Qualidade e segurança precisam ser contempladas na formação dos profissionais de saúde
Qualidade e segurança precisam ser contempladas na formação dos profissionais de saúde
A aplicação de ferramentas de qualidade e segurança no atendimento
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A aplicação de ferramentas de qualidade e segurança no atendimento à saúde é um exemplo de como as instituições estão atuando cada vez mais com foco no paciente e na transparência de suas atividades – o que leva à confiabilidade, menos falhas e melhores desfechos. Há diversas estratégias para esse aprimoramento contínuo, mas como a medicina é ainda uma atividade muito ligada à ação humana, é preciso investir na formação e capacitação dos profissionais.
Em 2011, a Organização Mundial da Saúde (OMS) instituiu um guia curricular multiprofissional focado em segurança do paciente para auxiliar instituições de ensino a criar um currículo que levasse ao mercado profissionais mais preparados. A atenção com o tema se justifica: segundo dados de 2019 da entidade, os cuidados de saúde não seguros resultam em 2,6 milhões de mortes por ano em países de baixa e média renda, sendo que a maior parte desses óbitos poderiam ser evitados. Esse é um dos elementos que faz com que segurança, qualidade e mitigação de erros sempre figurem entre os desafios globais que a OMS estabelece de tempos em tempos.
Outra instituição internacional, o Institute for Healthcare Improvement (IHI), referência em qualidade e segurança no mundo, também está atenta ao assunto. A organização, inclusive, já aponta indicadores: uma instituição com até 4 mil colaboradores deveria contar com pelo menos 15 profissionais especialistas em projetos de melhorias.
Para ajudar na formação desses profissionais, o IHI atua em diversas frentes. Uma é a por meio de uma plataforma chamada Open School, que oferece conteúdo online e gratuito – alguns traduzidos para outros idiomas, como o português – que estimulam os profissionais a ter uma formação diferenciada nesse aspecto. Outra é um programa de fellowship focado em qualidade e segurança, que hoje é o nível máximo de especialização no tema.
E uma terceira frente é um curso de especialista em Modelo de Melhoria, desenvolvido pelo IHI, que visa capacitar especialistas para lidar com o tema da qualidade e segurança dentro das organizações, pensando em projetos e aplicando soluções de forma constante.
Formação em qualidade e segurança no Brasil
O Einstein está engajado em formar os seus especialistas – já são 65 –, e trouxe para o Brasil o programa de formação do IHI, que está em seu oitavo ciclo. “Já foram capacitados 250 especialistas no Brasil. Mas é preciso muito mais, se considerarmos as proporções continentais do país”, avalia Fernanda Paulino Fernandes, gerente de Qualidade e Segurança do Paciente da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein.
Trata-se de um tipo de capacitação complexa, mas com retorno expressivo. “É preciso considerar todos os retornos dos processos implementados a partir dele. Nós mensuramos os impactos e em um ano chegamos a resultados que indicam um retorno de mais de 230% do valor investido, considerando a mitigação de erros, que tornaram possível evitar condições adversas e preservaram a vida de mais de 300 pacientes”.
Uma das metas do Einstein é que os profissionais formados e especializados em qualidade e segurança tenham a função não só de pensar projetos de melhoria dentro da organização, mas também disseminar os conteúdos vivenciados e as boas práticas da qualidade e segurança para que cheguem a cada vez mais espaços dentro das instituições espalhadas pelo país.
“O Einstein tem a capacitação em forma de pirâmide: antes mesmo de ingressar no sistema, a parte de ensino já adota um currículo que traz todas essas competências. Quando o profissional entra na organização, ele conta com diferentes treinamentos e, na minha área, que analisa os eventos adversos, nós identificamos diversas oportunidades de capacitação e treinamento. Entendemos que o investimento no profissional de saúde é necessário para dar conta de um sistema que não contempla tudo o que é preciso na maioria das escolas formadoras e é preciso estar sempre aprendendo. É uma formação contínua”, avalia Fernanda.
Inspiração na aviação
A instituição também oferece tríades específicas de conhecimento, que já formaram mais de 350 profissionais, e treinamentos que contam com simulações realistas, possibilitadas pelo sistema Health Crew Resource Management (HCRM), que simula situações reais que requerem habilidades técnicas e não-técnicas para serem resolvidas.
O HCRM é derivado da aviação (CRM), um setor que também precisa ser altamente confiável por lidar com vidas diariamente e que conseguiu chegar a um índice de acidentes com morte muito baixo, se tornando um modelo a ser seguido, como ressalta Fernanda.
“A aviação hoje é o transporte mais seguro do mundo. A mesma coisa acontece na indústria. É um cenário que se modificou. Mas quando fazemos a analogia com essas instituições, precisamos lembrar que a grande diferença desses setores para a saúde é o nível de tecnologia que pode ser empregado. Tanto a aviação quanto a indústria chegaram a um nível bastante alto de automação de sistemas e processos e, na saúde, o cuidado ainda é – e seguirá sendo, pelo menos por algum tempo – extremamente humano-dependente”.
Ela lembra que a segurança do paciente passou a ser foco de atenção das organizações em 1999, quando foi publicado o documento Errar é Humano, do Institute of Medicine, que tinha como objetivo quebrar o ciclo da passividade em relação aos eventos adversos realizados pelos profissionais de saúde: “Essa publicação trouxe insegurança às instituições, porque as estatísticas apontavam que os eventos adversos na época causavam mais mortes do que patologias graves, como o câncer, causando muita comoção”.
Fernanda também cita um estudioso do erro humano, James Reason, que é o autor da Teoria do Queijo Suíço – uma forma de explicar como as falhas acontecem em sistemas complexos. Ele compara os acidentes como se fossem um grande pedaço de queijo separado em fatias: cada fatia representa uma barreira a erros, que pode ser a infraestrutura, sistemas, tecnologias e recursos, e os buracos encontrados no queijo são as falhas dentro desses processos e falhas humanas.
“Quando um buraco se liga ao outro, as falhas passam pelas barreiras e o acidente acontece, justamente porque há fragilidade nos processos, além da fragilidade humana. É preciso lembrar que o profissional pode ser uma vítima desse sistema. Os processos precisam ser robustos para garantir que o correto seja feito. Mas os profissionais também precisam ter acesso a conhecimento e ferramentas para que a sua parte seja feita com o mínimo de falhas possível”, diz Fernanda. “Não é à toa que adotamos uma série de estratégias para fortalecer o fator humano, porque ele é o nosso bem maior. Não tem instituição boa sem bons profissionais”.
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NATALIA CUMINALE
Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.