Instituições sugerem Linha de Cuidado em Depressão para municípios brasileiros
Instituições sugerem Linha de Cuidado em Depressão para municípios brasileiros
A Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, a Janssen
A Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, a Janssen e o Instituto de Apoio ao Desenvolvimento Social (IPADS) lançam hoje o documento intitulado Linha de Cuidado em Depressão (LCD). Trata-se de um manual que pode servir de referência para que profissionais e gestores de saúde nos municípios brasileiros tomem decisões para implantar e aprimorar ações de melhoraria do cuidado à doença. A informação foi noticiada pela Agência Bori.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o país com os índices mais altos de depressão na América Latina e, ainda assim, existem muitas barreiras quando se fala no cuidado da doença no país, como a dificuldade de acesso ao tratamento para pessoas de baixa renda, o estigma social, a falta de profissionais e a ausência de um sistema de saúde integrado. Além disso, a rede de saúde no Brasil vive hoje a fragmentação do SUS (Sistema Único de Saúde) e do sistema de saúde suplementar, o que acomete um pior cuidado da depressão no Brasil.
Em entrevista para o Futuro da Saúde, Thiago Trapé, psicólogo e um dos idealizadores do manual, avalia que hoje tanto o SUS quanto o sistema de saúde suplementar, apesar de possuírem modelos distintos, não conseguem abarcar o cuidado ao paciente com depressão:
“O ponto chave presente em ambos os sistemas é a fragmentação. Não há uma conexão entre o modelo de financiamento, de remuneração, de organização de serviços e prática clínica […] Hoje a gente tem uma lacuna no SUS que se apresenta para as doenças crônicas, porque o paciente com doença crônica possui muitas variáveis que precisam ser conduzidas ao longo do tempo. A depressão não é um caso agudo que acontece hoje, você vai para um pronto atendimento e volta para casa. Muito pelo contrário, há uma necessidade de atenção contínua e o sistema é muito fragmentado. A atenção primária não consegue dar continuidade do cuidado, muitas vezes não há um profissional apto para isso, temos poucos médicos psiquiatras no Brasil […] e não conseguimos abraçar o cuidado de saúde mental para a depressão”.
Com relação ao conceito de linha de cuidado, o psicólogo explica que ela é necessária no caso de doenças crônicas. Além disso, ele relata que o IPADS, como instituto que fomenta a área de planejamento, formulação e avaliação de políticas públicas desde os anos 2000, já trabalhava com esse referencial teórico, auxiliando na construção com algumas linhas de cuidado com a Secretaria de Estado.
“É um conceito que conversa com a transição epidemiológica, ou seja, o aumento das doenças crônicas e a necessidade de organizar e integrar o sistema. A linha de cuidado é uma forma inteligente de formular e planejar politicas públicas. Não adianta nenhum ator desse ecossistema se privar desse debate, porque a partir do ponto que se organiza a linha, todo mundo se beneficia, como os usuários, os trabalhadores, os gestores e a cadeia produtiva inteira”, explica Thiago.
Diante desse panorama, a LCD nasceu como um plano de ação para contribuir com uma melhora nesse cenário, com o objetivo de que possa ser implantada em qualquer um dos 5570 municípios brasileiros. Ainda, a construção do projeto da LCD implicou em oficinas de trabalho em dois municípios paulistas, Valinhos e Vinhedo, de maneira que foram testadas diferentes técnicas para o auxílio de profissionais da saúde na organização do itinerário terapêutico do paciente com depressão.
“Fizemos um processo bem longo. Nós trabalhamos no desenvolvimento e construção de politicas bottom-up, ou seja, de construção ascendente, sempre envolvendo os principais stakeholders, que nesse caso são trabalhadores e gestores. Partimos nosso olhar desse ponto e fizemos uma série de inserções, definimos os grandes temas que guiam o manual técnico e fizemos oficinas com trabalhadores. Essas oficinas eram como cursos em que além de trazermos o conceito, discutíamos isso na prática deles. A partir daí conseguimos extrair os elementos úteis para formulação final”.
Com base nessas oficinas e testes, os pesquisadores desenvolveram três materiais: um manual sobre a doença e os possíveis cuidados, direcionado para o trabalhador; um guia de revisão dos protocolos, voltado para diferentes profissionais da saúde; e, por fim, o manual do gestor, com o intuito de subsidiar a tomada de decisão aos gestores de municípios.
Com esses materiais, os pesquisadores entendem que os secretários de saúde dos municípios brasileiros possuem as ferramentas para melhorar o cuidado que se tem com o paciente em depressão, organizando uma linha de cuidado que passa por três níveis: a clínica, com protocolos para psicólogos, psiquiatras e enfermeiros; os serviços necessários como UPA (Unidade de Pronto Atendimento) e UBS (Unidade Básica de Saúde); e, por último, o vínculo entre esse serviços.
Além disso, os materiais da Linha de Cuidado em Depressão também abordam dados importantes sobre a doença e pontos de atenção, entre eles a melhor forma como os aparelhos da rede de saúde pública podem ser associados nesse cuidado. Assim, a proposta é que haja uma organização desde o diagnóstico da depressão até as formas de tratamento, e que esse material influencie no desenvolvimento e implementação de políticas públicas que olhem para a depressão como doença multifatorial.
“Fizemos um modelo de construção de materiais de referência, e esse tipo de material possui dois caminhos: a gaveta ou a realidade. Desejamos que esse documento, que é público e aberto, chegue nos municípios e que esse debate possa de fato ser usado para a construção das politicas locais, e aí a gente olha muito para os municípios, pois eles têm uma autonomia gerencial em grande parte da rede que daria conta da depressão”, conclui Thiago.
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NATALIA CUMINALE
Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.