Envelhecimento e doenças crônicas: prevenção é bem-vinda, mas quem já vive com alguma condição precisa de acolhimento

Envelhecimento e doenças crônicas: prevenção é bem-vinda, mas quem já vive com alguma condição precisa de acolhimento

Ampliação de diálogo entre os diversos players tem ocorrido, mas acesso, saúde mental e escassez de médicos especialistas ainda são desafios

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By Published On: 10/04/2024
Envelhecimento e doenças crônicas - Novo Nordisk

Foto: Adobe Stock Image

O envelhecimento populacional, antes visto como um fator relevante para os países mais desenvolvidos, atingiu o status de fenômeno global nas últimas décadas. Em 2030, uma em cada seis pessoas no mundo terá 60 anos ou mais, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS). No Brasil, dados do Censo 2022, do IBGE, mostram que o número de idosos no país cresceu 57,4% em 12 anos. Só que no campo das doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), o envelhecimento adquire outro status, uma vez que a idade é, por si só, um fator de risco. O cenário tem feito com que sistemas públicos e privados no mundo todo busquem formas de lidar com novas demandas e repensem estratégias, políticas públicas e modelos de negócio.

Hipertensão, diabetes, problemas cardiovasculares, demências e até mesmo câncer são doenças cuja incidência está altamente relacionada à idade. De acordo com dados da última Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), 75,4% dos entrevistados com 60 anos ou mais declararam fazer uso regular ou contínuo de algum medicamento receitado por um médico, justamente por apresentar alguma condição de saúde.

Diante do quadro desafiador, as atenções se voltaram para a prevenção, estratégia que vem sendo amplamente implementada na saúde como um todo. Mas como envelhecem aqueles que têm uma doença crônica? Para Leonardo Pinto, gerente nacional de acesso ao mercado da Novo Nordisk, tanto o sistema público quanto o privado apresentam lacunas no que diz respeito ao acolhimento desse paciente:

“O envelhecimento populacional traz consigo um aumento de demandas pelos tratamentos. E é uma demanda para a qual o nosso sistema de saúde ainda não está preparado. Existem movimentos tanto no SUS quanto na saúde suplementar com foco em prevenção. É algo, portanto, que tem potencial de beneficiar as novas gerações, mas a atual, que já tem um quadro de obesidade instalado, não vai ter essa assistência.”

Ele explica que, no SUS, já existe um PCDT que promove mudanças comportamentais e dietéticas, enquanto na saúde suplementar a ANS tem se esforçado para estimular investimentos em atenção primária – mas ainda com baixa adesão pelas operadoras. Pinto destaca também que, para ambos os setores, a única intervenção de cobertura obrigatória, caso o paciente não tenha sucesso na perda e no controle de peso, é a cirurgia bariátrica. “Existe, portanto, uma lacuna a ser preenchida com tratamentos para pacientes com obesidade”, completa.

Lacunas no acolhimento

Além dos agravos das doenças crônicas por si só, o envelhecimento traz também a demanda de cuidados em outras esferas, relacionadas a fatores como limitação da funcionalidade. De acordo com a PNS de 2019, 3,3 milhões de pessoas com mais de 60 anos relataram não conseguir ou ter grande dificuldade em realizar as atividades diárias. Segundo Leonardo Oliva, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), o acompanhamento do paciente que está envelhecendo com alguma doença crônica é fundamental para reduzir os riscos, por exemplo, de perda de mobilidade.

“A gente sempre fala em hábitos de vida saudável para prevenção, mas aqueles indivíduos que já têm hipertensão, diabetes, dislipidemia, obesidade, precisam mais ainda de escolhas de vida que tragam saúde: se alimentar bem, praticar atividade física de forma saudável, manter o peso adequado, não fumar, controlar o estresse”, defende o vice-presidente. “Para quem tem uma doença crônica, esses hábitos são ainda mais importantes para evitar os desfechos que ela traz, para prevenir a perda da funcionalidade decorrente de um acidente vascular cerebral (AVC), um infarto, que vai trazer consequências na qualidade de vida desse paciente. Além de evitar o desfecho mais grave, que é o óbito.”

A prática de atividade física, embora seja grande aliada na melhora da qualidade de vida e recomendada por órgãos e profissionais de saúde, esbarra nos obstáculos da vida moderna, seja pela falta de tempo ou pela ausência de espaços devidamente estruturados. Um estudo realizado pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) identificou que quanto maior a idade, menor a prática de atividade física. A renda dos idosos avaliados também refletiu no resultado: pessoas com 80 anos ou mais na faixa de maior renda eram mais ativos do que aqueles de 60 a 64 anos nas faixas de renda inferiores.

