Olavo Corrêa, diretor-geral da AstraZeneca: “Impactos no meio ambiente estão diretamente ligados à saúde”

Olavo Corrêa, diretor-geral da AstraZeneca: “Impactos no meio ambiente estão diretamente ligados à saúde”

No mais recente episódio de Futuro Talks, Olavo Corrêa falou do atual momento da indústria farmacêutica e de seu papel para um futuro sustentável

By Published On: 17/01/2024
Olavo Corrêa, diretor geral da AstraZeneca, em entrevista ao Futuro Talks

A agenda ESG, sigla em inglês para meio ambiente, social e governança, tem permeado cada vez mais as discussões na saúde. Se antes era o pilar social que mais atraía iniciativas – até pela atividade-fim ter o foco no cuidado com as pessoas –, agora o lado ambiental começa a se intensificar. Até porque as mudanças climáticas não trazem reflexos apenas em eventos da natureza, mas aumentam também a sobrecarga nos sistemas ao trazer mais riscos de doenças crônicas – como as respiratórias – e até mesmo câncer. Esse foi um dos temas do mais recente episódio de Futuro Talks, que recebeu Olavo Corrêa, diretor geral da AstraZeneca no Brasil.

Formado em Ciência da Computação e com MBA executivo pela FGV Business School, em São Paulo, nos últimos 15 anos ele liderou várias áreas dentro da companhia até assumir, em março de 2023, a atual posição. Durante a entrevista, Corrêa destacou que uma das missões da AstraZeneca é ser carbono zero até 2030. Para isso, a companhia tem três pilares com ações concretas: acesso à saúde, proteção do ecossistema e ética e transparência.

Ao longo da conversa, ele comentou ainda sobre a iniciativa resultante da parceria com o Fórum Econômico Mundial, que trouxe mais de 40 recomendações destinadas a fortalecer a saúde pública do sistema brasileiro. Uma delas envolve a digitalização e a integração de dados, que têm o potencial de diminuir o desperdício no mercado de saúde, principalmente no setor público.

Corrêa também destacou a importância da parceria público-privada e falou sobre os aprendizados da pandemia, como desenvolver critérios claros nas parcerias e a importância de manter o senso de urgência na busca por soluções inovadoras.

Confira a entrevista a seguir:

Você assumiu a AstraZeneca em março de 2023. Quais são os principais desafios à frente da companhia, pensando nas perspectivas de 2024?

Olavo Corrêa – O fato de ter uma longa história na AstraZeneca, passando por várias áreas e chegando ao cargo de diretor-geral, é um privilégio, principalmente considerando o futuro que temos com a empresa. Estamos vivenciando um momento incrível na AstraZeneca. Ao longo dos últimos anos, temos visto crescimentos notáveis no mercado, ampliando cada vez mais o acesso e introduzindo medicamentos inovadores. Do ponto de vista da AstraZeneca, enfrentamos alguns desafios consideráveis a curto, médio e longo prazo. Atualmente, nossa ambição na empresa é lançar pelo menos 20 novos medicamentos até 2030. E não é apenas o lançamento de novos medicamentos, mas também a expansão contínua das iniciativas relacionadas ao ESG. Temos a ambição de atingir emissões zero até 2030, o que implica em uma jornada longa e muitas ações concretas para que isso aconteça, ampliando ainda mais o acesso à saúde. Esses são os principais desafios que enfrentamos. Especialmente em 2023, conseguimos progredir bem em relação a essas ambições. Lançamos produtos em praticamente todas as áreas terapêuticas que estamos explorando, oferecendo medicamentos que fazem a diferença aos pacientes. Trabalhamos com foco em inovação e ações concretas relacionadas ao ESG, contribuindo para o desenvolvimento do país, pois sabemos que esses aspectos estão diretamente interligados. O ecossistema e a saúde da população estão intrinsecamente ligados.

Em 2023, a AstraZeneca em uma iniciativa resultante da parceria com o Fórum Econômico Mundial, trouxe mais de 40 recomendações destinadas a fortalecer a saúde pública do sistema brasileiro. Como foi o desenvolvimento desse projeto?

