Consumo de ultraprocessados custa R$10 bilhões por ano ao país por mortes e doenças associadas, segundo Fiocruz 

Consumo de ultraprocessados custa R$10 bilhões por ano ao país por mortes e doenças associadas, segundo Fiocruz 

Custo é de R$9,2 bilhões por ano com perda de produtividade associada a mortes prematuras e de R$933,5 milhões no SUS, com hospitalizações, procedimentos ambulatoriais e farmácia popular.

By Published On: 25/11/2024
consumo de ultraprocessados

Foto: Adobe Stock Image.

O consumo de alimentos ultraprocessados pela população brasileira causa um alto impacto no sistema de saúde brasileiro e na economia do país. Um estudo da Fiocruz e Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens/USP), a pedido da ACT Promoção da Saúde, divulgado na quinta-feira, 21, revela que doenças e mortes provocadas pelos ultraprocessados custam R$10,4 bilhões por ano aos cofres públicos. O gasto abrange mortes prematuras, custo com tratamentos e custos previdenciários.

Desse montante, R$9,2 bilhões de custos são gerados pela perda de produtividade econômica por mortes prematuras associadas aos ultraprocessados. Além disso, o custo ao Sistema Único de Saúde (SUS) é de R$933,5 milhões, em hospitalizações, procedimentos ambulatoriais e farmácia popular. E gasta-se R$263,2 milhões por ano com custos previdenciários e absenteísmo, que é a ausência do trabalhador no emprego.

A análise foi feita a partir de dados de mortalidade por causa do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do SUS, de 2019, e dados econômicos obtidos pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2017. Ela considera gastos federais com três doenças crônicas associadas ao consumo de ultraprocessados mais prevalentes no Brasil: a obesidade, o diabetes tipo 2 e a hipertensão. Segundo o pesquisador da Fiocruz Eduardo Nilson, responsável pelo estudo, os números revelam a carga epidemiológica dessas doenças, o que envolve mortes, adoecimento e, também, os custos para os cofres públicos com gastos com saúde. Os dados são, apenas, da população adulta do país.

Priscila Diniz, coordenadora técnica da ACT Promoção da Saúde, que atua em advocacy para políticas públicas, diz que “O custo dos ultraprocessados envolve o SUS, mas também tem um impacto na economia, com absenteísmo de pessoas que adoecem, que morrem prematuramente”.

O estudo detalha a quantidade de mortes precoces associadas ao consumo de ultraprocessados por região do país. Em 2019, foram 57 mil mortes precoces em todo o Brasil, o que representa 10,5% das mortes totais desse ano. Em sete regiões brasileiras, a proporção de mortes ultrapassa essa média nacional. São eles: Rio Grande do Sul (13%), Santa Catarina (12,5%), São Paulo (12,3%), Distrito Federal (11,7%), Amapá (11,1%), Rio de Janeiro (10,9%) e Paraná (10,7%).

A pesquisa é a segunda análise sobre custos de produtos nocivos à saúde, realizada pela Fiocruz a pedido de entidades parceiras. Estudo anterior, divulgado no início do mês, analisou os custos aos cofres públicos gerados pelo consumo de álcool. As análises foram lançadas no âmbito das discussões da Reforma Tributária, que propõe um Imposto Seletivo (IS) sobre o álcool e produtos ultraprocessados para diminuir seu consumo.

O consumo de ultraprocessados no Brasil 

Os alimentos ultraprocessados são produtos formulados com substâncias derivadas de alimentos, como aditivos ou corantes. Com adição de açúcares, sal e gorduras, eles têm a característica de serem altamente palatáveis e atrativos, ao mesmo tempo em que não possuem valor nutricional. De acordo com os dados da última Pesquisa de Orçamento Familiares (POF), realizada entre 2017 e 2018, cerca de 19,7% de todas as calorias ingeridas pelos brasileiros eram provenientes desses alimentos.

O consumo de ultraprocessados se deve por uma série de fatores, entre eles, o preço baixo, segundo relata Nilson. “Não quer dizer que comer saudável seja mais caro, mas o consumo de ultraprocessados tem relação com seu preço acessível. Por isso, é tão importante olhar a reforma tributária como uma das políticas estratégicas para diminuição do seu consumo”, pontua o estudioso. Segundo ele, a publicidade e fácil acessibilidade em escolas e cantinas, que criam uma cultura de consumo favorável a alimentos prejudiciais à saúde. Uma pesquisa recente da Faculdade de Medicina da USP, publicada na revista científica “Cadernos de Saúde Pública”, mostrou que estudantes de sete entre dez escolas de São Paulo tinham fácil acesso a ultraprocessados, vendidos por estabelecimentos nas redondezas.

Diante desse contexto, algumas medidas têm tentado frear o consumo desses produtos ou, pelo menos, torná-lo mais consciente. Esse é o caso da rotulagem dos alimentos nos supermercados com alertas para alimentos com alto índice de sódio e açúcar, implementada em outubro de 2023. Para Nilson, apesar de ser um avanço, a rotulagem poderia trazer ainda mais informações ao consumidor sobre ultraprocessados. “O Chile, por exemplo, traz outros marcadores para identificar ultraprocessados, como a presença de edulcorantes ou aditivos cosméticos, o que poderia ser usado aqui também”, exemplifica.

O Guia Alimentar, que completa dez anos em 2024, é outra iniciativa que trouxe avanços na conscientização para a população e tomadores de decisão sobre uma alimentação saudável. “Ele alcançou boa parte dos brasileiros, mas precisa avançar mais”, avalia Nilson. Para ele, ainda falta repensar à luz do guia determinadas políticas públicas de alimentação, como a regulação de publicidade de alimentos infantis.

 

Políticas de promoção de alimentos saudáveis

A regulamentação da Reforma Tributária é a principal medida recomendada pelo estudo como uma estratégia ganha-ganha para diminuição do consumo de ultraprocessados e seus impactos para a saúde da população e para os cofres públicos do país. Além de tributar alimentos prejudiciais à saúde, a reforma pode custear a desoneração tributária de alimentos mais saudáveis e sustentáveis. Segundo os especialistas, outras políticas a nível local que forneçam acesso a alimentos saudáveis para grupos vulneráveis também podem ser discutidas. “Escolhas alimentares saudáveis só vão se dar no ambiente que promove a escolha saudável, que tem disponibilidade daquele alimento”, avalia Nilson.

Priscila Diniz, da ACT Promoção da Saúde, também cita o fomento da alimentação saudável como uma alternativa para redução de consumo de ultraprocessados, junto com políticas regulatórias. E os municípios podem ter um papel importante nesse sentido. “Temos exemplos recentes do Rio de Janeiro e de Niterói que sancionaram leis que regulam o ambiente escolar, proibindo ultraprocessados, e alguns estudos mostram que isso tem algum impacto”. Ela lembra que políticas locais de tributação de alimentos ultraprocessados devem ser extintas com a reforma tributária, que unifica os tributos de alimentos, mas acredita que a estratégia de favorecer determinada cadeia de produção em detrimento de outras pode ser aplicada no nível territorial nacional à favor da saúde. 

Ainda assim, cada estado pode pensar em estratégias próprias para incentivar uma alimentação saudável. Estocagem de alimentos, investimentos em logística para pequenos circuitos de produção e venda de produtos alimentares, como feiras livres, estão entre algumas das alternativas citadas por Diniz.

 

Isabella Marin Silva
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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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