Nova regras de alteração da rede hospitalar da ANS devem contribuir para qualidade do setor

Nova regras de alteração da rede hospitalar da ANS devem contribuir para qualidade do setor

Resolução nº 585 estabelece critério de qualidade para substituição e análise de impacto em beneficiários em casos de redimensionamento por redução; olhar para o cuidado especializado ficou de fora

By Published On: 22/01/2025
novas regras da ANS de alteração da rede hospitalar

Foto: Adobe Stock Image.

Desde 31 de dezembro de 2024, as operadoras de planos de saúde devem seguir novas regras da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para alterar as redes hospitalares ofertadas em seus produtos. Além de oferecer opções de portabilidade, elas também são obrigadas a comunicar seus beneficiários em caso de diminuição da rede de serviços hospitalares e manter ou elevar a qualidade dos hospitais escolhidos nessa substituição. As mudanças, no entanto, encontram dificuldades para serem implementadas. Entre elas, está a baixa acreditação de hospitais brasileiros.

Antônio Britto, diretor executivo da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), avalia que a nova medida da ANS é positiva pois dá destaque aos critérios de qualidade usados para avaliar hospitais. “Nós entendemos que é um avanço em relação à situação atual porque, de alguma forma, coloca em debate a questão de que o credenciamento de um hospital depende de uma análise da qualidade.” Segundo ele, poucos hospitais brasileiros têm um nível de acreditação internacional. “Assim, se torna difícil estabelecer regras para medir a qualidade se não existe um termômetro”, comenta.

A nova medida da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) entrou em vigor após meses de atraso. Ela permite maior portabilidade dos beneficiados que, ao serem notificados com as implementações de novas mudanças da rede hospitalar, podem optar por outra contratação sem que cumpram um tempo mínimo de permanência ou que o valor seja na mesma faixa de preço que o anterior.  

Prevista em casos de substituição, a comunicação prévia aos beneficiários agora é uma novidade para o redimensionamento por redução da rede hospitalar. Para Britto, isso representa um movimento maior em prol da transparência e do empoderamento do consumidor, o que é visto com bons olhos. O cumprimento das novas regras poderá, ainda, melhorar a imagem das operadoras dos planos de saúde e dar maior sustentabilidade a esse sistema, defende.

“Com a vigência das novas regras para alterações na rede hospitalar, fortalecemos os direitos dos consumidores e reafirmamos o compromisso da Agência com a qualidade e a segurança na saúde suplementar”, afirma o Diretor de Normas e Habilitação dos Produtos da ANS, Alexandre Fioranelli.

Caso a operadora não siga essas orientações, poderá tomar uma multa de até R$ 50 mil, em caso de redimensionamento por redução sem autorização. Em caso de criação de nova infração em relação à exclusão parcial de serviço hospitalar ou de urgência e emergência, a multa é de R$ 40 mil. Já para substituição, a operadora poderá pagar R$ 30 mil ou levar uma advertência. 

Segundo a agência, o sistema utilizado para recebimento e análise das alterações teve seus parâmetros atualizados e já está atendendo as solicitações encaminhadas considerando as novas regras estabelecidas.

Acreditações de hospitais na nova resolução 

A novidade para substituições na rede hospitalar é o ganho de critérios de qualidade para realização de novas mudanças, considerando a avaliação dos serviços utilizados e dos prestadores equivalentes na localidade. Para isso, o uso de serviços hospitalares e de atendimento de urgência e emergência nos últimos 12 meses será analisado com base no Padrão de Troca de Informações da Saúde Suplementar (TISS). Se observada sua utilização, o serviço deverá ser substituído.  

Caso o prestador a ser substituído apresente algum atributo de qualificação, um substituto com qualificação do mesmo nível ou superior deverá ser indicado. A linha hierárquica será: aqueles acreditados pelo Programa de Qualificação dos Prestadores de Serviços na Saúde Suplementar (QUALISS); prestadores que apresentem outras certificações reconhecidas pela ISQUA (The International Society for Quality in Health Care); e segurança do paciente.  

Se não houver a possibilidade de contratação de prestador com acreditação de nível igual ou superior ao anterior, a operadora poderá indicar, para inclusão em seu produto, um substituto sem qualquer atributo de qualificação. Neste caso, a busca por estabelecimentos substitutos deve ser feita, primeiramente, dentro do próprio município, em seguida no município limítrofe e, depois, na região de saúde do produto. 

“Nós temos defendido que todos os hospitais façam o sacrifício financeiro de partir para a acreditação porque ela muda a história de um hospital. Ela exige que esse hospital defina processos e processos qualificados para cada atividade”, defende Britto. No entanto, um dos entraves para esse processo é o custo envolvido na acreditação, principalmente as internacionais. A Joint Commission International (JCI), por exemplo, uma das mais reconhecidas internacionalmente, tem duas taxas: uma cobrada anualmente durante o ciclo de acreditação trienal e outra local durante o ano de realização da pesquisa de certificação. 

Outro empecilho para os hospitais na busca por mais acreditações é a transformação necessária para consegui-las — processo com custos altos para a instituição. “Nós reconhecemos que existe o problema, mas também defendemos que, no mercado de saúde suplementar, para que você consiga se tornar permanente, ter o seu hospital sustentável, você tem que aprimorar a qualidade assistencial que oferece”, afirma Brito.  