Olavo Corrêa – Para proporcionar um pouco mais de contexto sobre isso, denominamos PHSSR, que é, na verdade, uma parceria para a sustentabilidade e resiliência do sistema de saúde. Trata-se de um projeto realizado pela AstraZeneca em colaboração com o Fórum Econômico Mundial destinado a analisar profundamente os pontos positivos e as oportunidades em relação aos sistemas de saúde de diversos países. O Brasil foi o pioneiro na América Latina a participar. Essa iniciativa é uma colaboração entre a AstraZeneca, Philips e KPMG, sendo liderada pela FGV aqui no Brasil. Publicamos esse relatório em 2023 e apresentamos mais de 40 recomendações que podem ser implementadas para aprimorar a sustentabilidade e a resiliência do cenário de saúde no Brasil. Foi instigante vivenciar a apresentação desse relatório, especialmente agora com as recomendações, pois abordamos especificamente o período pós-pandemia. Analisar essa fase é interessante e trouxe à tona a visibilidade da vulnerabilidade do sistema de saúde, destacando também os pontos fortes que tivemos durante a pandemia.

Quais foram essas recomendações?

Olavo Corrêa – Se enfatizou de maneira crucial a necessidade da parceria entre setores público e privado em momentos de crise, fundamental para garantir uma sustentabilidade e resiliência mais robustas do sistema de saúde. O relatório apontou claramente esse aspecto e apresentou recomendações efetivas, incluindo a discussão sobre a ampliação do financiamento do sistema de saúde. Ao falarmos do sistema de saúde no Brasil, aproximadamente 4% do PIB é investido atualmente. O relatório sugere, por exemplo, um aumento gradual de 4% para 6% ao longo de 10 anos e explora estratégias para obter financiamento adicional. Uma dessas estratégias é a aplicação de taxações diferenciadas para produtos que impactam negativamente na saúde da população, como tabaco, álcool, açúcar e alimentos altamente processados, cujo consumo tem aumentado. Uma maior taxação, aliada a um investimento mais eficaz no sistema de saúde, pode resultar em um sistema mais resiliente. O tema da parceria foi amplamente discutido e a publicação recente do relatório foi significativa. Contudo, ainda mais fascinante é observar como essas informações, discussões e diálogos têm se intensificado ultimamente, indicando um crescente interesse na busca por parcerias. Considero que, de fato, essa é a trajetória quando tratamos da sustentabilidade do sistema de saúde.

O que estamos mais próximos de conseguir fazer?

Olavo Corrêa – O que está mais próximo e abordarmos cada vez mais é o Complexo Econômico-Industrial da Saúde. Essa discussão sobre regulamentação e previsibilidade para viabilizar parcerias entre os sistemas público e privado está se tornando cada vez mais clara. Um exemplo bem-sucedido dessa colaboração foi a transferência de tecnologia da vacina contra a Covid-19, realizada pela AstraZeneca durante a pandemia. Essa parceria público-privada não apenas exemplifica como ela pode ser efetuada, mas também destaca a agilidade com que foi implementada. Esse êxito demonstra a competência do mercado de saúde no Brasil, mostrando sua capacidade real de alcançar ambições quando se propõe a isso. Este é um ponto relevante. Outro aspecto que visualizo próximo de ocorrer é a digitalização e integração de dados. No contexto da inovação, quando discutimos o que verdadeiramente significa inovar, há diversas perspectivas. Contudo, ao considerarmos a integração de dados, podemos eliminar um desperdício considerável no mercado de saúde, especialmente no âmbito público. Imagine a possibilidade de integrar todos os dados do paciente em um único local, permitindo a interação dessas informações independentemente de onde o paciente esteja? Embora isso pareça ser um futuro distante, acreditamos que se torna cada vez mais iminente devido à real necessidade dessa implementação. Essa parceria, mencionada como uma das recomendações, que envolve a interação de dados, precisa ser realizada tanto no mercado público quanto no privado, envolvendo stakeholders importantes não apenas do setor de saúde, mas também do setor de dados, informações e operacionalidade. Considero que isso se torna cada vez mais fundamental para o progresso. Esses são os dois aspectos extremamente relevantes e estão mais próximos de se concretizarem.

O que a transferência de tecnologia da vacina trouxe de aprendizado?

