Home care cresce e se reinventa em um Brasil que envelhece

Home care cresce e se reinventa em um Brasil que envelhece

A pirâmide etária é uma demonstração gráfica tradicionalmente utilizada para […]

By Published On: 26/05/2021
atendimento home care e envelhecimento da população

A pirâmide etária é uma demonstração gráfica tradicionalmente utilizada para entender qual a situação da idade de uma população. Mais perto da base são representados os mais jovens e do pico, os mais velhos. Quando a base é maior e vai afinando gradualmente até o topo, isso indica que a maioria daquela população é formada por crianças, adolescentes e jovens. No Brasil, esse gráfico tradicionalmente tinha um formato triangular, mas nos últimos anos isso tem mudado rapidamente. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a base da pirâmide diminuiu e o topo cresceu, uma tendência cada vez mais forte do envelhecimento da população.

Entre os motores desse processo está o desenvolvimento da ciência e da medicina, que nos permite viver mais – nem sempre melhor – e, também, aspectos “comportamentais”, como a decisão das mulheres de privilegiar os estudos e a carreira, engravidando mais tarde, e de famílias que optam por ter apenas um filho ou nenhum. O envelhecimento da população, aliado à pandemia da Covid-19, tem contribuído para o crescimento das empresas prestadoras de serviços de atendimento home care.

O atendimento home care não se restringe aos pacientes da faixa etária mais avançada, ele abraça todos os serviços prestados na casa de pacientes de qualquer idade, que vão desde consulta médica, atendimento semanal de um fisioterapeuta até um paciente que necessita de uma estrutura mais complexa e contínua de cuidados. “Com o envelhecimento da população, tornaram-se mais comuns as ocorrências de doenças degenerativas, como demência e Parkinson, sobreviventes de AVC que ficam com sequelas e necessitam de reabilitação, ou portadores de doenças crônicas, que precisam de acompanhamento mais de perto. Esse perfil de paciente cria demanda e contribui para o crescimento do atendimento domiciliar”, analisa o médico geriatra Leonardo Salgado, presidente do Núcleo Nacional das Empresas de Serviços de Atenção Domiciliar (Nead).

Ele aponta que, em 2020, algumas empresas de atendimento home care chegaram a apresentar crescimento de 35% (novos pacientes). Na média, as 40 empresas associadas ao Nead cresceram 15% no ano passado, comparado a 2019.

Atendimento home care na pandemia

atendimento home care e envelhecimento da população

O setor também sofreu os impactos da pandemia da Covid-19, que colocou diante dessas empresas a urgência de acelerar planos de crescimento para atender ao aumento da demanda pelo serviço. A Domicile Home Care, empresa com sede em Jundiaí, SP, e atuação nacional, por exemplo, viu seu atendimento mensal durante a pandemia crescer de 3.200 pacientes para 3.500. “Foram 300 pacientes a mais em nosso portfólio, todos acometidos pela Covid-19”, relata o médico fisioterapeuta João Paulo Silveira, sócio fundador da empresa. Ocorre que, mesmo depois da alta hospitalar e dependendo da agressividade da doença e do respectivo tratamento a que o paciente foi submetido, alguns precisam de reabilitação com fisioterapeuta, nutricionista, entre outros profissionais da saúde,  para se recuperar de sequelas da covid-19, como perda de massa muscular e força, redução da capacidade pulmonar, sensação de fadiga etc.

Silveira conta, por exemplo, que já em fevereiro de 2020 uma das operadoras de saúde, cliente da empresa contratou uma consultoria chinesa para entender melhor as demandas da pandemia e se preparar: “Tivemos acesso aos estudos dessa consultoria e em parceria com nosso cliente elaboramos protocolos para atendimento da Covid-19. Com isso, foi possível, por exemplo, estabelecer o momento certo da alta dos pacientes acometidos pela Covid-19, com segurança, para que fossem transferidos para o atendimento domiciliar, liberando leitos para os pacientes em fase aguda da doença”.

Apesar de não fazer parte do rol da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e independentemente do cenário da pandemia, cada vez mais as operadoras de saúde oferecem a possibilidade de atendimento home care a seus clientes, como conta Silveira: “Na Domicile Home Care 99% dos pacientes são atendidos por meio de suas operadoras de saúde, o que nos permite oferecer serviços a pessoas de todos os segmentos”.

Não faltam razões para que operadoras de saúde coloquem em suas coberturas a possibilidade do atendimento home care. Sem renunciar à segurança do paciente, uma internação domiciliar pode ficar entre 40% e 60% mais barata do que no hospital. No caso de pacientes particulares, a diária, de acordo com a complexidade do atendimento, pode variar entre R$ 100,00 e R$ 2 mil, na Domicile Home Care. “Com a internação domiciliar, além de liberamos leitos nos hospitais para pacientes com doença aguda e mais graves, o paciente fica em casa, em contato com a família e não corre risco de ser acometido por uma infecção hospitalar”, afirma o sócio fundador da Domicile Home Care.