“O acesso à atividade física é muito desigual”, aponta Milton Crenitte, diretor técnico do Centro Internacional de Longevidade Brasil (ILC-BR) e consultor em longevidade da Unesco no Brasil. “A gente precisa de centro de práticas de atividade física, que promovam essa integração da pessoa idosa da comunidade. Promover isso nos espaços das Unidades Básicas de Saúde, nos centros esportivos das prefeituras. Isso é pensar na participação social e no empoderamento da pessoa idosa. Mas é importante lembrar que tudo isso exige financiamento.”

Ampliação do diálogo entre setores

Convidar pessoas idosas a falarem sobre suas próprias demandas é uma das estratégias que tem sido adotada em diversas iniciativas. O próprio Centro Internacional de Longevidade atua com a missão de destacar a produtividade e as contribuições dos idosos para a sociedade como um todo, estimulando o desenvolvimento de ideias, pesquisas e criação de fóruns locais focados na participação ativa da população idosa. A necessidade de integrar e empoderar a pessoa idosa através da criação de redes de apoio, de laços com a comunidade e respeitar a individualidade de cada um no processo de envelhecimento é consenso entre os especialistas.

“Temos que estimular a valorização do indivíduo idoso na sociedade. Os grandes sítios de longevidade do mundo deixam claro que, quando a pessoa idosa é integrada à comunidade, ela tem uma qualidade de vida e uma capacidade de se manter bem muito maior do que se for excluída. Só assim conseguimos tornar o momento de vida dela o melhor possível”, argumenta Oliva, da SBGG.

Mas os especialistas apontam que é preciso ir muito além: para garantir um envelhecimento digno para a população, é necessário que haja um financiamento adequado do SUS, capaz de cobrir as ações de promoção, prevenção e proteção da saúde. Além disso, a pauta de envelhecimento e doenças crônicas não deve se restringir aos órgãos e pastas de saúde, mas incluir outros agentes no debate. Já há movimentações recentes nesse sentido, tanto no âmbito público quanto no privado, acredita Leonardo Pinto, da Novo Nordisk.

Para ele, os gestores de saúde, operadoras de planos e players da indústria estão mais abertos a dialogarem com o aumento de demandas para todos. Ele destaca os modelos de aquisições via consórcios, que surgem como alternativa para diminuir o preço de medicamentos adquiridos pelo SUS, enquanto na saúde suplementar há novos modelos de contratação, além de um momento de aquisições e verticalização das operadoras para reduzir custos. Na esteira da colaboração entre players, a indústria também assume um novo papel.

“Nós não queremos apenas entregar caixas de medicamentos. Um novo olhar da indústria farmacêutica tem sido o de se colocar em uma condição de corresponsável pelo atingimento dos desfechos clínicos da população proposta, com impacto direto em resultados econômicos”, afirma o gerente nacional de acesso ao mercado da farmacêutica. “O processo não acaba na incorporação de novas tecnologias e tratamentos. Precisamos ter programas de acompanhamento associados, trazer outros players para realizar o monitoramento desse paciente. Isso não traz apenas benefício clínico, traz também um benefício econômico para o sistema como um todo.”

Olhar para a saúde mental no envelhecimento

Em meio a isso tudo há ainda a questão da saúde mental da população idosa, tema pouco discutido quando o assunto é envelhecimento. A falta de valorização social e a perda dos laços familiares e comunitários são pontos que afetam o lado mental e que podem ter relação com desfechos da saúde física – o próprio Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), agência norte-americana de saúde, destaca a correlação de transtornos mentais e riscos cardiovasculares.

E, mais uma vez, a questão do acesso volta à tona. O Panorama da Saúde Mental, do Instituto Cactus, entrevistou 2.248 pessoas entre janeiro e fevereiro de 2023, das quais 16,5% tinham entre 60 e 100 anos. O levantamento revelou que apenas 2% das pessoas dessa faixa relataram fazer terapia, a menor taxa entre todas as faixas etárias. “O acesso à psicoterapia no Brasil ainda é limitado devido ao valor, disponibilidade e acesso a esse tipo de serviço”, avalia Mariana Rae, mestre em saúde pública pela Universidade de Harvard e coordenadora de projetos no Instituto Cactus.

Para ampliar esse acesso, segundo ela, é importante pensar em ações integradas, aumentando os ambientes e diversificando os profissionais que podem auxiliar as pessoas neste processo, incluindo agentes comunitários e profissionais de saúde básica. “Também é necessário continuar combatendo o estigma em relação à saúde mental para que as pessoas se sintam cada vez mais confortáveis e confiantes em dialogar sobre esse tema.”

