Anvisa coloca em consulta pública proposta de atualização das vacinas de Covid-19
Anvisa coloca em consulta pública proposta de atualização das vacinas de Covid-19
A doença ainda ameaça a saúde pública com mutações constantes do vírus. Por isso, a Anvisa lança uma proposta para acelerar o processo de atualização das vacinas atuais
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a Covid-19 continua a circular com alterações genéticas e tem exigido ajustes nas vacinas. Devido às mutações contínuas do vírus, as vacinas precisam ser regularmente atualizadas para as novas variantes. Neste contexto, a Anvisa colocou em consulta pública até agosto uma proposta que visa acelerar a atualização dos imunizantes no Brasil.
Atualmente, o país não possui uma regulação específica para a atualização de vacinas da Covid-19. Segundo o relatório da proposta da Anvisa, a falta dessa regulamentação pode tornar o processo confuso e lento. “Ainda há necessidade de melhorar a proteção, reduzir a disseminação e transmissão de vírus, proporcionando uma proteção mais ampla contra as novas variantes”, afirma a diretora da agência, Meiruze Freitas, no documento.
Assim, a Anvisa propõe que, após a revisão da Instrução Normativa com a variante declarada pela OMS, as vacinas terão um prazo de três meses para submeter a versão atualizada. Com a nova versão aprovada, os imunizantes distribuídos com a antiga composição poderão ser utilizados por até seis meses.
Para Raquel Stucchi, médica infectologista da Unicamp e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia, a proposta da Anvisa é adequada, pois a doença ainda é motivo de grande preocupação devido ao acelerado aparecimento de novas variantes. “Nós temos que ter aqui no Brasil um planejamento melhor para que as vacinas atualizadas possam estar disponíveis em um curto período de tempo”, afirma.
Conforme dados do Ministério da Saúde, 85,3% da população brasileira tem esquema vacinal completo para a Covid-19, com pelo menos duas doses de vacina aplicadas. No entanto, em 2024, até o início de julho, foram notificados 625 mil novos casos e quase 4 mil óbitos decorrentes da doença no Brasil. Além disso, os dados da cobertura vacinal das doses de reforço indicam uma baixa adesão à campanha de imunização. Conforme o painel de monitoramento do Ministério, 54,5% da população tomou a terceira dose e apenas 18,6% recebeu a quarta.
Stucchi relata que a diminuição na aplicação das doses de reforço ocorre pela baixa percepção de risco da sociedade sobre a gravidade da Covid-19. “Fazer doses de reforço com vacinas atualizadas é extremamente importante. Principalmente para as pessoas dos grupos prioritários, já que elas podem perder a proteção da vacina de seis a nove meses após a aplicação e, por isso, devem ser sempre revacinadas”, alerta a médica.
Novas variantes
O vírus da Covid-19 sofre mutações constantes para se adaptar ao corpo humano e garantir sua sobrevivência. O médico epidemiologista e professor de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Marcos Lobato, explica que o surgimento de novas variantes está condicionado a variações no genoma (material genético) do vírus: “Essas variações mudam a ordem dos componentes da proteína Spike, que é a parte do vírus que realiza a infecção. Isso pode mudar a imunidade, pois as vacinas reconhecem a proteína de uma forma específica, e se ela mudar demais, a resposta imune não vai ser a mesma.”
De acordo com dados da Vigilância Genômica da Covid-19 da FioCruz, o Brasil teve 11 variantes em circulação após o período de emergência sanitária. Em 2024, circularam quatro variantes, com a prevalência da variante JN.1 em 71% dos genomas analisados pela fundação.
Conforme os dados, as novas variantes são linhagens da variante Ômicron, que começou a circular em novembro de 2021 no Brasil. Apesar disso, segundo Stucchi, é preciso estar atento a elas, visto que podem ser mais agressivas ou diminuir a efetividade das vacinas. “São variantes novas que se mostram bastante transmissíveis e podem causar a forma grave da doença em pessoas imunossuprimidas”, relata a infectologista.
