Programa incentiva ciência e pesquisa entre adolescentes de comunidade em SP

Programa incentiva ciência e pesquisa entre adolescentes de comunidade em SP

Iniciativa em andamento desde 2022 no bairro de Paraisópolis, em São Paulo, estimula o envolvimento de adolescentes com a ciência

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By Published On: 04/12/2024
Programa Cientistas do Amanhã, do Einstein, promove conhecimento científico entre jovens e adolescentes em comunidade de São Paulo

Foto: Luis Gustavo Benedito | GrupoPhoto

O incentivo à ciência e à pesquisa entre adolescentes no país é um caminho importante para a inovação e a resolução de problemas do amanhã. Resultados da pesquisa O que os jovens brasileiros pensam sobre ciência e tecnologia – 2024, realizada pelo Instituto Nacional de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia (INCT-CPCT), por exemplo, mostram que os jovens brasileiros demonstram grande interesse e confiança em ciência e tecnologia. No entanto, o estudo apontou desafios persistentes, como a baixa participação em atividades científico-culturais e obstáculos à democratização do conhecimento, incluindo o acesso restrito à internet.

Uma maneira de enfrentar esse desafio e aproximar os adolescentes da ciência é proporcionar experiências práticas, como o trabalho em laboratórios, o aprendizado de empreendedorismo científico e o desenvolvimento de projetos próprios, transformando o aprendizado em uma vivência inspiradora. Essa é precisamente a proposta do projeto ‘Cientistas do Amanhã‘, promovido pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciência da Saúde do Einstein, em parceria com o Programa Einstein na Comunidade de Paraisópolis (PECP), uma das maiores comunidades de São Paulo, com cerca de 100 mil moradores em situação de vulnerabilidade social. “A pesquisa é um retorno para a sociedade”, afirma Érika Bevilaqua Rangel, médica pesquisadora do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein (IIEP), que acompanha a iniciativa desde sua primeira edição.

O projeto é voltado para adolescentes do ensino fundamental, com idades entre 14 e 16 anos, e conta com uma equipe multidisciplinar composta por educadores e cientistas. Ele visa apresentar os jovens ao pensamento e ao método científico, ressaltando como essas ferramentas podem ser aplicadas no cotidiano para transformar problemas aparentemente intransponíveis em situações nas quais se pode definir causalidade e consequentemente estabelecer soluções. 

É, ainda, uma forma de popularizar a ciência entre os jovens desde cedo, estimulando a criatividade, o pensamento crítico e a capacidade de resolver problemas. “Também auxilia a combater notícias falsas na medida em que mostramos como fazer as perguntas certas, com metodologia. Não posso afirmar algo sem antes debater”, reflete Rangel.

Idealizado em 2019 por Luiz Vicente Rizzo, diretor de pesquisa do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein, o projeto foi implementado apenas em 2022, devido à pandemia de covid-19. Ele surgiu a partir de um histórico de atividades comunitárias e voluntariado promovido pelo PECP, com programas que oferecem novas oportunidades de desenvolvimento nas áreas de saúde e educação aos moradores de Paraisópolis. “Apesar do nome, o ‘Cientistas do Amanhã’ não forma cientistas. Ele é um projeto de desenvolvimento de cidadania, de empoderamento dos jovens e também um programa de promoção do interesse pela ciência”, afirma Rizzo.

“Nossa expectativa é aprofundar essa educação de qualidade para permitir que esses adolescentes superem a barreira da desigualdade que enfrentam no dia a dia e consigam ocupar novos espaços”, destaca a pesquisadora.

Incentivo aos jovens para despertar o interesse pela ciência

Alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 4 (Educação de Qualidade), 5 (Igualdade de Gênero) e 10 (Redução das Desigualdades), o Cientistas do Amanhã já teve a participação de 44 jovens. Todos vieram da Escola Municipal de Educação Fundamental Prof. Paulo Freire. “Esses jovens precisam ser ouvidos. Por isso, damos voz a eles”, diz a médica pesquisadora do IIEP.

A seleção dos estudantes é realizada com base na indicação de professores que acompanham o desenvolvimento escolar dos alunos, utilizando critérios como participação e curiosidade, sem a aplicação de provas formais. A imersão é dividida em duas etapas: uma pré-imersão mais curta de cinco dias e uma fase prolongada de quatro meses, que inclui atividades práticas e teóricas. 