A jornada do paciente fora do hospital

Além das empresas de atendimento home care já existentes, outros modelos de negócio têm ganhado espaço: as unidades de transição de cuidado, que atuam em um nicho específico entre a desospitalização e o atendimento domiciliar, e o home hospice, conceito relativamente novo no Brasil, que abarca as empresas dedicadas a cuidar de pacientes com limite de vida.

Considerando essas possibilidades, a jornada do paciente pode ter diferentes desenhos. A função do hospital é cuidar do paciente na fase aguda da doença. A partir da alta, ele pode ser encaminhado, conforme avaliação de seu estado de saúde, para uma unidade de transição de cuidado e, depois, liberado para casa com ou sem a necessidade de atendimento home care. Dependendo do caso e da decisão médica em conjunto com a família, o paciente pode contar com serviços de cuidados paliativos de filosofia tradicional ou o home hospice.

O conceito de unidade de transição de cuidados ainda é pouco conhecido e tem muito espaço para crescer no Brasil, acredita o fisioterapeuta Eduardo Santana, fundador e diretor executivo da Nobre Saúde: “Nos Estados Unidos, o número de leitos de transição de cuidados é superior a 1 milhão e aqui no Brasil não ultrapassa 1,5 mil”. A empresa, localizada em Santo André, SP, conta com uma estrutura de 93 leitos, organizada em dois blocos separados, um destinado à reabilitação e outro a cuidados paliativos.

“Esse tipo de unidade atende ao paciente que foi tratado no hospital na fase aguda da doença e, agora, tem prognóstico de mais um período longo de internação antes de ter condições de alta. O paciente pode ser transferido para uma unidade de transição de cuidados, onde receberá todo o atendimento necessário, sem qualquer prejuízo ao que receberia na internação hospitalar. Ao ter alta, ele irá para casa com ou sem indicação de atendimento domiciliar, conforme sua necessidade”, explica Santana. Segundo ele, o objetivo é que o paciente alcance o maior nível de independência possível.

O plano terapêutico do paciente é desenhado pela equipe de saúde em conjunto com a família. O atendimento inclui uma semana de treinamento com a família, com objetivo de que ela esteja preparada para cuidar do paciente em casa, quando ele for liberado. “Fazemos, inclusive, recomendações, quando necessárias, de adaptações da casa da família para receber o paciente”.

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Cuidado com o fim de vida ainda é tabu

Na ponta dessa jornada estão empresas especializadas no conceito do home hospice, focado nos cuidados paliativos – aqueles que buscam o conforto do paciente quando a medicina já não tem como “curar”. A Colo Saúde, fundada em 2019 pela médica Renata Veiga, é uma delas: “Temos nossa vida biológica, que se refere ao funcionamento de nosso corpo, e a vida biográfica, que contempla o que faz sentido para nossa história. Nós privilegiamos a vida biográfica e a decisão do paciente é soberana e respeitada”.

Em um cenário ideal, de acordo com Renata, o home hospice deveria ser procurado tão logo o paciente e a família recebam o diagnóstico de uma doença para a qual não haja prognóstico de cura ou que essa chance seja muito pequena: “Isso nos permite tratar o paciente que poderá viver anos com qualidade de vida, incluindo aspectos físicos e emocionais. Infelizmente o que acontece é que a maioria dos pacientes chega no final da vida quando já não têm autonomia. Reverter esse quadro, fazendo o paciente chegar no momento certo, é um dos desafios do home hospice no Brasil”.

Um desafio que ganha contornos maiores, na avaliação dela, quando o cenário é de um país em que as pessoas vivem, envelhecem e morrem “muito mal”: “As pessoas com mais de 60 anos neste momento pertencem a uma geração que teve mais deveres do que direitos, sem equilíbrio entre o trabalho, família, lazer”. Para a médica, é uma geração que foi deixando para viver quando chegasse à aposentadoria. Mas quando esse momento chegou, muitos ficam doentes, resultado de uma vida que deixou de lado a saúde e o bem-estar.  “Essas pessoas tornam-se pacientes de uma medicina que, apesar de estar dando sinais de mudança, ainda tem o olhar muito voltado para a doença e não para o paciente. Como resultado, temos pessoas que também morrem mal”.

Tecnologia é ponto comum na jornada

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Um aspecto comum entre as empresas de atendimento domiciliar, transição de cuidados e home hospice é o uso da tecnologia. Ela garante a continuidade dos cuidados e a segurança de quem já era cliente e dos novos. Nesse contexto destacam-se as plataformas de telemedicina, que permitem o atendimento a distância por videoconferência, fundamental para evitar o contágio.

Além da possibilidade de fazer uma teleconsulta, uma reunião entre familiares do paciente por videoconferência, envio on-line de receitas e exames, a tecnologia pode oferecer muito mais. Para Salgado, presidente do Nead, quando a tecnologia 5G estiver disponível, o salto em relação ao uso da tecnologia pelas empresas de atendimento domiciliar será maior, com o desenvolvimento de mais soluções e ampliação das possibilidades. Outra tendência para esse setor é a popularização dos wearables, os dispositivos vestíveis, que vão ajudar a monitorar os sinais vitais dos pacientes e eventuais alterações à distância.

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Lídia de Santana

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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