Olavo Corrêa – O período da pandemia, por si só, trouxe uma urgência para toda essa discussão. Necessitávamos realmente de uma solução e naquele momento, era a vacina. Contudo, o grande aprendizado desse período relacionou-se à necessidade de critérios bem definidos para a transferência de tecnologia e uma previsibilidade quanto ao que realmente pode ser alcançado no futuro. Com processos transparentes e papéis e responsabilidades claramente delineados entre o governo e o setor privado, esse foi um momento de extrema importância para a AstraZeneca. Embora a vacina não seja o nosso foco principal de negócios, a empresa dedicou todos os esforços para desenvolver uma vacina e auxiliar a população, dada a carga global que a pandemia representou, refletindo-se não apenas no Brasil, mas em parcerias estabelecidas em outros locais. Aprendemos consideravelmente com essa experiência, compreendendo como melhor atuar no setor de imunologia e fazendo descobertas valiosas que poderão ser aplicadas em outras áreas.

“Portanto, comprovou-se que é viável e existem caminhos a serem seguidos. Acredito que não podemos negligenciar esse legado, voltando aos antigos métodos de trabalho.”

Esse relatório foi apresentado para membros do governo, membros dos conselhos, o CONASS, o CONASEMS, envolveu a universidade e vários stakeholders. Como você acha que o setor está olhando para isso?

Olavo Corrêa – Minha convicção se baseia na observação da quantidade crescente de discussões e diálogos sobre o tema nos últimos tempos. Notamos um aumento constante nas conversas governamentais em torno do desenvolvimento do complexo industrial, com a ambição de trazer mais produções para o Brasil e tornar o país cada vez mais autossustentável. Essas discussões seguem nessa direção. Quero dar outro exemplo, que, embora não esteja diretamente relacionado, é um Projeto de Lei que está sendo amplamente debatido atualmente, envolvendo estudos clínicos. Sua discussão destaca a importância de proporcionar maior flexibilidade, reduzir burocracias e estabelecer critérios claros para a realização de estudos clínicos no Brasil. Essa abordagem é crucial e benéfica para todos: para o governo, significa mais ciência e inovação, elementos que impulsionam a economia do país. Para as indústrias farmacêuticas, representa uma maior oportunidade de conduzir estudos clínicos. E para a população, significa um acesso crescente a drogas inovadoras por meio desses estudos clínicos. Apesar de o Brasil ser reconhecido como um mercado de saúde incrível, lamentavelmente não somos os mais ágeis no início de estudos clínicos. Entretanto, devido à competência do país, uma vez iniciados, somos um dos mais eficientes em recrutar pacientes, evidenciando nossa capacidade de execução. A discussão atual, especialmente relacionada a esse PL, é mais um exemplo que indica a disposição do governo para debater e aprimorar continuamente o mercado de saúde.

Se o PL for aprovado e começar a valer em 2024, o paciente já pode notar essas mudanças ou demora um pouquinho?

Olavo Corrêa – Acredito que sim. Quando olhamos a perspectiva global, o Brasil é um mercado extremamente importante e competente para fazer estudo clínico. Globalmente, todo mundo tem essa visibilidade. Temos uma diversidade de população incrível no Brasil, seja geográfico, de etnia, enfim, de acesso à saúde também. Um cenário muito diferente de contexto de outros lugares. Mas quando falamos da perspectiva de realização de estudos clínicos, o Brasil representa em torno de 2% de todos os estudos clínicos, globalmente. É um número muito pequeno. E, cada vez mais, pela quantidade de estudos clínicos que tem, eu acredito que o Brasil tende a ter cada vez mais foco. Na minha perspectiva, acredito que, a curto prazo, haja um impacto dessa mudança com o PL. Temos conversado também da perspectiva da AstraZeneca. Como podemos trazer esses estudos para cá? Você tem a perspectiva do paciente, que é muito boa. Você tem a perspectiva de ter mais pacientes brasileiros nesses estudos, o que é ótimo para avaliação. E você também tem uma perspectiva da área médica, que pode, através desses estudos, ter acesso a drogas inovadoras e discutir a ciência.

Dentro do contexto privado, a AstraZeneca também olha para essa relação com os gestores privados, pensando na saúde suplementar?

Olavo Corrêa – Sim, sem dúvida. Nós temos discutido com o mercado privado de saúde não só do âmbito de tratamento, mas também relacionado a prevenção, informação, diagnóstico precoce das doenças e terapia-alvo. Estamos cada vez mais próximos às operadoras de saúde para discutir soluções que vão além do tratamento. Mas como podemos trabalhar em conjunto para isso? O sistema suplementar de saúde cobre 25% da população e é extremamente importante para nós. Sabemos do nosso potencial de trabalhar juntos para isso, mais próximos e em parcerias. E parcerias que, muitas vezes, podem ser escaladas também para o mercado público. Sabemos que o âmbito é diferente, o financiamento é diferente, mas por que não ter algumas iniciativas no mercado privado que se possa levar isso para o mercado público?

