É preciso pensar em um modelo de gestão capaz de absorver as novas tecnologias em saúde

É preciso pensar em um modelo de gestão capaz de absorver as novas tecnologias em saúde

O cuidado integral do paciente deve ser o foco de […]

By Published On: 09/09/2020

O cuidado integral do paciente deve ser o foco de todos os esforços das pessoas, profissionais e organizações que atuam na saúde. Com esse princípio em nossas mentes e corações, lideramos a luta pela incorporação imediata dos antineoplásicos orais de uso domiciliar pela ANS, a Agência Nacional de Saúde Suplementar.

Hoje, um grande número das medicações que agem de modo único contra o câncer são os remédios orais, sem um substituto endovenoso. No contexto de pandemia, alguns remédios endovenosos, que também são distintos dos orais, podem ser substituídos por estes. Ambos têm mecanismos de ação diferentes, mas os resultados do tratamento podem ser semelhantes – ou muitas vezes melhores – mantendo o paciente mais seguro, no isolamento, neste momento. A diminuição de atendimentos ambulatoriais reduz as chances de intercorrências como infecções por bactérias e vírus, incluindo-se entre esses últimos o novo coronavírus, que tanto vem prejudicando o tratamento contra o câncer.

Mas o projeto #simparaquimiooral, liderado pelo Instituto Vencer o Câncer, antecede a pandemia; ela só expôs mais essa questão que interfere no pleno atendimento do paciente oncológico.

Aliás, a incorporação de antineoplásicos orais é uma luta antiga. Em 2013, a lei 12.880 obrigou os planos de saúde a cobrirem a quimioterapia oral, mas, na prática, o paciente só tem acesso ao medicamento que está no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde estabelecido pela ANS. O Rol é atualizado a cada dois anos. Isto é: somente a cada dois anos ou três a ANS incorpora um novo medicamento.

Como se sabe, um medicamento, antes de ser comercializado, passa por uma rigorosa avaliação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) – e isso vale também para os quimioterápicos orais ou intravenosos. No entanto, os antineoplásicos infusionais são incorporados pela ANS automaticamente após a aprovação da Anvisa e o mesmo não ocorre com os orais, que passam por um longo processo de avaliação na ANS antes da incorporação.

É essa distorção que o PL 6330/19 pretende corrigir, com a única e exclusiva intenção de proporcionar as melhores condições de tratamento aos pacientes oncológicos usuários de planos de saúde. A evolução das tecnologias é um processo que só tende a crescer. No Brasil, infelizmente, a chegada dos tratamentos inovadores tende a ser vista como uma ameaça à sustentabilidade do sistema de saúde, público ou privado. Mas precisamos pensar em modelos de gestão e de incorporação capazes de absorver as novas tecnologias e não a rejeitá-las.

A incorporação imediata, além de beneficiar 50 mil pacientes, irá reduzir as ações judiciais movidas por pacientes que não têm acesso à medicação oral indicada, pois há um descompasso entre o Rol e o que de fato está disponível para o paciente. A judicialização da saúde cresceu 130% entre 2008 e 2017. No mesmo período, o número total de processos judiciais aumentou 50%.

Acreditamos que o PL 6330/19, de autoria do Senador Reguffe, aprovado por unanimidade no Senado em junho, não tirará o protagonismo da ANS na condução do processo de incorporação. É preciso reconhecer, no entanto, que dois anos e a discrepância de métodos de incorporação dos dois tipos de medicamento precisam ser repesados.

Ainda com foco na integralidade do cuidado e, mais grave, com a responsabilidade de garantir o acesso à Saúde, como assegura a nossa Constituição, precisamos, também, colocar em pauta o processo de incorporação de tecnologias no Sistema Único de Saúde. Este é um diálogo que deve ser democrático, inclusivo e transparente, sem demoras que apenas prejudiquem o paciente, e com decisões responsáveis que possam oferecer o melhor tratamento possível ao cidadão.

Cabe acrescentar que o Instituto Vencer o Câncer, líder do #simparaquimiooral, tem feito esforços para apresentar a integralidade de seu projeto junto à ANS, além de articular ações com parlamentares, como as deputadas Carmem Zanotto e Silvia Cristina, que presidem as Comissões Mista de Saúde e a Comissão do Câncer para que o Projeto de Lei seja votado com urgência na Câmara. Tais esforços vão no sentido da construção da melhor política de atendimento, dentro dos preceitos democráticos que balizam o relacionamento entre organizações de pacientes e nossos representantes no Legislativo, colocando, sempre, o cidadão no centro do debate.

Fernando Maluf

Diretor Associado do Centro Oncológico da Beneficência Portuguesa de São Paulo, membro do Comitê Gestor do Centro de Oncologia do Hospital Israelita Albert Einstein e fundador do Instituto Vencer o Câncer. É formado em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, onde hoje é Livre Docente. Possui Doutorado em Ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e especialização no Programa de Treinamento da Medical Oncology/Memorial Sloan-Kettering Cancer Center, em New York.

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Diretor Associado do Centro Oncológico da Beneficência Portuguesa de São Paulo, membro do Comitê Gestor do Centro de Oncologia do Hospital Israelita Albert Einstein e fundador do Instituto Vencer o Câncer. É formado em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, onde hoje é Livre Docente. Possui Doutorado em Ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e especialização no Programa de Treinamento da Medical Oncology/Memorial Sloan-Kettering Cancer Center, em New York.

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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