ESG na saúde começa a ser visto como pilar estratégico no setor
ESG na saúde começa a ser visto como pilar estratégico no setor
As práticas de ESG na saúde (sigla em inglês para ambiental, […]
As práticas de ESG na saúde (sigla em inglês para ambiental, social e governança corporativa) fazem cada vez mais parte da agenda das empresas. Hospitais, operadoras e seguradoras da área, farmacêuticas e provedores de serviços têm adotado soluções com o objetivo de impactar positivamente o planeta e a vida de funcionários, clientes e sociedade como um todo.
Das três letras, atualmente o foco está no social, como aponta pesquisa desenvolvida pelo Health Research Institute (HRI), da consultoria global PwC, no final do ano passado. Intitulado de “ESG para organizações de saúde”, o trabalho analisou os esforços de 45 prestadoras de serviços e 32 organizações farmacêuticas e de biociências, a fim de avaliar como elas estão incorporando as práticas em sua gestão.
Em relação ao primeiro grupo, o HRI analisou os comunicados enviados à imprensa e encontrou 212 menções de metas com o pilar social, em comparação com apenas cinco de meio ambiente e três de governança. No segundo grupo, das indústrias farmacêuticas e de biociências, 77% dos comunicados à imprensa analisados abordaram prioridades relacionadas a questões sociais, 12% trataram de iniciativas ambientais e 11% de governança. Dentre as ações citadas estão expansão do acesso à saúde para comunidades carentes, programas de diversidade e inclusão, neutralidade de carbono, gestão de resíduos, políticas de compliance e fraude, e equidade salarial.
“Os investimentos em ESG na saúde se tornaram uma realidade. Antigamente, a maioria das empresas publicava um relatório de sustentabilidade e pronto. Hoje não, é mais do que isso. Vemos avanços significativos no mundo todo, que foram acelerados após o início da pandemia. Mas a pesquisa mostra que ainda há espaço para melhorar, através da ampliação de lideranças para pensar e estruturar essa área dentro das organizações”, aponta Bruno Porto, sócio da PwC Brasil.
ESG nos hospitais privados brasileiros
Nos hospitais privados, a aplicação das boas práticas ambientais, sociais e de governança começam a serem mensuradas e a trazer resultados. Em março, a Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) lançou a publicação “ESG nos hospitais Anahp: resultados e boas práticas”, que reúne 193 projetos descritos por 42 instituições associadas à entidade, de diferentes regiões do país. As iniciativas tratam de temas como consumo responsável, educação, saneamento, energia, combate à fome e às alterações climáticas, melhorias na qualidade do emprego e incentivo à inovação.
De acordo com o documento, os investimentos em ESG realizados pelos hospitais associados ultrapassaram R$ 119,6 milhões e beneficiaram direta e indiretamente mais de 4,2 milhões de pessoas. Os estados mais impactados foram São Paulo, Rio Grande do Sul, Bahia, Minas Gerais, Distrito Federal, Paraná, Mato Grosso e Rio de Janeiro.
Para Antonio Britto, diretor executivo da Anahp, as empresas têm avançado, globalmente, para uma mentalidade de ESG cada vez menos isolada de seus negócios. “É fundamental acreditar que cada instituição é também agente transformador da sociedade, além de ter uma função econômica. A qualidade vai além de processos bem estruturados e adequados. Temos obrigações com a governança, a sustentabilidade do setor como um todo, com o impacto que temos no meio ambiente e, acima de tudo, além de salvar vidas de pacientes, precisamos olhar para a sociedade em que estamos inseridos de forma macro”.
Danilo Maeda, head da Beon, consultoria especializada em estratégias de ESG, complementa que já passou o momento em que atuar em uma área de claro impacto social positivo era o bastante. Segundo ele, agora, a preocupação também inclui o “como” esse impacto é produzido, com um olhar para os efeitos colaterais do processo de geração de valor.
“Esse movimento tem origem na pressão de stakeholders críticos para as organizações, como investidores, clientes e funcionários, além da perspectiva de eventuais regulamentações. Como tendência importante, apontaria a conexão entre os temas da agenda ESG e a lógica de prevenção e promoção da saúde. Um exemplo bem direto disso é o caso de populações expostas a mudanças importantes nos regimes de chuva, a temperaturas extremas ou a eventos climáticos como enchentes e secas, que devem se tornar mais frequentes”, indica o executivo.
Visão da liderança sobre ESG na saúde
Outro trabalho realizado pela PwC e divulgado no início de fevereiro deste ano corrobora a tese de que ainda há espaço para intensificar iniciativas em ESG. A 25ª edição da Pesquisa Anual Global com CEOs, que ouviu mais de 4.400 líderes em 89 países, incluindo o Brasil, e teve um recorte especial dedicado ao setor, revelou que as métricas de negócios das companhias ainda estão mais integradas às estratégias e ao plano de remuneração variável do que ao ESG na saúde.
