Unificação de dados dos prontuários eletrônicos pode facilitar interoperabilidade e colocar o paciente no centro do cuidado

Unificação de dados dos prontuários eletrônicos pode facilitar interoperabilidade e colocar o paciente no centro do cuidado

Quando bem trabalhados, os dados dos prontuários eletrônicos possibilitam a

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By Published On: 25/01/2023

Quando bem trabalhados, os dados dos prontuários eletrônicos possibilitam a otimização de processos clínicos, da gestão hospitalar e, mais do que isso, abrem caminho para a interoperabilidade na saúde. Mas para que esse cenário se torne cada vez mais realidade, uma série de fatores ainda deve avançar, como a segurança da informação e o desenvolvimento de um sistema comum que permita a intercambialidade de informações.

Segundo Flávia Camargo, diretora de experiência em saúde do Hospital Israelita Albert Einstein, a integração de dados, inclusive de diferentes organizações, seria o cenário ideal para o futuro do acesso à informação: “A ideia é evoluir para que tudo seja direcionado para uma espécie de CPF da saúde dos pacientes. Assim, não importa onde ele seja atendido, todas as informações estariam ali, muito mais fáceis de serem acessadas, computadas e unificadas para uma melhor visão do todo”.

Contudo, ainda há um longo caminho pela frente. Na visão dela, “não podemos tratar esse tema como algo que tem início, meio e fim, mas sim como um processo constante, que deve sofrer alterações e evoluir ao longo do tempo, conforme as necessidades identificadas e as tecnologias disponíveis, para benefício dos profissionais que usam o prontuário eletrônico como ferramenta de trabalho, dos pacientes que podem entender melhor os seus dados e do sistema de saúde como um todo”.

Neste contexto, diversas instituições já trabalham em iniciativas que começam dentro de casa, mas que podem facilitar a expansão para fora em um segundo momento. O Einstein, por exemplo, está desenvolvendo melhorias para fazer com que as informações, dentro das possibilidades de hoje, possam ser usadas da melhor maneira possível. “O próximo passo será unificar todos os aplicativos existentes da instituição em um portal único. Nós entendemos que quanto mais acesso à informação de forma prática e fácil o paciente tiver, mais engajado ele estará com o cuidado com a saúde, facilitando, inclusive, a prevenção e os eventuais tratamentos”, avalia Flávia.

Pacientes no centro

Segundo ela, esses aprimoramentos chegam para atender a outra tendência na saúde, que é o de colocar o paciente no centro das decisões e permitir que ele seja o verdadeiro dono de todas as informações registradas. Vale lembrar que o direito do acesso à cópia do prontuário médico está garantido pelo Código de Ética Médica, pelo Código de Defesa do Consumidor também previsto pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Mas, ainda assim, até hoje, essa ferramenta é usada, majoritariamente, apenas pelos profissionais da saúde.

A implementação de prontuários eletrônicos, que começou, no Brasil, no início da década de 2010, foi um marco importante para os hospitais, que eliminaram o papel dos registros médicos, aprimorando a eficiência do cuidado ao paciente e tendo em mãos (ou melhor, na nuvem) um caminho mais fácil de acesso a históricos médicos e outras informações relevantes – o que facilita o diagnóstico e a escolha do melhor tratamento.

A legislação brasileira vigente garante que o prontuário médico seja do paciente, mas a guarda dos documentos é do prestador de saúde. Assim, ele pode ter acesso aos seus registros, mas precisa solicitar uma cópia à instituição de saúde.

Nos Estados Unidos, as instituições precisam compartilhar quase todos os dados de saúde com os pacientes. O movimento conhecido como Open Notes também foi iniciado em 2010, mas, na década de 1970, já havia publicações em revistas científicas sobre o tema. Em 2014, algumas organizações se apoiaram em um consórcio para aprender de forma colaborativa sobre essa iniciativa, que é regulamentada pela lei federal e que foi aprovada em novembro de 2020. Desde abril de 2021, o não compartilhamento das informações pode acarretar em multa ao prestador de serviço em saúde no país.

Acesso e edição dos dados dos prontuários eletrônicos

Flávia Camargo conta que, no Einstein, o acesso a algumas dessas informações já são oferecidas, mas, do ponto de vista da experiência do paciente, algumas mudanças ainda precisam ser feitas para que essa iniciativa seja, de fato, benéfica:

“No prontuário existem informações muito técnicas registradas pelos profissionais de saúde, com finalidade de troca entre os demais times, que nem sempre são facilmente entendidas pelos pacientes. O desafio é traduzi-las para uma linguagem compreensível ao paciente e de fácil acesso, para que esses dados não tragam confusão e esclareçam as questões referentes à sua saúde, evitando problemas”.