Vacinas de covid-19 atuais
Atualmente, a vacina mais atualizada disponível no Brasil é a SpikeVax, fabricada pela farmacêutica Moderna. O imunizante está atualizado para a variante XBB 1.5, que foi a cepa predominante no país até o final de 2023, de acordo com os dados da vigilância da FioCruz. A variante XBB 1.5, antecedeu o surgimento da JN.1, e novas cepas já estão em circulação mundialmente. Conforme o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, as linhagens KP.2 e KP.3 representam 46% da circulação de variantes naquele país.
Apesar de a nova vacina não ter atuação específica para as cepas mais recentes, Lobato afirma que os imunizantes utilizados no Brasil ainda são eficazes contra o coronavírus. “Os parâmetros da OMS que definem se uma vacina é válida continuam sendo cumpridos. As vacinas funcionam, mas é importante se adiantar em relação às novas variantes, pois à medida que o vírus muda, as vacinas antigas perdem eficácia”, observa o epidemiologista.
Segundo Thiago Barbosa, diretor de vacinas da Adium (representante da Moderna no Brasil), a plataforma mRNA, presente no imunizante, permite uma rápida atualização para acompanhar as mutações do vírus: “Faremos a submissão de registro na Anvisa de um novo imunizante nos próximos dias, destinado à variante JN.1 e, caso necessário, também estamos preparados para fazer o mesmo contra a variante KP.2, que até o momento não teve registro no Brasil.”
Perspectivas para a imunização
O Ministério da Saúde adquiriu 12,5 milhões de doses da SpikeVax, que começaram a ser aplicadas em maio deste ano. Segundo a pasta, até julho, foram distribuídas seis milhões de doses. A nova campanha de vacinação pretende imunizar pelo menos 70 milhões de pessoas. No entanto, ao ser questionado pela reportagem sobre a intenção de compra de mais doses, o Ministério não respondeu.
Segundo Barbosa, a farmacêutica está preparada para atender às necessidades de vacinação do país. Contudo, novas solicitações não foram abertas pelo Ministério para a compra de mais doses da SpikeVax e a farmacêutica está buscando alternativas, nos mercados público e privado, para que todos que desejem se imunizar tenham acesso à vacina.
O imunizante é destinado para crianças de seis meses a quatro anos, grupos prioritários e pessoas que não foram imunizadas contra a Covid-19. De acordo com o Ministério, não há previsão de ampliação do público-alvo. Para Stucchi, a decisão da pasta é justificável em termos de saúde pública, pois diminui o impacto da doença nos sistemas de saúde. “No entanto, do ponto de vista individual, seria prudente que todas as pessoas atualizassem a sua imunização, mesmo aquelas que já tomaram todas as doses”, comenta a médica.
Lobato também concorda que quando o imunizante atualizado estiver disponível para a população em geral, todos devem procurar se vacinar. O epidemiologista destaca que a Covid-19 já está em níveis endêmicos, ou seja, com presença constante na população. “É uma doença que ainda mata bastante, que causa muitas hospitalizações e continua sendo um risco. Conseguimos controlar a pandemia graças à vacina, e por isso temos que continuar com o calendário vacinal atualizado”, ressalta.
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NATALIA CUMINALE
Sou apaixonada por saúde e por todo o universo que cerca esse tema -- as histórias de pacientes, as descobertas científicas, os desafios para que o acesso à saúde seja possível e sustentável. Ao longo da minha carreira, me especializei em transformar a informação científica em algo acessível para todos. Busco tendências todos os dias -- em cursos internacionais, conversas com especialistas e na vida cotidiana. No Futuro da Saúde, trazemos essas análises e informações aqui no site, na newsletter, com uma curadoria semanal, no podcast, nas nossas redes sociais e com conteúdos no YouTube.