Em 2023, os alunos participaram de atividades de divulgação e compreensão dos processos da ciência durante uma semana nas dependências do Centro de Ensino e Pesquisa Albert Einstein – Campus Cecília e Abram Szajman. Na nova etapa do projeto, o IIEP ofereceu bolsas de estudo para alunos selecionados pela escola. Destes, 17 obtiveram bolsa institucional para complementar seus estudos durante quatro meses no Centro de Ensina e Pesquisa; e quatro foram aprovados no programa de ensino médio integrado ao técnico do Einstein em Paraisópolis.

“Eles entendem o que é ser pesquisador, pois ser pesquisador também é uma profissão que pode oferecer um salário e ser uma atividade para o futuro”, acredita Rangel. Segundo ela, o projeto abre novos horizontes ao destacar a ciência como um campo profissional possível, apresentando a pesquisa científica como uma atividade valorizada e acessível.

“A perspectiva é que possamos acompanhar a trajetória desses alunos nos próximos 10 anos, seja por meio do ensino técnico do Einstein em Paraisópolis, seja por outro ensino médio, ingresso em universidades, empregos etc.”, complementa Rangel. 

Teoria e prática: explorando os conceitos dentro e fora dos laboratórios

De acordo com Érika, o programa de imersão educacional combina teoria e prática nas ciências da saúde, abordando temas como biologia celular, genética, técnicas de laboratório e primeiros socorros, entre outros. As atividades práticas incluem o uso de microscópios, extração de DNA e simulações de situações de emergência.

“Como a nossa pós-graduação é em ciências da saúde, focamos em todas as áreas. Abordamos conceitos, como o que é uma célula, como ela está presente no nosso organismo, o que tem membrana, o que é o DNA, hormônios. Somente depois é que eles vão para o laboratório”, explica a pesquisadora. Além disso, o projeto conecta temas científicos às questões do cotidiano, explorando áreas como biologia celular e neurociência, entre outras. Ao integrar a ciência na formação dos jovens, ele não apenas inspira futuros cientistas como também amplia o impacto social da atividade desde cedo.

“Quando se aprende sobre ciência, aprende-se a ser criativo, a criar formas de solucionar problemas e a questionar mais”, reflete a especialista.

Desenvolvimento de habilidades 

Além da imersão prática na ciência, onde os alunos aprendem sobre metodologia científica, desenvolvem projetos de pesquisa e conhecem o trabalho dos cientistas do IIEP, Rangel destaca transformações nos participantes ao longo dos meses, como desenvolvimento de habilidades socioemocionais, controle da ansiedade e avanços tanto acadêmicos quanto pessoais, estimulando a sociabilidade e a comunicação. “Os alunos mostram uma transformação significativa em seu comportamento, aprimorando a sociabilidade e se tornando mais comunicativos, além de muitos apresentarem melhora no desempenho acadêmico após participar do programa”, diz. 

Entre as mudanças implementadas ao longo das edições do projeto, Érika aponta a aplicação de testes antes e depois das aulas para medir o aprendizado, o uso de ferramentas de gamificação e feedback em tempo real, além da adoção de metodologias como a sala de aula invertida, onde os alunos estudam previamente e discutem os temas em aula. Segundo ela, essas modificações pretendem melhorar o engajamento, a retenção do conteúdo e aprimorar a disciplina de estudos, ajustando-se às necessidades dos estudantes.

O sucesso do programa é comprovado pelo aumento no número de alunos beneficiados pelo programa, que cresce anualmente: 15 em 2022, 17 em 2023 e 22 em 2024. Apesar de todas as transformações, tanto em sala de aula quanto fora dela, os envolvidos no projeto, entre estudantes e professores, atuam de forma voluntária, o que exige dedicação e disponibilidade de tempo para acompanhar todos os adolescentes durante o programa. 

“Nosso conceito é o de que o entendimento de ciência e pesquisa científica deve ocorrer mais cedo na vida das crianças e dos jovens, e não necessariamente aprender sobre ciência apenas quando estamos saindo da escola”, conclui.

Angélica Weise

Jornalista formada pela UNISC e com Mestrado em Tecnologias Educacionais em Rede pela UFSM. Antes do Futuro da Saúde, trabalhou nos portais Lunetas, Drauzio Varella e Aupa.

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Jornalista formada pela UNISC e com Mestrado em Tecnologias Educacionais em Rede pela UFSM. Antes do Futuro da Saúde, trabalhou nos portais Lunetas, Drauzio Varella e Aupa.

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NATALIA CUMINALE

Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.

Angélica Weise

Jornalista formada pela UNISC e com Mestrado em Tecnologias Educacionais em Rede pela UFSM. Antes do Futuro da Saúde, trabalhou nos portais Lunetas, Drauzio Varella e Aupa.