A discussão sobre a liberação do prontuário eletrônico na instituição acontece desde 2018, mas o processo foi, de fato, iniciado em 2020, por meio de workshops com o corpo clínico, pacientes, profissionais e lideranças da instituição para entender as prioridades dessa funcionalidade.

“Como conclusão, estabelecemos que as informações deveriam ser liberadas de forma clara e transparente e, a partir daí, juntamente com a equipe de tecnologia e inovação, iniciamos o trabalho. As informações são disponibilizadas ao paciente pelo aplicativo Meu Einstein ou por uma página da web. Trata-se de um projeto faseado e estamos entrando no terceiro ano dele”, comenta.

Atualmente, o paciente do Einstein tem acesso às suas  informações de alergia, medicação de uso habitual, histórico de procedimentos, histórico familiar e plano de cuidado. Durante uma internação ele pode acompanhar a medicação prescrita, sua agenda de cuidados, plano terapêutico, diagnósticos e o sumário do atendimento na alta hospitalar. No pronto atendimento, o paciente também visualiza a sua hipótese diagnóstica, a prescrição de medicamentos e o sumário do seu atendimento.

Na última etapa do projeto, liberada em janeiro de 2023, o paciente pode editar as suas informações – como medicamento de uso habitual e histórico de procedimentos. Existe também um canal pelo qual pode enviar informações de saúde que julgue pertinente. As informações registradas são validadas pelo profissional de saúde e migradas para o seu prontuário eletrônico.

“Ainda temos muito por fazer, pois precisamos disponibilizar informações integradas, incluindo os atendimento em atenção primária, consultório e clínicas Einstein, medicina diagnóstica, ambulatorial e internação. Já demos a partida e a tarefa agora é ampliar e desenvolver novas funcionalidades”, ressalta.

Iniciativa em constante evolução

Uma das soluções, de acordo com a diretora, será passar a explicar os resultados de exames nas plataformas digitais, incluindo até um glossário dos principais termos encontrados. Seria uma maneira de amenizar a ansiedade dos pacientes e até mesmo evitar que as pessoas façam as famosas e fatídicas pesquisas sobre seus laudos, cujos resultados não costumam ser assertivos, gerando ainda mais angústia.

“No nosso aplicativo, a parte que se refere à Covid, por exemplo, já conta com essa solução. Fizemos um design que traz informações adicionais sobre a doença aos pacientes. Essas explicações não substituem a consulta médica, mas podem acabar com preocupações desnecessárias. Se o resultado do exame for positivo para a infecção, a pessoa já se depara com informações sobre o que fazer. A intenção é que tenham acesso a informações qualificadas, fugindo de fake news, inclusive”, aponta Flávia.

Outro aprimoramento do aplicativo será a liberação para que pacientes incluam em seus prontuários doses de vacina que não foram aplicadas na instituição e resultados de exames de outros laboratórios – via fotografia ou inserção de documento no formato PDF.

No futuro, Flávia cita a possibilidade de haver uma personalização de dados de acordo com a necessidade dos pacientes para aquele momento específico: “Se pensarmos em um sistema conectado em tempo real, um paciente que está internado, por exemplo, poderia enxergar no aplicativo do hospital as informações que fazem sentido para a sua condição atual, algo como um filtro, um algoritmo que entendesse a demanda daquele paciente e trouxesse o que pode ser relevante para ele”.

Ana Carolina Pereira

Jornalista formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Ao longo de sua carreira, passou por veículos como TV Globo, Editora Globo, Exame, Veja, Veja Saúde e Superinteressante. Email: ana@futurodasaude.com.br.

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One Comment

  1. Gastão Cruz 02/02/2023 at 16:24 - Reply

    Parabéns Ana Carolina pelo excelente post, que aborda de forma esclarecida, fluida e coerente o que orna a importância de utilizações unificadas para diferentes PEP’s, tanto pela interoperabilidade de dados de consumo interno ao estabelecimento de saúde em conexão com o Conecte SUS/DATASUS, bem como pela conectividade com stakeholders externos e em destaque, o próprio paciente a começar pela decodificação e leitura facilitada por parte dele como maior interveniente do PEP, tanto de laudos como demais documentos informativos de domínio do seu prontuário histórico.

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

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Jornalista formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Ao longo de sua carreira, passou por veículos como TV Globo, Editora Globo, Exame, Veja, Veja Saúde e Superinteressante. Email: ana@futurodasaude.com.br.