Por exemplo, enquanto a maioria dos CEOs consultados relataram desenvolver ações de longo prazo para melhorar os índices de satisfação do cliente (74%), de engajamento de empregados (66%) e as metas de automação e digitalização (59%), somente 42% disseram fazer o mesmo em relação à representação de gênero, 30% em relação à emissão de gases do efeito estufa e 21% em relação à representação de raça e etnia.
“O ESG precisa estar incorporado às estratégias do negócio, isso é fundamental para a sua continuidade. Cada vez mais temos visto empresas e investidores indo em direção a quem adota práticas sustentáveis focadas no planeta e nas pessoas. E a sociedade também exige isso”, analisa Bruno Porto.
ESG na saúde pode potencializar resultados
Na área de medicina diagnóstica, Milva Pagano, diretoria executiva da Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed), confirma que as práticas ambientais, sociais e de governança estão se consolidando no dia a dia das organizações: “Muitos laboratórios associados já estão trilhando esse caminho há alguns anos. Existem empresas em diferentes graus de maturidade e estágios de implementação”. O assunto ganhou tamanha relevância no setor que a entidade até criou um Comitê de ESG em novembro do ano passado. “Os objetivos incluem permitir a troca entre os associados, trazer melhores práticas e incentivá-los a terem uma atuação sólida, efetiva e não só como marketing”, complementa.
Na visão dela, um dos pontos mais importantes da adoção dos pilares ambiental, social e governança corporativa é tornar os negócios mais competitivos e melhorar a qualidade de entrega do paciente. “Um estudo realizado por pesquisadores de Harvard, Oxford, London Business School e outras instituições apontam que em 10 anos as empresas que já trabalham com isso terão seus resultados fortemente potencializados. Se a estratégia for de fato genuína, todos ganham: a saúde, o paciente, o cidadão, a sociedade”, analisa.
Mas há ainda outras vantagens de se adotar a política de ESG na saúde: melhor controle financeiro e fiscal, retenção e atração de talentos, melhora da imagem junto à investidores, fornecedores, funcionários e clientes e possibilidade de criação de novos produtos, serviços e até modelos de negócios.
Visão de ESG em hospitais e farmacêuticas
O grupo de inteligência de mercado Alva preparou um levantamento para o portal Fierce Pharma, no ano passado, que identificou as 10 farmacêuticas que melhor praticam ESG no mundo, de acordo com padrões estabelecidos pelo Sustainability Accounting Standards Board (SASB). A lista foi composta, na ordem de classificação, por Boehringer Ingelheim, Biogen, Astellas, Novo Nordisk, Novartis, Amgen, Gilead, Bayer, Roche, Sanofi e Takeda – essas duas empataram na décima posição.
No caso da número 1 do ranking, Marc Hasson, presidente da Boehringer Ingelheim no Brasil, conta que investir em ESG sempre fez parte dos valores, e que, em todo o mundo, a Boehringer Ingelheim tem evoluído a jornada de desenvolvimento sustentável, com o objetivo de gerar impacto positivo para a sociedade e deixar um legado:
“Entendemos que as organizações devem ajudar a construir um novo modelo de sociedade, pois dispõem de recursos, conexões e influência, elementos essenciais para liderar a transformação. É papel delas promover e catalisar iniciativas que gerem benefícios para o coletivo”.
Dentre as ações de destaque da empresa estão a contribuição com a saúde dos pacientes por meio de parcerias e políticas públicas que promovam acesso ao diagnóstico e ao tratamento, zerar as emissões de CO2 das operações no Brasil até 2040 e ampliar o impacto das ações afirmativas de respeito à diversidade e promoção da inclusão.
Também em 2021, a empresa de investimento XP e o banco BTG Pactual divulgaram levantamentos em que evidenciaram as companhias brasileiras do setor que têm se sobressaído quando o assunto é ESG na saúde.
Entraram nas listas instituições como Rede D’Or São Luiz, NotreDame Intermédica, Grupo Fleury, da Sulamérica e OdontoPrev. Ingrid Cicca, gerente de sustentabilidade da Rede D’Or São Luiz, reforça que as organizações dependem disso para se manterem sustentáveis e perenes: “Hoje, o mercado demanda e a sociedade está atenta a essas questões. A empresa que foca só no lado econômico não consegue se manter ao longo do tempo”. Ela lembra que a Rede D’Or São Luiz iniciou sua jornada ESG em 2015 com a criação de uma Política de Sustentabilidade e a publicação do seu primeiro Relatório de Sustentabilidade. A partir daí, o tema foi ganhando relevância na estratégia do negócio.
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NATALIA CUMINALE
Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.