Eliézer Silva, do Einstein: “Tecnologia possibilita transformar dados em ação”

Eliézer Silva, do Einstein: “Tecnologia possibilita transformar dados em ação”

Das últimas décadas para cá a evolução tecnológica foi exponencial.

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By Published On: 03/08/2022

Das últimas décadas para cá a evolução tecnológica foi exponencial. Empresas e instituições passaram a investir de forma contínua para aprimorar processos e ganhar eficiência com o uso de ferramentas digitais. Por mais que essa transformação digital já estivesse nos planos, a pandemia de Covid-19 acelerou a digitalização em praticamente todos os setores da economia mundial, incluindo a saúde. E vem mais por aí. É o que aponta Eliézer Silva, diretor do Sistema de Saúde do Hospital Israelita Albert Einstein.

Em entrevista ao Futuro da Saúde, o médico abordou esse cenário e mostrou o impacto da tecnologia em diversos aspectos: na melhoria da prática assistencial, no uso de dados para tomada de decisões – inclusive de políticas públicas –, na rápida difusão de informação, na atualização de conhecimento, nos prontuários eletrônicos e até mesmo na possibilidade de cirurgias robóticas à distância com a chegada do 5G.

Ele destaca que a tecnologia oferece também uma oportunidade de aumento de acesso – tanto de informação quanto de formas de atendimento: “A digitalização tem nos permitido encontros em tempo real, atendendo às necessidades mais imediatas. Hoje, o paciente pode utilizar instrumentos em sua casa para monitorar sinais vitais importantes e transmitir esses dados para profissionais de saúde. Isso, antes, era impensável”. Confira a entrevista completa:

Como a tecnologia tem transformado a saúde?

Eliézer Silva – Existem três pontos fundamentais que, sem a tecnologia, não seriam possíveis: a democratização do acesso à informação, a facilitação da prática assistencial em larga escala e a capacidade de armazenamento e análise de dados. As plataformas, agora, permitem uma difusão ampla e rápida da informação, além da capacidade de atualização, que antes era um processo bastante lento: era preciso esperar as publicações mais recentes de livros ou revistas. Com a tecnologia, mais pessoas têm acesso à informação, de forma mais rápida e mais barata. Da mesma forma, mudaram as formas que os cuidados de saúde são providos  às pessoas. Embora haja relatos de atendimentos remotos no passado, a digitalização hoje nos permite encontros em tempo real, atendendo às necessidades mais imediatas. Assim, o paciente pode utilizar instrumentos em sua própria casa para monitorar sinais vitais importantes e transmitir esses dados para profissionais de saúde. Isso, antes, era impensável. E, graças à capacidade de armazenamento, processamento e análise de dados, conseguimos transformar conhecimento em ação.

É esse o papel do Big Data na saúde?

Eliézer Silva – Sim. Conseguimos obter e utilizar dados populacionais e rapidamente estabelecer intervenções que possam impactar positivamente a vida das pessoas. Em 2020, por exemplo, em meio à Covid, a Coreia utilizou dados de geolocalização de celular  de exames de PCR em tempo real para identificar pessoas com testes positivos e seus contatos. A partir desses dados era possível rastrear a doença e informar a população, em tempo real, sobre os riscos de ter contraído Covid, se era preciso realizar o teste nos contatos e, eventualmente, orientar isolamento ou distanciamento social. Ou seja, transformaram  dados em conhecimento e conhecimento em política pública.

Como o 5G vai impactar ainda mais a digitalização da saúde?

Eliézer Silva – O 5G permite uma velocidade maior de transmissão de dados e diminui o tempo de latência. Se eu estou fazendo uma consulta online, acompanhando um paciente de baixa complexidade e nossa comunicação funciona, eu não preciso do 5G. Mas se eu estou dentro de uma ambulância, atendendo um paciente grave, que está apresentando sinais de arritmia, por exemplo, e eu preciso da ajuda de algum especialista para me ajudar a tomar uma decisão em tempo real, o 5G é fundamental. As cirurgias robóticas à distância também só serão possíveis se tivermos latência muito baixa na transmissão de dados e alta capacidade de controle da ferramenta. Os procedimentos se beneficiariam muito do 5G nesses casos, porque os movimentos serão mais precisos e o toque mais real. Esse será um passo importante com a ajuda da tecnologia.

Quais exemplos práticos da tecnologia em saúde vivida no dia a dia da prática clínica?

Eliézer Silva – A tecnologia permeia quase tudo. Tarefas simples, como agendar um exame por meio de plataformas digitais, reduz  ruídos da comunicação e o processo fica mais rápido e acurado. A digitalização permite também a rastreabilidade. Por exemplo, uma pessoa marca o exame. Quando chega ao hospital, faz o check-in por meio de um totem e todos os envolvidos naquele processo sabem que você está ali e o que veio fazer. Se, por acaso, no meio do exame for necessário tomar alguma outra atitude, o médico pode, em tempo real, tomar a decisão de fazer uma biópsia, por exemplo, porque ele tem acesso às imagens do exame que está sendo feito. Dessa forma, você não vai precisar voltar e fazer o procedimento de novo para coletar o material. O laboratório de patologia já recebe a notificação de que uma amostra vai chegar por lá, vinda do exame, e quando sair o resultado todos terão acesso, e, dependendo do caso, o retorno pode ser feito por telemedicina. Ou seja, a jornada eletiva é um grande exemplo do que costumamos denominar como “figital”.