Há mais abertura para o mercado público? Antes não tinha muito diálogo?

Olavo Corrêa – Eu não posso dizer se antes não tinha muito diálogo. O que eu vejo, numa perspectiva desse diálogo, é que precisamos andar de mãos dadas. As operadoras de saúde e as indústrias farmacêuticas precisam sentar e discutir soluções para apoiar o sistema de saúde. A gente sabe quanto o sistema privado está sobrecarregado. Diante disso, só tem uma forma de resolver: todo mundo sentar-se na mesa, todos os stakeholders e achar soluções realmente que funcionem para todo mundo e que possamos colaborar com o paciente que está na ponta.

Qual é o papel da indústria em fomentar esse ecossistema de saúde? E como que a indústria pode ser mais do que só um produtor de medicamento?

Olavo Corrêa – Eu considero que essa é a frase principal: não apenas ser um provedor ou desenvolvedor de medicamentos. Claro, a pesquisa e o desenvolvimento são o cerne quando se trata da indústria farmacêutica. Portanto, o que impulsiona a AstraZeneca é a ciência e o desenvolvimento de novas tecnologias que façam a diferença na vida do paciente. Entretanto, para nós, precisamos trabalhar em uma ampliação disso. Desde a prevenção, onde, nesse contexto, podemos até abordar temas relacionados a ESG ligados à prevenção, como a disseminação de informações. Assim, não é apenas responsabilidade do governo ou das operadoras de saúde fornecer informações sobre diagnóstico, tratamento e doenças em si. É crucial intensificar os esforços no diagnóstico, explorando como a indústria farmacêutica pode também apoiar em estágios iniciais da doença, independentemente da natureza dela. Porque sabemos que quanto antes uma doença é diagnosticada, não só o paciente tem uma melhor chance de cura ou terapia mais efetiva, mas também isso se traduz em maior eficiência de custos para todo o mercado de saúde. É fundamental promover e trazer os tratamentos inovadores que realmente impactem positivamente a vida do paciente e contribuam para o aprimoramento do mercado de saúde como um todo.

“Além disso, é essencial ajudar na adesão ao tratamento, pois não basta apenas diagnosticar o paciente e iniciá-lo no tratamento, é crucial garantir que ele permaneça comprometido ao longo do tempo.”

Há exemplos já?

Olavo Corrêa – Estamos envolvidos em uma aliança chamada Lung Ambition Alliance, uma aliança global que estamos trazendo para o Brasil. Essa iniciativa está fortemente concentrada no câncer de pulmão, que, embora não seja o mais incidente, é o mais letal. Nossa ambição, quando se trata do câncer de pulmão, é bastante clara: queremos dobrar a sobrevida dos pacientes. Atualmente a taxa de sobrevida em 5 anos para o câncer de pulmão é em torno de 18%, o que é bastante baixo. Nossa meta é dobrar isso para 36%. Como conseguimos isso? Atuamos não apenas comercializando novos medicamentos, mas focando principalmente o diagnóstico mais precoce da doença. Atualmente, cerca de 80% dos casos de câncer de pulmão são diagnosticados nos estágios mais avançados, onde a efetividade do tratamento é menor, os custos de tratamento são mais altos e as chances de cura são menores. Recentemente, em agosto, fizemos uma publicação inédita em parceria com o Insper, realizando um estudo específico relacionado à Lung Ambition Alliance para identificar os custos associados ao câncer de pulmão. Descobrimos que 80% dos custos estão relacionados à letalidade da doença. Ou seja, investir mais no diagnóstico precoce não é apenas custo-efetivo, mas também traz melhorias significativas para o paciente. Portanto, não se trata apenas de mais financiamento, mas sim de como alocar adequadamente os recursos. Nesse sentido, destaco a importância de discutir isso tanto no mercado privado quanto no público e a relevância da indústria farmacêutica atuar na linha de frente para trazer essa perspectiva.

Entendendo todo o papel da AstraZeneca e da indústria de modo geral, de trazer dados, informação para basear e embasar políticas públicas, às vezes fica a sensação de que poderia ser mais ágil. Como podemos acelerar a criação de políticas públicas?

