Impactos das queimadas à saúde: Ministério da Saúde prevê tendas de hidratação e nebulização
Impactos das queimadas à saúde: Ministério da Saúde prevê tendas de hidratação e nebulização
Ministra Nísia Trindade debateu impacto das queimadas em coletiva de imprensa e divulgou ações, que incluem preparação de profissionais.
Estados brasileiros estão vivendo cobertos por fumaça e baixa qualidade do ar há semanas, fruto de uma conjunção de fatores que vão de seca histórica a focos de queimadas que se alastram pelo Brasil. Desde 9 de setembro, a capital paulista vem registrando o pior índice de ar entre 120 grandes cidades do mundo, de acordo com o site de monitoramento IQAir. Na quarta-feira, 11, o Ministério da Saúde promoveu uma coletiva de imprensa para falar sobre o tema e afirmou que, até o momento não há sobrecarga da rede de urgência e emergência. Mesmo assim, na ocasião a titular da pasta Nísia Trindade revelou que a Sala de Situação Nacional de Emergência Climáticas, criada em 2024, se reunirá diariamente diante da intensificação dos focos de incêndio e previsões meteorológicas que apontam piora da seca.
Além disso, a Força Nacional do SUS foi acionada e irá apoiar a rede assistencial com orientações e visitas às áreas mais afetadas pelo fogo. A rede básica de saúde segue como o primeiro ponto de atenção para as consequências das queimadas, com atendimento sendo realizado em Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Unidades de Pronto Atendimento (UPA). Para alguns locais, o segundo nível de atenção poderá contar com a instalação de tendas de hidratação e nebulização – a maior parte delas está sendo planejada nos biomas do Amazonas e Pantanal, com previsão de algumas unidades para a região oeste de São Paulo e áreas no Paraná. Em caso de eventual colapso, um terceiro nível de atenção seria ofertar uma estrutura maior de atendimento à população, como um hospital de campanha, por exemplo.
Dentre outras ações de orientação aos gestores, a pasta informou que haverá a publicação de orientações para os brigadistas envolvidos na contenção das queimadas e guias para os profissionais de saúde de atendimento nas redes básicas.
“A situação é grave e urgente. Que haja de fato um fim dessas queimadas, não é possível viver essa situação. No caso da saúde, precisamos pensar que o SUS é um sistema que tem capacidade de atendimento, mas essa resiliência é cada vez mais testada por fatores como a mudança climática. O tempo todo temos que rever nossos protocolos, nossas ações, e aumentar a nossa união, esse trabalho conjunto”, disse a ministra durante a coletiva.
O plano de ação está sendo organizado pelo Ministério da Saúde com apoio do CONASS e CONASEMS para avaliação de regiões mais atingidas. Segundo dados da Secretária de Atenção Primária à Saúde, sintomas relacionados à seca e desidratação já são vistos em diversos locais. Náusea e vômito são os mais notificados. Em Goiás, houve 46% das queixas de náusea e vomito na segunda quinzena de agosto. No Mato Grosso, 58%. Já no Distrito Federal, as redes básicas realizaram o dobro de atendimento com as mesmas queixas.
Além do atendimento na rede básica, o ministério também prevê apoio aos Centros de Atenção Psicossocial e Unidade da Saúde da Família, para acolhimento e cuidado de saúde mental, dentro da estrutura de saúde já existente.
Impacto das queimadas à saúde
A baixa qualidade de ar, junto à baixa umidade, é sinal de preocupação para a população que convive com a fumaça. O médico patologista e professor da Faculdade de Medicina da USP, Paulo Saldiva, associa o impacto das queimadas com o de um cigarro. A diferença é que, agora, quem fuma o cigarro não é quem decide acender a droga, e sim todas as pessoas no território que respiram a fumaça no ar.
“As consequências são muito parecidas com a do cigarro. Hoje, você tem uma parte da população exposta que também não fuma continuamente, acende o cigarro uma vez ou outra. Agora, nós temos 100% da população exposta que não para de fumar esse ‘cigarro ambiental’”, comenta o médico.
De acordo com Saldiva, que participou há décadas dos comitês da Organização Mundial da Saúde (OMS) que estabeleceram os padrões de qualidade do ar e o potencial carcinogênico da poluição atmosférica, com o índice de umidade em níveis abaixo do adequado, o sistema de defesa do corpo fica fragilizado e modifica o controle do indivíduo. Convivendo nesse meio, as pessoas podem sofrer mais desidratação, com um aumento projetado de pessoas com conjuntivite, rinite, tosse e pigarro. O rim, por sua vez, é obrigado a trabalhar em dobro para melhorar as condições de função renal e, com a retenção de mais água, o sangue se torna mais espesso.
Essas condições favorecem para que um trombo ocorra, como um infarto ou AVC. “Sabemos que estamos esperando um momento acima do risco de mortalidade, que vai superar de 20 a 30%. E que vai durar até 3 dias depois que acabar o último incêndio”, comenta o médico.
Alguns grupos de pessoas ficam mais vulneráveis frente aos impactos das queimadas, como as crianças, que não bebem água sozinha, e idosos que, à medida que a idade avança, vão perdendo a capacidade de se sentirem desidratados. Outras pessoas que podem sentir mais as consequências são aqueles com doença respiratória pré-existente, como a asma, que passarão a utilizar mais as ferramentas de contenção da doença, como a bombinha, e sentirão impactos maiores na saúde. Pessoas com hipertensão também devem ficar atentas, pois podem ter mais dificuldade para controlar os índices da hipertensão arterial
Alternativas para a população
Existem alguns cuidados para melhorar os impactos das queimadas na saúde: um deles é a hidratação. Para isso, uma das alternativas é o uso soro fisiológico ou spray nasal para a mucosa nasal – fazer inalação também é uma ótima forma de hidratação. Umidificar o ambiente onde as pessoas ficam também é uma opção, principalmente entre às 10 horas da manhã e 16 horas da tarde, período em que a umidade chega ao mesmo nível subsaariano. Para aqueles que puderem, evitar sair de casa e de fazer exercícios ao ar livre. Ao andar na rua, a utilização de máscaras como a N95 ou PFF2 são boas práticas.
O médico também alega que, em sinais de alerta como febre, secreção purulenta pelo nariz, cansaço extremo ou sintomas persistentes, é necessário buscar ajuda médica. Já para portadores de doenças crônicas, como diabetes, hipertensão, leucemia, o ideal é ficar atento quanto ao manejo da doença.
“Felizmente, você não vai fumar essa poluição de árvore como se fuma cigarro por ano. Você vai fumar por semanas. Então, efeito de longo prazo eu não prevejo. Nesse aspecto, ela é só circunstancial, por isso que cabe em planos de contingência”, comenta o médico
Uma das alternativas que Saldiva vê para a contenção de situações semelhantes no futuro é que a saúde tenha mais conexão com a área ambiental. Em um contexto de previsão do tempo, por exemplo, é possível que se incorpore também os riscos em saúde e cuidado. Outro relacionamento que deve crescer seria a voz da saúde dentro da legislação ambiental. “Não é da competência da esfera da saúde, que já lida com muita coisa, mas a saúde pode participar do diálogo. A saúde tem gente preparada, mas não tem voz. Talvez uma ideia seja mudar um pouco a composição e, nesse período, incorporar gente da saúde para discutir o que podem fazer”, conclui.
A apresentação feita durante a coletiva de imprensa do Ministério da Saúde pode ser acessada aqui.
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NATALIA CUMINALE
Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.