E nos casos de emergência?

Eliézer Silva – Temos a jornada de urgência, também permeada pela tecnologia. Vamos supor que você teve um sintoma, acionou a telemedicina e foi indicado que procurasse um pronto atendimento. Nós geramos um QR Code que já classifica o seu risco, se vai precisar de exames e quais são os sintomas. Quando você chegar ao PS, o atendimento será agilizado. Novamente se estabelece o ambiente “figital” — uma jornada iniciada no digital e vai para o mundo físico de forma facilitada. Terminado o atendimento, o médico da telemedicina tem acesso ao diagnóstico e procedimentos feitos e esses dados ficam armazenados. Se, depois de um tempo, você desenvolver os mesmos sintomas e for atendido por outro profissional, ele vai saber exatamente o que houve da primeira vez e poderá tomar decisões mais assertivas.

Todas essas inovações já existiam antes da pandemia ou foram aceleradas por conta dela?

Eliézer Silva – A estruturação da área de Big Data no Einstein é anterior à pandemia. Nossa telemedicina tem mais de dez anos e nosso prontuário eletrônico atual, que é um dos mais robustos do mundo, foi implementado em 2016. Nós temos tudo registrado e integrado por meio de dados. Temos a Central de Monitoramento Assistencial (CMOA), que acompanha processos como deterioração clínica de pacientes e até situações menos complexas, como o atraso na administração de um medicamento. Essa tecnologia está sendo cada vez mais expandida. Quando chegou a pandemia, já tínhamos um histórico de grande investimento em tecnologia e esse foi um diferencial muito grande para lidar com todos os aspectos da crise sanitária. 

Como essa tecnologia se reverteu em ações durante a pandemia?

Eliézer Silva – O Einstein foi o primeiro a validar os testes diagnósticos para Covid-19, bem como utilizou plataformas sofisticadas para reconhecer as variantes e subvariantes do vírus, por exemplo. Nossa área de Big Data desenvolveu diversos modelos preditivos para antecipar a evolução dos casos de Covid e servimos o Ministério da Saúde com essas informações para que o sistema conseguisse provisionar medicamentos, oxigênio e se preparar para a chegada de novos pacientes.

A tecnologia também pode ter um papel importante na ampliação do acesso? Qual a visão do Einstein sobre essa questão?

Eliézer Silva – Recentemente, nós adquirimos um hospital em Goiânia que atende pacientes do sistema de saúde suplementar. Como a missão do Einstein é impactar o sistema de saúde como um todo, logo na sequência, estabelecemos uma parceria com uma instituição pública da região metropolitana de Goiânia, para a qual pudéssemos levar o modelo de gestão e operação do Einstein, como já fazemos em São Paulo. Funciona da seguinte forma: o hospital segue sendo público, mas toda a estrutura é do Einstein. Tudo isso que mencionamos, desde prontuários até processos digitais, levamos tudo para dentro dessas estruturas. Claro que há diferenças orçamentárias, porque dependemos da contrapartida do poder público, mas tentamos fazer o melhor uso do sistema de parceria para o bem-estar da população, para que todas as pessoas tenham acesso ao Einstein por meio de outros modelos, não somente via saúde suplementar. Nosso alcance aumenta se olharmos para o Einstein como um sistema completo, incluindo ensino, pesquisa e inovação, não apenas a parte assistencial. Dessa forma, conseguimos atingir um público cada vez maior que, como destaquei, está na missão do Einstein.

O que ainda pode melhorar, em termos de tecnologia, e como a digitalização pode impactar ainda mais o acesso à saúde no país?

Eliézer Silva – A cada momento que você avança no digital, novas tecnologias vão aparecendo. Existe uma capacidade de inovação de processos que é um aprendizado diário. Imaginamos que nossa área de Big Data vai tornar possível conhecer as pessoas de forma mais acurada e em maior escala. O Einstein, quando foi criado, era de poucos. Quando fomos para o SUS, ele passou a ser de muitos. Com a transformação digital, ele vai ser o Einstein de cada um. Queremos conseguir oferecer o melhor por conhecer melhor. Nós trabalhamos para cumprir exatamente o que está escrito na missão da instituição: levar uma gota de Einstein para cada cidadão brasileiro. Estamos no caminho.

Ana Carolina Pereira

Jornalista formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Ao longo de sua carreira, passou por veículos como TV Globo, Editora Globo, Exame, Veja, Veja Saúde e Superinteressante. Email: ana@futurodasaude.com.br.

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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