para detecção do câncer de próstata;
  • Ampliar as estratégias para prevenção do câncer de pele, o mais incidente em nosso país, dando especial destaque para o melanoma, o mais grave e letal dos cânceres de pele;
  • Melhorar as linhas de cuidado garantindo que, diante de suspeitas e ou exames alterados, o paciente seja priorizado e atendido com foco na continuidade da investigação e realização de biópsias e início de tratamentos dentro dos prazos estipulados;
Angélica Weise

Jornalista formada pela UNISC e com Mestrado em Tecnologias Educacionais em Rede pela UFSM. Antes do Futuro da Saúde, trabalhou nos portais Lunetas, Drauzio Varella e Aupa.

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Jornalista formada pela UNISC e com Mestrado em Tecnologias Educacionais em Rede pela UFSM. Antes do Futuro da Saúde, trabalhou nos portais Lunetas, Drauzio Varella e Aupa.

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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