Olavo Corrêa – Do ponto de vista das discussões houve uma melhoria significativa. O fato de estarmos realizando essas discussões indica uma boa vontade de todas as partes envolvidas em efetuar mudanças reais. Acredito que a questão central reside mais na organização, em determinar a sequência de ações para conectar os pontos. Parte disso é sobre como gerenciar eficientemente o financiamento, transferindo recursos de um local para outro sem interrupções. Considero que essa é a discussão principal que pode impulsionar esse processo. Observamos um aumento nos investimentos nesse sentido, principalmente no setor privado. Percebo que essas discussões estão mais intensas do que no passado. Acredito que é apenas uma questão de tempo até vermos algumas mudanças efetivas. Em alguns lugares, já podemos observar essas transformações. Vou trazer como exemplo uma iniciativa de política pública recente em Goiás, chamada “Goiás Todo Rosa”. Esse projeto, voltado especificamente para cânceres relacionados às mulheres, especialmente o câncer de mama, aborda a variedade de tipos desse câncer e a importância dos marcadores, como BRCA1 e BRCA2. Esses marcadores se tornaram conhecidos, em parte, devido ao caso de Angelina Jolie, que tornou público seu diagnóstico relacionado a esses marcadores. Implementar políticas públicas que permitam que pacientes com câncer de mama realizem gratuitamente, pelo SUS, a identificação dos marcadores BRCA1 e BRCA2 é um exemplo de mudança concreta. Portanto, é evidente que é possível efetuar alterações e algumas regiões estão mais avançadas nessa discussão do que outras. Existe um caminho a percorrer. Mais uma vez, vejo uma trajetória mais clara em relação à perspectiva de saúde, com a esperança de que possamos proporcionar cada vez mais tratamentos e soluções eficazes para os pacientes.

Em 2023 vocês lançaram uma parceria com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), vinculado ao Governo do Estado de São Paulo. Qual é o objetivo desse tipo de parceria e o que vem por aí?

Olavo Corrêa – O principal objetivo é inovar e apresentar soluções inovadoras que tenham um impacto realmente positivo na vida dos pacientes. Sobre o hub de inovação em parceria com o IPT, um dos mais importantes centros tecnológicos de pesquisa e tecnologia do Brasil. Atualmente, temos um espaço físico localizado nas instalações da USP, onde colaboramos presencialmente e virtualmente com diversas outras empresas, que nem sempre estão diretamente vinculadas ao mercado de saúde. Trabalhamos em conjunto com grandes empresas e muitas startups. O objetivo desse esforço colaborativo é discutir questões relacionadas aos mercados público e privado, buscando soluções inovadoras que nem sempre estão ligadas à tecnologia, já que a inovação pode assumir diversas formas. Essas discussões englobam temas de interação e interoperabilidade de dados, por exemplo. É um dos tópicos que temos explorado no IPT. Como podemos realmente abordar isso? Como as startups podem contribuir? E como as grandes empresas podem se envolver? O hub faz parte do e-catalyst, uma rede global de hubs de inovação da AstraZeneca espalhada pelo mundo. Esses hubs estão interconectados, o que significa que se em algum lugar do mundo está sendo discutida uma possível solução para um problema que também ocorre no Brasil, através dessa conexão podemos entender o progresso já alcançado nessa discussão, nas soluções e nas oportunidades, acelerando assim o desenvolvimento aqui.

Como funciona esse intercâmbio?

Olavo Corrêa – Muitas vezes os desafios são semelhantes, o que proporciona oportunidades de colaboração entre empresas no Brasil e também aquelas fora do país. O objetivo principal permanece bastante aberto, mas está centrado na inovação. Estamos direcionando nossos esforços para aprimorar a informação, tratamento, diagnóstico e a conexão de dados, com o intuito de reduzir desperdícios no mercado de saúde e promover efetividade. Esse é o foco principal e isso difere do propósito do hub de inovação. O hub de inovação não se destina a criar uma plataforma para comercialização. Não é esse o propósito. O hub de inovação visa, de fato, desenvolver algo que faça sentido para o mercado de saúde, algo que agregue valor percebido por ele. Essa parceria tem sido particularmente gratificante com o Estado de São Paulo, pois demonstra o compromisso deles com a inovação. A colaboração com o IPT e a abertura para discutir e criar esse espaço refletem o interesse do Estado de São Paulo em progredir cada vez mais no campo da inovação.