Segundo o diretor executivo da Anahp, são cerca de 500 instituições acreditadas no Brasil, um número ainda muito baixo em comparação com a quantidade de 6.500 hospitais existentes. Apesar disso, é possível identificar uma tendência de crescimento nos últimos anos. Porém, a concentração da saúde em grandes centros do país impõe desafios na aplicabilidade das novas regras de substituição hospitalar em municípios pequenos. Enquanto grandes centros têm variadas opções de rede hospitalar, pequenas cidades e localidades sofrem para encontrar hospitais com qualidade equivalente.

“Quando a resolução diz que uma operadora só pode trocar um hospital por outro da mesma qualidade, supõe que existam pelo menos dois da mesma qualidade. Na maioria absoluta das cidades brasileiras, se tiver um com acreditação, te garanto que não vão ter dois. Na maioria das cidades não tem nenhum. Então, a resolução não vai ser aplicada na maioria absolutíssima dos municípios brasileiros. Mas, de novo, ela sinaliza na direção correta”, comenta Britto.  

Novas regras da ANS da rede hospitalar têm lacunas na especialidade

Além da qualidade do hospital, a continuidade do cuidado de pacientes que requerem atenção especializada também é um ponto de atenção das novas normas da ANS. A substituição dos prestadores será feita com base nos serviços hospitalares e no atendimento de urgência e emergência realizado nos últimos anos, sem incluir a atenção especializada. 

A substituição será baseada, portanto, em serviços como o de internação psiquiátrica, obstétrica, pediátrica, clínica, cirúrgica, em UTI neonatal, UTI pediátrica ou UTI adulto, bem como atendimentos de urgência e emergência adulto e pediátrico. A ausência das especializações no texto da resolução representa um risco para o seguimento da atenção dos pacientes, que necessitam de um cuidado específico, algo que o prestador substituto pode não suprir. 

De acordo com a agência, as operadoras são obrigadas a oferecer aos beneficiários todos os procedimentos previstos no contrato e no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS para atendimento integral da cobertura conforme diretriz de utilização. Isso inclui levar em consideração a segmentação assistencial, área geográfica de abrangência e área de atuação do plano, dentro dos prazos definidos pela ANS, não sendo permitida, sob qualquer alegação, a negativa indevida de cobertura assistencial.

No caso de beneficiários em internação, a agência alega que o paciente poderá ser removido para outro prestador da rede da operadora caso o processo seja atestado pelo médico assistente. Já para casos de tratamentos continuados, a operadora é obrigada a oferecer o serviço em outro prestador apto a realizá-lo.

“Não é possível que se estabeleça, no Brasil, uma prática onde uma pessoa com doença oncológica tem o diagnóstico em um lugar, vai fazer quimio ou radioterapia em um segundo e, se necessário, cirurgia num terceiro lugar, e voltar para ser examinada pelo médico do primeiro lugar. Isso é contra as pessoas e é contra o bom senso e a eficiência, inclusive financeira, dos tratamentos”, comenta Antônio Britto.

Segundo a avaliação do diretor, esse ponto, que ficou em aberto, deve receber a atenção da Anahp. “A Anahp vai continuar discutindo esse ponto e de que forma podemos pensar no paciente, respeitando o direito de uma operadora trocar o prestador de um serviço”. A expectativa, por parte do representante da associação é que a questão das especialidades seja abordada junto à ANS e reformulada antes que a medida passe por sua reavaliação programada, prevista para dois anos após o início da sua vigência. 

Outra questão envolvendo a substituição é a possibilidade do substituto complementar. Nesse caso, o prestador, sendo ele hospitalar ou não, ofertará serviços hospitalares que não constam no prestador substituto. Essa permissão poderá trazer uma situação de “faca de dois gumes” para a assistência do paciente. 

“A perspectiva é que eu possa ter uma fragmentação das regras da assistência ofertada por um hospital. Se eu tinha um hospital que eu ia resolver tudo, com a regra atual, a operadora vai poder colocar cinco hospitais. Pode ser que aconteça isso. Pode ser bom, eu vou para um hospital especialista em transplante de rim, por exemplo. Mas, por outro lado, pode ser que eu tenha que me movimentar em uma cidade como São Paulo, da Zona Sul para a Zona Norte”, explica Teresa Gutierrez, sócia do escritório Machado Nunes Advogados, que esteve presente em evento realizado pela Anahp.

Além do substituto complementar e os critérios de qualidade, a nova resolução também prevê a indicação de estabelecimento de saúde já pertencente à rede de atendimento do produto como prestador substituto. Para isso, será necessário cumprir alguns requisitos, entre eles, ter aumentado sua capacidade de atendimento, como serviços, leitos ou instalação física, nos últimos 90 dias. A indicação do prestador também poderá acontecer se ele tiver sido incluído na rede do produto em, no máximo, até 90 dias antes da data da exclusão do prestador a ser substituído. 

Isabella Marin Silva
Isabella Marin

Jornalista formada pela Escola de Comunicações e Artes da USP, passou pela área de Comunicação da Braskem e atuou com Jornalismo de Dados na empresa Lagom Data. Integra o time como repórter do Futuro da Saúde, onde atua desde março de 2024.

About the Author: Isabella Marin

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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Jornalista formada pela Escola de Comunicações e Artes da USP, passou pela área de Comunicação da Braskem e atuou com Jornalismo de Dados na empresa Lagom Data. Integra o time como repórter do Futuro da Saúde, onde atua desde março de 2024.