Atribuir indiscriminadamente toda e qualquer condição ao envelhecimento é uma postura ainda associada ao estigma da pessoa idosa, que constantemente tem sua individualidade invisibilizada. Oliva, da SBGG, acredita que “a ideia de que determinadas situações são próprias do envelhecimento é um reflexo do etarismo – preconceito baseado na idade. É a crença de que a pessoa está tendo falhas de memória porque está velha, está triste e sem energia por causa da idade, está sentindo dor como consequência do envelhecimento”.

Segundo ele, a partir do momento em que se atribui algumas questões de saúde à idade, o cuidado com essas pessoas é negligenciado: “Se eu percebo que aquilo é uma doença que sim, é mais prevalente com a idade, mas não está relacionada ao envelhecimento em geral, eu tenho a possibilidade de ir em busca do melhor tratamento, de oferecer uma qualidade de vida melhor para esse paciente.”

Desigualdades e acesso

O fator socioeconômico e as particularidades da América Latina e do Brasil tornam todos esses desafios do envelhecimento ainda mais difíceis, uma vez que a desigualdade social impacta na maneira como cada indivíduo envelhece. Mas não é um ponto exclusivo da região. Segundo o relatório da “Década do Envelhecimento Saudável, 2021-2030”, projeto de colaboração entre diferentes países, setores e agentes encabeçado pelas ONU, 80% da população idosa global estará vivendo em países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos até 2050.

“Uma peculiaridade do Brasil é que, ao mesmo tempo em que a nossa população envelhece e passamos a lidar com problemas de saúde relacionados a países mais desenvolvidos, como demências e câncer, temos que enfrentar doenças e questões de países em desenvolvimento, como dengue, falta de saneamento básico, insegurança alimentar e desnutrição”, analisa o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia.

O mesmo estudo do IEPS também registrou a proporção do impacto socioeconômico sobre a saúde da população idosa. O levantamento aponta que entre idosos de 80 anos ou mais, que fazem parte dos 20% da população com maior renda, 52% possuem um estado de saúde bom ou muito bom. Já na parcela de menor renda, essa proporção é de apenas 35% entre idosos de 65 a 69 anos.

Para Milton Crenitte, consultor em longevidade da Unesco no Brasil, os recortes de raça, gênero, realidade econômica e sexualidade devem ser levados em consideração ao traçar políticas de saúde pública para a população mais velha: “O envelhecimento de um homem branco e rico vai ser muito diferente do de uma mulher negra. É muito importante abordar esses recortes, porque senão a gente só vai lembrar de uma forma de envelhecimento. Temos que olhar para as populações vulneráveis, pessoas negras, LGBTQIA+, pessoas com deficiência.”

Desafios do presente e do futuro

Outra demanda que surge com os desafios do envelhecimento populacional é a própria formação médica especializada, uma vez que o país vive uma intensa escassez de geriatras. A falta de profissionais foi pauta da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, da Câmara dos Deputados, no início de 2023. Enquanto a OMS recomenda um geriatra para cada mil idosos, a proporção brasileira atual é de um profissional para cada 12 mil.

“Quando a gente fala em atendimento da população idosa, é um atendimento que exige uma qualificação ainda maior porque não é fácil atender o idoso. É mais complexo, tem muitos detalhes em minúcias que exigem conhecimento específico”, complementa Oliva.

Ainda que a tecnologia aliada aos dispositivos médicos seja a grande promessa para acompanhar o paciente crônico com mais de 60 anos, levará tempo até que essa visão de um futuro conectado chegue a todos que precisam. E ainda assim, ter profissionais de saúde qualificados será imprescindível.

Mais do que isso, segundo os especialistas, é preciso incluir a própria população idosa no debate público sobre a criação de políticas públicas, para que as estratégias de prevenção e acolhimento a longo prazo casem com a necessidade real desse público. “É escutar essa pessoa idosa. Só assim ela vai nos ouvir também. Quando estamos num diálogo, pressupõe-se que tenham duas pessoas se escutando e conversando. E se a gente for fazer políticas públicas para as pessoas idosas, que seja com as pessoas idosas participando”, espera Crenitte.

Este conteúdo faz parte de uma série de reportagens sobre desafios e tendências das doenças crônicas não transmissíveis produzida em conjunto com a Novo Nordisk. Para acessar os demais, acesse a página especial.

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Isabelle Manzini

Graduada em jornalismo pela Faculdade Paulus de Tecnologia e Comunicação. Atuou como jornalista na Band, RedeTV!, Portal Drauzio Varella e faz parte do time do Futuro da Saúde desde julho de 2023.

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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