Tem alguma coisa que está sendo construída e que você pode adiantar?

Olavo Corrêa – Algo concreto nesse momento ainda não posso dar. Lançamos o hub de inovação em julho e o espaço físico está sendo inaugurado no começo do ano. Ainda tem muitas discussões que estão no âmbito de ideias. Algumas ideias avançaram um pouquinho mais.

Vamos entrar no tema ESG. De modo geral, no universo corporativo, isso ganhou um grande destaque ao longo dos últimos anos. Especialmente na saúde, esse tema parece um pouco mais recente. Como a AstraZeneca vê essa questão ESG? E quais as principais ações que vocês têm dentro da companhia?

Olavo Corrêa – Nós temos três pilares de ESG. O primeiro está relacionado ao acesso à saúde. Buscamos proporcionar acesso igualitário à população. O tema de pesquisa clínica está inserido nesse pilar. O segundo pilar é a proteção do ecossistema e meio ambiente, sendo crucial para nós. Alguns exemplos do que temos feito: o AZ Forest e a parceria com a SOS Mata Atlântica, além de iniciativas em nossas plantas para reduzir a emissão de poluentes. O terceiro ponto é ética e transparência, incluindo nosso compromisso com temas como diversidade e inclusão, valores fundamentais na AstraZeneca, com ações concretas ao longo deste ano.

“O impacto no ecossistema está diretamente relacionado à saúde. Embora pareça óbvio, na prática, nem sempre é. Muitas vezes conseguimos visualizar o impacto climático no meio ambiente, como incêndios no Norte e chuvas intensas no Sul do Brasil. Porém, há um impacto silencioso e letal no desenvolvimento de doenças crônicas, como problemas respiratórios, cardiovasculares, câncer e infecções.”

Por isso o meio ambiente está intrinsecamente ligado à preservação da saúde. Este tema ganhou destaque recentemente com a COP28, onde a AstraZeneca lidera algumas discussões. O foco é liderar a preservação e restauração do meio ambiente, destacando a importância de não apenas preservar, mas também restaurar.”

Há ações concretas nesse sentido?

Olavo Corrêa – O AZ Forest, que já mencionei, é um investimento significativo de 350 milhões de reais no Brasil para o plantio de pelo menos 12 milhões de árvores, em uma área equivalente a 6 mil hectares, representando aproximadamente 38 Parques do Ibirapuera ou 6 mil campos de futebol. Esse plantio não é simples, pois se trata da restauração da mata nativa, preservando flora e fauna da região. O investimento se concentra no estado de São Paulo, no Pontal do Paranapanema, em parceria com a Biofílica Ambipar e o Instituto de Pesquisas Ecológicas de São Paulo. Esse projeto, chamado “Ar Corredor pela Vida”, cria um corredor de ar mais forte por São Paulo. Entendemos que, a curto, médio e longo prazo, isso impactará positivamente na saúde da população. A AstraZeneca está comprometida com essa iniciativa e, globalmente, nossa meta é plantar 200 milhões de árvores até 2030.

Teve redução de frota também?

Olavo Corrêa – Hoje, 100% da nossa frota de força de vendas roda a etanol. Etanol polui 97% menos e a emissão é extremamente baixa. Na nossa planta estamos usando mais água de reuso e também instalação de painel solar, para a energia renovável. Temos uma ação proativa de reduzir as viagens aéreas, principalmente do corpo de funcionários. Esse também foi o legado da pandemia porque a forma digital tem nos ajudado nas interações e tem funcionado muito bem. E já temos uma parceria há alguns anos com a SOS Mata Atlântica. Tivemos o plantio em 2022 de 40 mil árvores. Temos trabalhado cada vez mais com a SOS Mata Atlântica para trazer conscientização. Não adianta você só fazer reflorestamento, preservação, você precisa ampliar a conscientização também.

E como engajar os funcionários na vida prática deles?

