Saúde: qual o grande desafio para 2023?

Saúde: qual o grande desafio para 2023?

A resposta para essa questão é simples, embora a superação

By Published On: 21/12/2022

A resposta para essa questão é simples, embora a superação seja bem mais complexa. Acredito que ninguém discorde de que o grande desafio para a saúde em nosso país é garantir que todas as pessoas tenham acesso e condições de serem tratadas de forma que não existam diferenças entre sistema público e privado. Pode parecer utópico desejar que um paciente do SUS tenha acesso a tratamentos que hoje estão disponíveis apenas para quem tem um plano de saúde ou que um cidadão dos rincões da Amazônia não precise esperar meses e viajar horas de barco para conseguir consulta com um especialista inexistente no local onde mora. Mas Ano Novo é tempo de renovar esperanças e, no campo da saúde, o que esperamos é ter novas lideranças capazes de planejar caminhos inclusivos e sustentáveis, inspirados até mesmo em iniciativas já existentes e que podem ser multiplicadas, pois mostram que equidade em saúde não é utopia.

Trata-se, sim, de algo que pode ser construído com boa gestão dos recursos, cultura de qualidade e segurança que busque sempre o melhor desfecho e evite desperdícios. Além disso, que busque coordenação adequada do cuidado nas várias instâncias de atendimento, o que inclui uma atuação mais robusta e eficaz da atenção primária — que auxilia ter o paciente correto na porta correta e referencia os casos de alta complexidade de forma precoce para tratamento especializado, com melhores desfechos e economia de recursos.

Chamam a atenção os resultados da pesquisa conduzida pelo PoderData a pedido da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) para avaliar a percepção da população em relação aos serviços de saúde oferecidos no Brasil. Quatro em cada 10 respondentes consideram a saúde no país ruim ou péssima e, entre os usuários do SUS especificamente, a grande insatisfação é com a dificuldade de acesso àquilo que é básico: fazer exames e marcar consultas. Em que porta vai bater o paciente que não conseguiu esse básico? Nos hospitais, estruturas que deveriam ser reservadas para casos que realmente demandem cuidados hospitalares.

A distribuição de médicos no país é outro fator antiequidade. A grande maioria dos profissionais está no Sul e Sudeste, concentração ainda mais forte quando se faz o recorte por especialidades. Por exemplo, onde está o maior contingente de cardiologistas, médicos que cuidam das doenças cardiovasculares, principal causa de mortes no Brasil? Está na região Sul-Sudeste, enquanto há regiões no País sem nenhum profissional desta especialidade.

“Sem equidade não há qualidade”, como bem definiu o slogan deste ano da Semana da Qualidade do Einstein, evento em que a organização premia projetos de destaque nessa área, com mais de mil inscritos nesta edição.

Uma das aliadas fundamentais na promoção da equidade é tecnologia, cujo uso precisa ser intensificado.

Recursos de big data, analytics e inteligência artificial transformam dados de saúde em informações que permitem direcionar investimentos não necessariamente para um município ou estado, mas por região que tenha similaridade na demanda.

Já a telemedicina é uma importante ferramenta para romper barreiras logísticas. Um exemplo é o TeleAMES, projeto desenvolvido pelo Einstein no contexto do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS (Proadi-SUS). Por meio dele, mais de uma centena de médicos do Einstein de sete diferentes especialidades (cardiologia, endocrinologia, pneumologia, reumatologia, neurologia adulto, neurologia pediátrica e psiquiatria) prestam atendimento remoto a pacientes de municípios da região Amazônica – lugares com baixo IDH e onde são raros os especialistas médicos. Antes, atendimento especializado só estava disponível em cidades maiores, a centenas de quilômetros de distância ou horas e até dias de viagem de barco. Já são cerca de 190 pontos para os atendimentos remotos dos especialistas do Einstein, sempre intermediados pelo médico local da atenção básica que já acompanha o paciente.  Desde novembro de 2021 quando o projeto teve início, já foram realizadas mais de 60 mil consultas, com um índice de resolutividade de 99%. Além de atendimento qualificado, redução de deslocamentos desnecessários e das filas de espera, o projeto contribui para o aprimoramento dos profissionais locais por meio do intercâmbio de conhecimentos, diretrizes e protocolos.

Gestão eficiente também é receita poderosa para promover equidade. E aqui, vou citar o exemplo do Hospital Municipal de Aparecida de Goiânia – Iris Rezende Machado, cuja gestão foi assumida pelo Einstein em junho de 2022. Desde estão, de acordo com estudo realizado pela Epimed Solutions, especializada em gestão de informações clínicas e epidemiológicas, o número de atendimentos dobrou e o de óbitos caiu pela metade. Foram mais de 1.500 procedimentos realizados nas mais diversas especialidades, incluindo alguns que não estavam disponíveis anteriormente, como os de hemodinâmica (cateterismo, angioplastia) e cirurgia bariátrica.

Esses são apenas alguns exemplos de que caminhos existem e podem inspirar um país que deixa o ano velho com uma área de saúde combalida pelos desinvestimentos, pelos impactos da pandemia, pela desorganização e descuidos que nos trazem tristes marcos, como a baixa taxa de vacinação e a volta de doenças erradicadas. É um Brasil que precisa de doses gigantescas de injeção de equidade em saúde, o que exige um olhar abrangente, numa perspectiva ASG (sigla em português para o termo ESG – Environmental, Social and Governance). Não há saúde sem segurança alimentar, sem condições mínimas de moradia, sem saneamento básico, sem controle da poluição e uma série de outros “sem”. Trocar esses “sem” por “com” requer estratégia com visão integrada, planejamento adequado, capacidade de execução e governança de tudo isso.

Sidney Klajner

Cirurgião do Aparelho Digestivo e Presidente da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein. Possui graduação, residência e mestrado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, além de ser fellow of American College of Surgeons. É coordenador da pós-graduação em Coloproctologia e professor do MBA Executivo em Gestão de Saúde no Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa do Einstein. É membro do Conselho Superior de Gestão em Saúde, da Secretaria de Saúde do Estado de S. aulo e coautor do livro “A Revolução Digital na Saúde” (Editora dos Editores, 2019).

About the Author: Sidney Klajner

Cirurgião do Aparelho Digestivo e Presidente da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein. Possui graduação, residência e mestrado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, além de ser fellow of American College of Surgeons. É coordenador da pós-graduação em Coloproctologia e professor do MBA Executivo em Gestão de Saúde no Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa do Einstein. É membro do Conselho Superior de Gestão em Saúde, da Secretaria de Saúde do Estado de S. aulo e coautor do livro “A Revolução Digital na Saúde” (Editora dos Editores, 2019).

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

Sidney Klajner

Cirurgião do Aparelho Digestivo e Presidente da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein. Possui graduação, residência e mestrado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, além de ser fellow of American College of Surgeons. É coordenador da pós-graduação em Coloproctologia e professor do MBA Executivo em Gestão de Saúde no Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa do Einstein. É membro do Conselho Superior de Gestão em Saúde, da Secretaria de Saúde do Estado de S. aulo e coautor do livro “A Revolução Digital na Saúde” (Editora dos Editores, 2019).