Olavo Corrêa – Há um trabalho envolvido. Explicamos verdadeiramente os motivos pelos quais estamos realizando determinadas ações e conseguimos engajar melhor as pessoas. Recentemente, conduzimos uma pesquisa para avaliar os principais aspectos da AstraZeneca, incluindo sua cultura, entre outros. É gratificante observar que as pessoas estão fornecendo feedback extremamente positivo. O sentimento de orgulho entre os funcionários é notável quando implementamos projetos que ultrapassam as fronteiras tradicionais do mercado de saúde. Nós os envolvemos em todas as ações: por exemplo, em parceria com o SOS Mata Atlântica, os próprios funcionários participam do plantio. Na convenção de vendas deste ano, promovemos doações de alimentos e, na próxima, estamos explorando a possibilidade de incentivar a doação de sangue. Esse engajamento é parte do nosso cotidiano e reflete o que defendemos, seguindo o princípio “walk the talk”. Essa dinâmica se estende ao ecossistema, mas também abrange temas relacionados à ética e transparência. Envolvemos cada vez mais colaboradores em iniciativas cruciais, como o projeto Adolescente Saudável, que a AstraZeneca mantém há mais de uma década. O projeto busca disseminar informações e conscientização sobre doenças crônicas não transmissíveis, especialmente entre a população jovem. Até o final de 2025, nossa meta é engajar mais de 60 mil jovens nesse projeto, indiretamente impactando cerca de 2 milhões de pessoas. Quanto ao tema de diversidade e inclusão, na AstraZeneca, mantemos mais de 5 grupos de afinidades liderados pelos próprios colaboradores. Esse movimento interno é motivo de grande orgulho para mim. Observar como a AstraZeneca se posiciona e lidera essa discussão é inspirador. Mas meu orgulho é ainda mais fortalecido ao ver todos os colaboradores verdadeiramente envolvidos nessa causa.

Até 2030 a AstraZeneca quer ter pelo menos o lançamento de 20 novos medicamentos. Quais são as grandes apostas?

Olavo Corrêa – A atuação é em três áreas: oncologia, doenças raras e biofarma. Na oncologia, nossa ambição é revolucionar o mercado com terapias inovadoras não apenas para câncer de pulmão, mas também para ovário, mama, próstata, entre outros. Com um pipeline robusto, trabalhamos em colaboração e parcerias para sustentar o crescimento e lançar medicamentos revolucionários nos próximos 12 a 24 meses, especialmente para câncer de mama e pulmão. No cenário de doenças raras, lançamos tratamentos expressivos este ano e expandimos nossa atuação para doenças ultrarraras. Além de lançar medicamentos, assumimos a responsabilidade de apoiar o diagnóstico dessas condições, reconhecendo a complexidade desse processo e a necessidade de inovação em sistemas que integrem dados e viabilizem diagnósticos mais eficazes. Na biofarma, esperamos lançar dois novos medicamentos no próximo ano, abordando áreas como hipercalemia e cardiovascular. Além disso, teremos um lançamento para a DPOC em 2024, desafio que destaca nosso compromisso em oferecer uma variedade de produtos potenciais blockbusters em um curto período, algo que já alcançamos com sucesso nos últimos anos. Os anos 2024 e 2025 prometem ser altamente promissores para a AstraZeneca.

Última pergunta: quais são as pautas que devemos prestar atenção a partir de 2024?

Olavo Corrêa – Vou apresentar aqui três pontos essenciais. Primeiramente, destaco a ampliação do diagnóstico. Considero esse um ponto de interesse para toda a sociedade, tanto no mercado privado quanto no público. A crescente ênfase em custo e efetividade tem um potencial incrível para transformar o mercado de saúde. Investir no diagnóstico precoce de diversas doenças emerge como um elemento crucial, com um potencial de mudança de paradigma notável no setor. O segundo ponto, já amplamente debatido e em discussão, é o tema relacionado ao acesso à saúde. Seja no mercado público ou privado, há uma busca constante por soluções inovadoras. Iniciativas atuais, como o compartilhamento de riscos (risk sharing), são evidentes. Mas acredito que em 2024 surgirão oportunidades para evoluirmos ainda mais na discussão desses modelos. O acesso à saúde continuará sendo um ponto crucial com diversas oportunidades de aprimoramento. O terceiro ponto que destaco está relacionado ao complexo industrial e econômico da saúde no mercado público. Considero esse tema digno de crescente atenção e discussão, com ênfase na parceria entre os setores público e privado. O interesse crescente do governo nesse aspecto indica que essas serão pautas quentes e discussões extremamente relevantes para todo o mercado.

Natalia Cuminale

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, com as reportagens, na newsletter, com uma curadoria semanal, e nas nossas redes sociais, com conteúdos no YouTube.

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